terça-feira, 21 de julho de 2015

I Reinado e Período Regencial (1822-1840)

O Primeiro Reinado, que se estendeu de 1822 até 1831, caracterizou-se por ser um período de transição política interna, uma vez que o imperador era herdeiro do trono lusitano e, sendo assim, ainda pairava no ar o fantasma da recolonização. Foi uma fase em que se manifestaram crises de caráter econômico, financeiro, social e, principalmente, político. Houve um duro embate entre o autoritarismo do monarca e o desejo da elite agrária local de exercer a hegemonia sobre o jovem país.

É importante destacar que os principais beneficiados com a independência foram os grandes proprietários rurais e a Inglaterra. Esta última apoiava as independências das colônias ibéricas como mecanismo mais eficaz para eliminar o pacto colonial e ver, assim, a expansão de seus mercados consumidores.
            
Os grandes proprietários rurais só apoiaram o rompimento total com Portugal a partir do momento em que os portugueses procuraram anular as medidas tomadas por Dom João VI em sua estada no Brasil. A elite rural desejava um sistema de governo autônomo, com alguns traços de liberalismo, mas não efetivou o rompimento da estrutura colonial, mantendo a escravidão, o latifúndio e a monocultura voltada para exportação.

GUERRAS DE INDEPENDÊNCIA

A separação política entre Brasil e Portugal não foi imediatamente aceita em todo o território. Governadores de algumas províncias, que se julgavam fiéis a Portugal, resistiram ao novo governo. Entretanto, era grande o número de brasileiros que estavam dispostos a não permitir um retrocesso político.
Para conter os lusos que se levantavam contra Dom Pedro I, foram contratados mercenários, principalmente ingleses e franceses. Formaram-se milícias civis populares, especialmente nas províncias do Nordeste, que foram fundamentais no enfrentamento contra os representantes do colonialismo lusitano.

Praticamente não houve ajuda aos brasileiros da parte dos vizinhos hispânicos. Havia muita desconfiança em relação ao Brasil por diversos fatores, como a manutenção da monarquia e o fato de o dirigente máximo do país ser legítimo herdeiro do trono da antiga metrópole. Muitos acreditavam que Dom Pedro I poderia ser uma espécie de porta pela qual se abriria o caminho para a recolonização da América Latina pelos países ibéricos. É curioso que, enquanto se pensava isso, Pedro I passava a fio de espada os portugueses que se opunham a sua coroação.

Dentre os militares estrangeiros que foram contratados para comandar a luta contra os portugueses destacaram-se Lord Cochrane, Pierre Labatut, John Taylor e John Grenfelld. Os irmãos Andrada realizaram uma verdadeira coleta de recursos junto aos fazendeiros mais bem-servidos financeiramente, assim como nem bem um novo governo havia começado e já se conheciam aumentos de impostos; tudo com o objetivo de financiar as tropas pró-independência.

Em algumas províncias, como Bahia, Pará e Cisplatina, os conflitos foram mais violentos, principalmente na Bahia, onde populares, como a heroína Maria Quitéria, lutaram ao lado de homens como Cochrane e Labatut, que, se pelo menos não o faziam por patriotismo, o fato de serem muito bem pagos garantiu a eficácia de suas ações.

As tropas portuguesas, comandadas por Madeira de Melo, acabaram derrotadas e expulsas em julho de 1823. Nos meses seguintes, foram vencidas tropas lusas no Piauí, no Maranhão, no Pará e na Cisplatina, mas, nessa última, a luta não teve o apoio dos locais, uma vez que se buscava a separação em relação ao Brasil. No final de 1823, todos os focos contra Pedro I estavam debelados.

ORGANIZAÇÃO POLÍTICA



No plano internacional, uma onda reacionária predominava na Europa do início do XIX. O Congresso de Viena pretendia restabelecer as antigas fronteiras e estruturas políticas que vigoravam no momento político anterior à Revolução Francesa. Mas, enquanto isso, os Estados Unidos procuravam estabelecer sua própria área de influência e, por isso, buscaram impedir que as potências europeias influenciassem a política interna da América Latina.

