PERÍODO PRÉ-COLONIAL
A América portuguesa só era uma terra longínqua e desabitada aos olhos dos portugueses.
Na realidade, era terra de milhões de índios (de diferentes culturas e formas
de organização), que desconheciam a Europa e seus ideais expansionistas.
De qualquer
forma, Portugal apossou-se do novo território exatamente no momento em que
encontrava a rota para as ricas especiarias das Índias. Assim, não deu grande
importância às terras americanas. O
período entre 1500 e 1530 é denominado pré-colonial,
pois, nele, só foram registradas as visitas de duas expedições exploradoras
(1501 e 1503) e duas expedições guarda-costas (1516 e 1526). A única atividade econômica desenvolvida
nessa época foi a exploração predatória
de pau-brasil, obtido através de escambo (troca de
mercadorias) com os índios.
Outros países europeus passaram, então, a
se interessar pela exploração das terras que eram chamadas de “Índias Ocidentais”
(América) - em especial França, Holanda e Inglaterra. Diante das incursões de
corsários franceses, que também praticavam o escambo com os índios, o governo
português foi obrigado a mandar uma expedição colonizadora para tomar posse do
território. Essa expedição, comandada por Martim Afonso de Souza, partiu de
Portugal e fundou a Vila de São Vicente
(1532), onde introduziu o cultivo da cana-de-açúcar.
OCUPAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO
A
colonização da América portuguesa por Portugal sofreu influência de diversos
fatores, que diferenciam a ocupação dessas terras de qualquer outro modelo
desenvolvido no continente. A manutenção das possessões portuguesas no Oriente
exigia grandes contingentes populacionais. As febres e guerras dizimavam essa
população, que tinha que ser continuamente reposta, por isso, colonizar a Terra
de Santa Cruz, utilizando o latifúndio e a mão-de-obra escrava, não criaria
para Portugal o risco de ter sua população drasticamente diminuída.
Viajar até
o Novo Mundo era um grande risco, tanto que muitos portugueses morriam nas
travessias marítimas, vitimas de acidentes, tempestades, lutas com piratas e
escorbuto (doença provocada por deficiência de vitamina C, que ocasiona
hemorragias e pode levar à morte). E fora os colonos que para cá vieram que eram degredados, isto é, presos
condenados à expulsão do reino, ficando confinados nas regiões mais distantes..
Era vedado
à nobreza exercer "ofício mecânico" (trabalhar com as mãos), bem como
o "comércio a retalho" (comércio varejista). Aos filhos da famílias
nobres, ficava reservada as carreiras militar, eclesiástica e do alto
funcionalismo público, na administração do Império. Em outras palavras, ao
contrário do espírito empreendedor que os puritanos (calvinistas) desenvolveram
posteriormente no século XVII na América do Norte, os lusitanos não cultivavam
o trabalho como algo digno, muito pelo contrário. O trabalho manual era visto
como castigo e reservado para escravos e empregados subalternos.
Os
postulantes a cargos públicos ou a títulos de nobreza deviam comprovar, através
de atestados de pureza de sangue, que não descendiam (pelo menos nas últimas
três gerações de sua família) de judeus, muçulmanos ou pessoas que tivessem
passado pelo exercício de ofício mecânico. Dessa forma, todo aquele que
pretendesse ascender à nobreza deveria se manter longe do trabalho braçal.
Sob todas
estas condições, Portugal lançou mão de um artifício que já havia alcançado
bons resultados em ilhas do Atlântico e foi oficialmente introduzido aqui em 1534. Nesse ano, por ordem do rei Dom
João III, o Brasil foi dividido em 15 faixas perpendiculares à linha da costa,
criando-se, assim, as capitanias hereditárias.
O objetivo
básico era delegar a particulares a
tarefa de colonizar a América Portuguesa, uma vez que tal empreitada
mostrava-se muito dispendiosa. O capitão-donatário
(responsável pela capitania) recebia as terras através de um documento
chamado Carta de Doação, e havia uma
série de direitos, estabelecidos pela Carta
de Foral, dentre outros:
-
distribuir lotes de terra, as sesmarias, aos colonos de sua
confiança;
-
fundar vilas;
-
impor a justiça;
-
escravizar os habitantes nativos;
-
cobrar impostos;
-
catequizar os indígenas e impor a religião
católica.
