O nome Idade Média carrega em si uma série
de preconceitos, o que pode levar o estudante menos atento a pensar este
período como uma fase de "ignorância, atraso, ausência de desenvolvimento". É
importante tomar cuidado para não assimilar esta visão, a não ser que seja este
seu ponto de vista definitivo.
Este termo,
“medieval”, criado pelos renascentistas, deve ser visto apenas como o período
histórico europeu compreendido entre os séculos V e XV. Para facilitar o estudo
– e tão somente isso - os historiadores criaram arbitrariamente a seguinte
divisão: Alta Idade Média (do século V
ao X) e Baixa Idade Média (que se estendeu até o século XV).
IMPÉRIO BIZANTINO
Com a decadência do Império
Romano do Ocidente, Constantinopla
permaneceu como último reduto da cultura romana. Construída sobre a colônia
grega chamada de Bizâncio, localizada em uma posição estratégica, entre a Ásia
e a Europa, próxima aos estreitos de Bósforo e Dardanelos, essa cidade dominava
as rotas marítimas entre o Mar Egeu e o Mar Negro, bem como as rotas terrestres
daquela região. Foi esse conjunto de fatores que incentivou o imperador romano
Constantino a reforma-la em 330, rebatizando-a e depois se tornou a capital do
Império Oriental: “a Roma do Oriente”.
A
proximidade com a Grécia fez que Constantinopla recebesse forte influência da
cultura helenística, tornando o grego sua língua principal. Ao longo dos séculos
V e VI, a cidade foi um movimentado entreposto comercial de lã, linho, seda,
objetos de cobre, ouro e prata vindos da África, Pérsia, China e Índia,
conferindo a Constantinopla o
cognome de “Porta do Oriente”.
As
principais atividades econômicas eram: comércio, devido à localização geográfica,
ponto de convergência de várias rotas de comércio
e agricultura, praticada com o trabalho escravo, mas
também com a produção de pequenos proprietários livres. Apesar de
existir a possibilidade de tais atividades serem desenvolvidas por
particulares, toda a economia era fortemente controlada pelo Estado, dando a
esse setor uma característica marcadamente intervencionista.
Sob o governo de Justiniano (527-565), o
Império Bizantino viveu a sua fase mais grandiosa. Ele estabeleceu a paz
com o Império Persa e procurou reconstruir o antigo Império Romano do Ocidente,
retomando as terras que estavam nas mãos dos bárbaros germânicos.
No plano
interno, Justiniano mandou construir hospitais, novos muros para aumentar a
segurança da cidade, e numerosas igrejas, dentre as quais se destaca Hagia Sophia, que significa Santa
Sabedoria em grego, uma das marcas da arquitetura e da arte
bizantina.
Outras questões, estas de caráter religioso, movimentaram a
população bizantina, que se envolvia em profundos debates entre os membros do
clero oriental. As mais famosas foram o monofisismo
(crença apenas na natureza divina de Cristo, negando sua natureza humana) que
foi combatida e definitivamente negada com o concílio de Calcedônia em 451, quando foi estabelecido que Jesus é detentor das
duas naturezas (divina e humana) e a questão
iconoclasta, que abertamente defendia a destruição de imagens, provocando
vários conflitos que destruíram templos e também provocaram muitas mortes e
somente no II Concílio de Nicéia em 787
a resolução definitiva foi tomada: as imagens seriam utilizadas em caráter
pedagógico e doutrinal, assumindo a dimensão de “Bíblia dos Pobres”, pois o
importante é a mensagem que trazem e não o objeto religioso em si, mas isso não
evitou que muitos fiéis se comportassem como idólatras ou preservassem
superstições que vinham das tradições pagãs.
"O imperador Justiniano, o bispo Maximianus e sua corte" Mosaico da Basílica de San Vitale - Ravena, Itália. Fonte: Wikipédia
Também por
ordem de Justiniano, os juristas
bizantinos compilaram toda a legislação romana, bem como toda a jurisprudência
dos seus tribunais em uma obra que ficou conhecida como Corpus Juris Civilis (Corpo do Direito Civil) ou Código Justiniano.
Com o
crescimento do cristianismo, as igrejas das grandes cidades passaram a
organizar-se em torno de um padre denominado Bispo. Com o passar do tempo,
estes bispos começaram a estender seu poder muito além dos limites de suas
cidades, rivalizando-se. Por volta do século V, os bispos de Jerusalém,
Alexandria, Antioquia, Constantinopla e Roma firmaram-se como os mais poderosos
entre os cristãos.
Outro grande feito de Justiniano foi a tentativa de
reconquistar o Império do Ocidente, recuperando o litoral do norte da África, a
península Itálica e a porção sul da península Ibérica. Justiniano também
conseguiu conter os ataques na porção oriental do império, principalmente, dos
persas sassânidas e dos búlgaros nos Balcãs.
A
sustentação deste império, no entanto, foi mantida através de um grande
exército e de uma extensa burocracia, sendo ambos sustentados pelos inúmeros
impostos pagos pela população.
