Ricardo Brandt - Agência Estado
O motorista Josias Nunes de Oliveira, de 69 anos, apontado durante o regime militar como responsável pelo acidente que provocou a morte do ex-presidente Juscelino Kubitschek, em agosto de 1976, dirá hoje à Comissão Municipal da Verdade de São Paulo que dois homens ofereceram dinheiro para que ele assumisse a culpa no processo do qual foi réu."Na minha casa, queriam que eu me declarasse culpado e disseram que, se eu não pegasse o dinheiro, batiam em mim", disse Oliveira ao Estado. "Ofereceram uma mala cheia, mas eu não aceitei."
A história será contada aos membros da Comissão da Verdade Vladimir Herzog, na Câmara Municipal de São Paulo, em sessão marcada para o meio-dia. Oliveira dirigia o ônibus 1.348 da Viação Cometa que teria feito o motorista Geraldo Ribeiro perder o controle do Chevrolet Opala de JK em uma curva da Rodovia Presidente Dutra, em Resende (RJ), e colidir de frente com uma carreta.
Os dois ocupantes do automóvel morreram. Juscelino tinha 73 anos. Dois anos antes do acidente, havia recuperado os direitos políticos cassados logo após o golpe militar de 1964 - ele era senador por Minas na época. A hipótese de atentado contra JK alega que o ex-presidente seria visto como "ameaça" por setores do regime e, por isso, teria sido "eliminado".
Última piscada
Ainda durante a ditadura, Oliveira foi processado como responsável pelo acidente. No julgamento, as conclusões foram de que ele era inocente. O motorista vive hoje em uma casa de repouso em Indaiatuba, no interior de São Paulo, e sente o peso da tragédia nas costas até hoje, quase quatro décadas depois.
"Minha vida virou um inferno. Fui apontado como criminoso", lamenta Oliveira. Na sessão de hoje, o motorista vai novamente se declarar inocente e lembrar do 22 de agosto de 1976, quando parou para socorrer JK e seu motorista. "Não deu socorro. Mas a última piscada que ele deu, abaixo de Deus, quem viu fui eu."
Para o presidente da comissão paulistana, vereador Gilberto Natalini (PV), o depoimento de Oliveira é "muito significativo". "Além de esclarecer esse episódio do dinheiro oferecido a ele, vamos tentar resgatar esse homem, que teve a vida destruída pelo regime militar, que tentou impor a ele essa figura de responsável pela morte", afirmou o parlamentar, que foi preso e torturado durante o regime militar.
Em agosto, a Comissão da Verdade paulistana ouviu quatro depoimentos relacionados à morte de JK: Serafim Jardim, que foi secretário particular de Juscelino; Paulo Castelo Branco, que pediu a reabertura do caso em 1996; Paulo Oliver, um dos 33 passageiros do ônibus; e Gabriel Junqueira Villa Forte, filho do proprietário do hotel no qual o ex-presidente esteve antes do acidente.
"Esse é um caso com muitas peças sem encaixe. Era época da Operação Condor, havia a informação de que Juscelino seria candidato a presidente", afirmou Natalini, referindo-se à colaboração entre as ditaduras do Cone-Sul. O vereador diz acreditar na hipótese de atentado.
A Comissão da Verdade de São Paulo conseguiu até agora que o governo de Minas Gerais localize os resultados da perícia feita em 1996 no objeto metálico que teria sido encontrado na ossada do crânio do motorista de JK.
Naquele ano, o secretário particular do ex-presidente conseguiu que o Estado mineiro reabrisse o caso e o corpo do motorista foi exumado. As conclusões foram as mesmas da primeira investigação. Um pedido judicial para autorização de uma nova perícia no crânio será feito agora pela comissão, segundo Natalini. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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