Apesar de
ter a posse de fato das terras, era
vedado ao donatário vender a capitania, pois a propriedade de direito era
do rei de Portugal. Desta forma, as
capitanias constituíram-se num regime politicamente descentralizado, fundado em
unidades autônomas e que, se
numa certa medida, lembram a estrutura política do feudalismo, economicamente visavam à exportação para a
metrópole, no caso, Portugal.
A medida
não atingiu resultados satisfatórios, uma vez que somente as capitanias de São Vicente, administrada por Martim
Afonso de Souza, e Pernambuco, sob a responsabilidade de Duarte Coelho, puderam prosperar devido ao sucesso
da cultura canavieira. As demais, entregues à pequena nobreza portuguesa ou a
cristãos-novos, não atingiram sucesso por vários motivos, seja pelos ataques
indígenas, seja pela falência dos donatários ou simplesmente por causa do
desinteresse da parte de outros nobres que sequer chegaram a viajar para a
colônia.
Em 1548,
através do Regimento, instituído por Dom João III, foi criado o primeiro Governo-Geral
do Brasil, com o objetivo de auxiliar as
capitanias e representar o rei na colônia. O primeiro titular desse cargo foi
Tomé de Souza, que trouxe consigo
colonos, degredados, as primeiras cabeças de gado e escravos africanos. Com o
governador, chegou também um pequeno grupo de jesuítas, comandado por Padre
Manuel da Nóbrega, que criou o primeiro colégio da colônia, na recém-fundada
cidade de Salvador. Seus auxiliares diretos ocupariam os cargos de ouvidor-mor (responsável pela aplicação
da justiça) e provedor-mor (responsável
por todos os negócios ligados à Fazenda Real).
Durante o
governo de Tomé de Souza, a escravização de índios ganhou novos critérios,
determinando-se que só a partir da “guerra
justa” (ataques de portugueses a índios que se mostraram hostis) os nativos
poderiam ser escravizados.
O segundo
Governo-Geral, comandado por Duarte da
Costa (1553/58), foi marcado por atos autoritários e sofríveis. O filho do
governador-geral, Álvaro da Costa, por liderar uma campanha pela livre
escravização dos índios, desentendeu-se com o Bispo Pero Fernandes Sardinha, que tentou regressar a
Portugal para comunicar ao rei os despropósitos praticados na colônia. Acabou
falecendo no litoral nordestino, devorado por índios antropófagos após o
naufrágio de seu navio.
Mesmo
assim, com idas e vindas do governante, várias vilas foram fundadas; uma delas
no planalto da capitania de São Vicente, chamada inicialmente de São Paulo de Piratininga. Essa cidade
fiou praticamente isolada de outras vilas, uma vez que, para chegar até ela,
era necessário ultrapassar a “muralha”, nome pelo qual os exploradores se
referiam à atual Serra do Mar.
Nesse mesmo
período, ocorreu a invasão de
franceses huguenotes (calvinistas) no
Rio de Janeiro, liderados por Nicolau de Vilegaignon. O sucesso dos
franceses deveu-se a uma eficaz aliança com os indígenas locais, criando a Confederação dos Tamoios. Tal situação
foi fruto da inabilidade política do governador que, ao permitir a livre
escravização de indígenas, ameaçou inclusive tribos que outrora eram aliadas
dos portugueses. Os franceses fundaram a
França Antártica em 1555 e uma fortificação na atual Baía de Guanabara
(Forte Coligny) e, a partir daí, os portugueses sofreram várias derrotas na
tentativa de expulsar os invasores. O governo de Duarte da Costa foi um
fracasso no sentido de resguardar a autonomia territorial.
Essa união
de franceses e indígenas tamoios só foi derrotada durante a presença do
terceiro governador-geral, Mem de Sá
(1558/72). Em 1567, seu sobrinho, Estácio
de Sá, aliou-se ao cacique Arariboia e alguns índios que mantinham
rivalidades com os tamoios. Mais ao sul, na região de Iperoig (Ubatuba), foi
fundamental a intervenção dos padres Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, que se infiltraram entre os índios,
convencendo-os a mudar sua posição de se manterem aliados aos franceses.