Por volta
do século VII, com o advento do Império Islâmico, as cidades de Jerusalém,
Alexandria e Antioquia foram dominadas pelos muçulmanos. O mundo cristão viu-se
ameaçado e, como campos sólidos dessa religião, restaram tão somente os bispos
de Constantinopla e Roma. Entretanto, a figura do papa incomodava os
imperadores bizantinos, que se sentiam coagidos pelo líder cristão. Crescia,
então, a força do cesaropapismo, ou seja, a submissão da Igreja ao Estado.
As
divergências teológicas e doutrinais, a influência da cultura grega e a pressão
exercida pelo poder imperial bizantino prolongaram os conflitos entre Roma e
Constantinopla, os quais continuaram até 1054, quando ocorreu o Cisma do Oriente, que acabou dividindo
o cristianismo da seguinte forma:
- Igreja Católica Apostólica Romana -
sob a hegemonia do Bispo de Roma, que assumiu os títulos de Papa e Sumo
Pontífice, dominando a Europa Ocidental.
- Igreja Católica Apostólica Ortodoxa -
sob a hegemonia do Bispo de Constantinopla, que assumiu o título de Patriarca ,
porém era claramente sem autonomia e submisso ao imperador.
Os muros da
cidade garantiram a paz e a prosperidade durante um longo período. Mas os
sucessores de Justiniano sequer tentaram assemelhar-se ao grande imperador,
permitindo avanços de povos estrangeiros. Os muçulmanos conquistaram grande
parte dos territórios pertencentes ao Império Romano do Oriente, até sua queda
definitiva em 1453, quando Constantinopla foi invadida pelos turcos otomanos, dando origem ao Império Turco e assim, a "Roma do Oriente" foi renomeada como Istambul.
Nessa
oportunidade, vários estudiosos da
cultura clássica (greco-romana) abandonaram a capital bizantina. Muitos
deles dirigiram-se para o Ocidente, na busca
de refúgio. Um dos locais escolhidos foi a Península Itálica, onde a
cultura da Antiguidade iria ressurgir séculos depois, na forma de
movimento renascentista.
CIVILIZAÇÃO ISLÂMICA
O Islamismo surgiu
primeiramente entre os árabes que habitavam a atual Arábia Saudita. Antes do
advento de Maomé, esse povo vivia em tribos nômades, governadas por um
patriarca, vagando de oásis em oásis conduzindo rebanhos de ovelhas e cabras.
Eram politeístas e idólatras, e cada tribo adorava vários deuses e objetos
sagrados.
A fome e as
guerras por disputas políticas ou por motivos religiosos eram constantes. A expectativa
de vida era bastante baixa e a poligamia surgia como forma de compensar os
homens mortos nas guerras.
Em meio a
essa realidade, nasceu Maomé, na cidade de Meca, no ano 570. Este homem
trabalhou como caravaneiro, e tal atividade lhe permitiu conhecer a cidade de
Jerusalém, onde entrou em contato com cristãos e judeus.
Quando
tinha cerca de 40 anos, Maomé afirmou ter tido uma visão, na qual o anjo
Gabriel, mensageiro de Allah, lhe transmitira as bases da religião islâmica. Os
homens deveriam abandonar os cultos idólatras e reconhecer que Allah era o
único e verdadeiro deus.
Tal proposta não foi bem aceita inicialmente. Em 622, Maomé foi perseguido pelos comerciantes da cidade de Meca, que temiam perder os lucros obtidos com as vendas de artigos ligados às religiões pagãs. O pregador foi obrigado a fugir para a cidade de Yatrib, que, posteriormente, recebeu o nome de Medina (Madina al Nabi) - “cidade do profeta”.
"Viagem mística do profeta Muhammad" c. séc. XVI - British Library, Londres, Inglaterra.
Fonte: Wikipédia
A fuga de Maomé de Meca para Medina passou posteriormente a ser o marco inicial do calendário muçulmano, recebendo o nome de Hégira. Em Medina, Maomé conseguiu reunir grande número de seguidores que poderiam formar uma espécie de exército com profundas motivações religiosas. As tropas comandadas pelo novo profeta invadiram a cidade de Meca, destruindo todos os símbolos pagãos, poupando apenas a Caaba (uma pedra negra que, segundo a lenda, fora enviada por Deus aos homens). Todos os que se opuseram à nova religião foram mortos.
Maomé
reuniu os princípios de sua religião em um livro sagrado, denominado Alcorão.
Nele, estão os Cinco Pilares do Islã:
- Crença em Allah
- Oração: cinco vezes ao dia, com a
face voltada para Meca;
- Purificação: jejuar durante o mês
do Ramadã;
- Caridade: ajudar aos pobres;
- Peregrinação: visitar a cidade de
Meca pelo menos uma vez na vida
Existem outros costumes que também
são observados pelos seguidores do Islã, como por exemplo, abster-se de álcool
e de carne de porco.