Anchieta chegou a ser aprisionado pelos indígenas, mas estes, temendo o poder
bélico luso, decidiram ajudar na expulsão dos invasores. Após serem vitoriosos
nos embates contra os comandados de Vilegaignon, os portugueses construíram um
forte, batizando a localidade com o nome de São
Sebastião do Rio de Janeiro.
Entre 1612
e 1615, os franceses voltaram a ocupar o Brasil, desta vez no litoral
nordestino: primeiro Sergipe e Paraíba e, depois, Maranhão, onde fundaram a
cidade de São Luís, que seria a capital da França
Equinocial. Porém, forças luso-brasileiras, lideradas por Jerônimo de
Albuquerque conseguiram, mais uma vez, expulsar os invasores. Essa mesma força
militar chegou a rumar mais para o norte, com o objetivo de conquistar o Pará.
Em 1816, foi construído o Forte do Presépio, que deu origem a cidade de Belém.
Após o
governo de Mem de Sá, uma nova experiência foi colocada em prática na
administração colonial portuguesa. O
Brasil foi dividido em dois grandes
Estados. Maranhão (ao norte) e Brasil (ao sul), com o objetivo de garantir que
as duas regiões pudessem ser melhor observadas. Os portugueses tentavam
enfrentar o problema de controlar um território tão extenso quanto as
dificuldades para ocupá-lo.
Nesse
período, a principal fonte de renda na colônia continuava a ser o pau-brasil
retirado da mata atlântica, de norte a sul do litoral. Com o Governo-Geral, cresceu a agricultura da cana-de-açúcar e os
primeiros engenhos movidos à mão, a boi e, posteriormente, com energia
hidráulica. A agricultura desenvolveu-se, principalmente, na zona da mata
nordestina. Ali, originou-se uma sociedade
agrária, com divisão em senhores de engenho, moradores da casa grande e
escravos, habitantes da senzala. Havia também os agregados, que eram
brancos pobres, em geral parentes do senhor de engenho, que se colocavam sob
sua proteção.
Sintetizando,
o governo-geral representou o deslocamento de poderes e atribuições concedidos
aos donatários para outro órgão, que estabeleceu na colônia o poder
metropolitano, intervindo diretamente no processo de colonização,
racionalizando-o, centralizando-o e tornando-o mais eficiente.
No Brasil
colonial, os municípios apresentavam a mesma estrutura jurídica que os da
metrópole. Fundar cidades era uma necessidade do povoamento e da defesa da
terra, além de tornar práticas a tributação e a arrecadação. Porém, as
dimensões gigantescas da colônia geraram um distanciamento entre colonos e o
poder central, dando uma certa “independência” para as cidades, que passaram a
lutar para resguardar seus interesses. É nesse bojo que nasceram as Câmaras Municipais, com a função de organizar as vilas e povoados.
Tais Câmaras ganharam força e prestígio, defrontando-se frequentemente com a
administração central. Os vereadores
eram escolhidos junto ao voto dos "homens
bons", que nada mais eram do que grandes
proprietários de terra.
Pode-se,
então, chegar a uma série de conclusões. Essa
política portuguesa de ocupação das terras sempre privilegiou a grande
propriedade rural, que era adquirida
a partir de doações e não de compra. No longo prazo, ficou fácil perceber
que essa política impediu a democratização do acesso à terra, criando uma espécie de linhagem de latifundiários que, devido às dimensões da colônia e às dificuldades
para o governador-geral impor-se, não encontraram dificuldades para estabelecer
seu poder local, muitas vezes com uma violência e um despotismo que em nada
deviam às autoridades metropolitanas, como veremos mais adiante.
A “catequização” dos índios
O ato de catequizar consiste na doutrinação,
em práticas devocionais e no próprio comportamento pessoal. No Brasil colonial,
isso foi claramente usado para “aportuguesar” os índios, ou seja, para arranjar
um lugar e um papel para os indígenas de acordo com a organização da sociedade
portuguesa. Os representantes para tal fim, os jesuítas, percorriam o
território brasileiro levando a mensagem divina e convertendo os índios que,
caso se rebelassem, sofriam duras penas. Este processo foi unilateral, não
havendo tempo para o índio assimilar tal conjectura social, somente para
compreender, e na prática, que não era possível combater os portugueses, que
dizimavam constantemente sua cultura.
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