O Islã tem entre seus conceitos
importantes a Jihad, palavra árabe
que significa “esforço, empenho” em relação à palavra de Allah, podendo no
entanto, se converter numa ação militar de caráter defensivo ou ofensivo,
dependendo do contexto e nesse caso, ganha a dimensão de “Guerra Santa”.
Aqueles que
morressem na Guerra Santa teriam todos os seus pecados perdoados e direito ao
Paraíso, onde haveria fartura de comida, bebida e mulheres. O fanatismo
resultante dessa pregação levou os muçulmanos a conquistar um imenso império,
tomando todo o Império Persa, bem como o Egito, a Palestina e a Síria, que
estavam sob o domínio Bizantino.
De 661 a
750, os muçulmanos foram governados pela Dinastia Omíada, que transferiu sua
capital para Damasco, na Síria. Essa dinastia conquistou a Índia, o norte da
África e a Península Ibérica. Tentou tomar também a Gália, em poder do Reino
dos Francos, mas foram derrotados na Batalha de Poitiers (732), sendo obrigados
a recuar.
A Dinastia
Abássida (750 - 1258) não conseguiu manter a unidade dos islâmicos e assistiu à
fragmentação do Império em numerosos Califados
independentes. Também nessa época, os Abássidas sofreram novas derrotas, como
as invasões mongóis e turcas a leste e a vitória dos cristãos na Guerra da
Reconquista da Península Ibérica.
A expansão islâmica séc. VII-VIII. Fonte: Wikipedia
Assim como qualquer outra religião, o islamismo não suportou o próprio crescimento, o que provocou a divisão entre os seguidores. Existem dois grupos que dividem o islamismo mundialmente:
·
Sunitas: surgiram após a morte de
Maomé. Além de seguirem os ensinamentos de Alcorão, aceitam os ensinamentos
contidos no Suna (significa costume),
espécie de biografia de Maomé, que mescla eventos da vida do Profeta aos
costumes do povo árabe. Defendem a separação entre o poder laico e o religioso.
Para eles, os chefes de Estado não precisam ser sacerdotes, considerados
infalíveis, mas reunir sólidas virtudes. Representam a grande maioria dos
muçulmanos até hoje.
·
Xiitas: acreditam que os chefes de
Estado deveriam ser da linhagem de Maomé, isto é, descendentes de Fátima (filha
de Maomé) e de Ali (genro). Portanto, a palavra xiita significa shi’ at’ Ali: partidários de Ali. O
governante deve ser também um guia espiritual (imã). Para os xiitas, o Corão é
a única fonte de ensinamento da verdade.
Abu Bakr (de marrom) e Ali(de verde), seguindo o profeta Muhammad em peregrinação a Meca (hajj). c. 1594, Coleção Spencer, Biblioteca Pública de Nova York, EUA.
Nos povos islâmicos, a grande atividade econômica era o comércio, já bastante característico das populações de origem árabe. Porém, também as manufaturas e a agricultura tiveram extraordinário desenvolvimento .
A influência árabe foi marcante dentro da Europa Ocidental em virtude da grande sofisticação desta civilização, responsável pela introdução do cultivo da cana-de-açúcar, laranja, algodão e arroz; pelas técnicas de fabricação do vidro e do aço ( técnica vinda de Damasco e instalada na cidade de Toledo).
Do ponto de vista intelectual, os
árabes tinham profundos conhecimentos em Medicina, Física, Astronomia,
Matemática (desenvolvimento da aritmética e utilização dos algarismos hindus,
depois denominados arábicos) e Química. Ademais, os árabes já possuíam várias
universidades, destacando-se nas cidades de Bagdad, Cairo, Isfahan e Córdova e
podiam estudar Medicina, Teologia, Direito, Matemática e Filosofia.
Na cultura, os árabes desenvolveram grandes conhecimentos em matemática, astronomia, medicina (destacando-se o persa Ibn Sina, conhecido no Ocidente como Avicena) e filosofia, com o médico e filósofo Ibn Rushd (Averróes), tradutor e comentarista de Aristóteles. Na literatura, destacam-se obras conhecidíssimas até hoje, como As Mil e Uma Noites , tradição oral, posteriormente registrada em vários manuscritos e Rubayat, versos do poeta persa Omar Khayan.
"Fonte dos 12 Leões" - Palácio de Alhambra c. séc. XI, Granada, Espanha.
Crédito: Elias Feitosa
A escultura e a pintura figurativas receberam pouca atenção, uma vez que eram interpretadas como produção de caráter idólatra. Em relação a escultura e arquitetura, os árabes construíram mesquitas grandiosas(como a de Córdova), ricamente decoradas, utilizando a técnica dos arabescos(cúpulas e rendilhados esculpidos em pedra) e faianças, como também de palácios, destacando-se o Palácio Alhambra em Granada. Percebemos que a tradição figurativa não teve um grande desenvolvimento na cultura islâmica em virtude da condenação às imagens existentes no Islã, sendo predominante a utilização de motivos geométricos ou abstratos, associados à caligrafia árabe, denominados como arabescos.
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