É nesse quadro, denominado Doutrina Monroe, que os Estados Unidos foram os primeiros a reconhecer a independência do Brasil, em 1824. A Inglaterra também o fez, apesar de ser tradicional aliada dos portugueses, mas o que contava naquele momento era o imenso mercado consumidor brasileiro.
Os ingleses ainda conseguiram que Portugal reconhecesse a independência brasileira em 1825, mas, para isso, foi necessário cumprir uma série de exigências dos lusos, como o pagamento de uma indenização de dois milhões de libras esterlinas e a concessão do título de imperador honorário do Brasil para Dom João VI, através do Tratado de Paz e Aliança.

Graças à sua ação mediadora, a Inglaterra obteve importantes vantagens comerciais com o Brasil. Em 1827, foram reafirmados os Tratados de 1810, retificando-se as tarifas alfandegárias. O governo brasileiro comprometeu-se, também, a extinguir o tráfico negreiro até 1830, mas tal medida não foi cumprida, uma vez que nossa economia era muito dependente da escravidão.

O baixo preço das mercadorias vendidas no Brasil, principalmente depois que Dom Pedro I estendeu a tarifa alfandegária de 15% para outros países, inviabilizou o desenvolvimento de uma indústria interna, ampliando o déficit comercial. O Brasil era obrigado a recorrer a empréstimos, tornando congênita a dependência em relação aos ingleses.

Logo após a proclamação da independência, reuniu-se uma Assembleia Nacional Constituinte, composta por 90 deputados, em sua maioria grandes proprietários rurais influenciados pelo Liberalismo francês e que eram genericamente chamados de Partido Brasileiro. Havia outro grupo político: era o Partido Português, defensor do retorno do Brasil à condição de colônia e que incentivava as tendências absolutistas do monarca.

Mas, no início dos trabalhos da Constituinte, começaram também os choques com  o Imperador, de formação absolutista, e que pretendia fazer valer sua preponderância sobre os súditos, fossem fazendeiros, funcionários públicos, militares. É bom lembrar que, no biênio 1822/ 1823, o país ainda enfrentava as guerras de independência, causando um certo sentimento de xenofobia em relação aos lusos.

Foi nesse ambiente que Antônio Carlos de Andrada apresentou um projeto que recebeu a alcunha de Constituição da Mandioca, isso pelo seguinte: o processo eleitoral seria censitário e a participação na vida política, restrita à minoria da população. Tanto eleitor quanto candidato deveriam submeter-se à comprovação de renda anual, que era medida através da comparação com o valor de alqueires plantados com mandioca. Era necessário possuir uma renda semelhante a 150 alqueires de mandioca para ser um simples eleitor; 500 alqueires para ser deputado e o dobro para pleitear o cargo de senador.

O projeto foi rejeitado pelo imperador, mas a razão de tal atitude estava longe de ser uma manifestação favorável a uma verdadeira democracia.  A proposta da Assembleia Constituinte também propunha a subordinação do Executivo, no caso o imperador, ao Legislativo, e este último também controlaria as Forças Armadas. Em outras palavras, pretendia-se transformar o Brasil em uma monarquia parlamentar, assim como se via na Europa liberal.

O monarca não aceitou a proposta e as palavras pronunciadas por ele durante o início dos trabalhos, “Quero uma Constituição digna do Brasil e de mim”, ainda ecoavam nos ouvidos dos parlamentares. Uma vez que a Assembleia recusou-se a conceder-lhe o poder de veto, Dom Pedro I determinou a dissolução da Constituinte.

Tais desencontros culminaram na Noite da Agonia (de 11 para 12 de novembro de 1823), quando os constituintes declararam-se em assembleia permanente, recusando-se a dispersar conforme ordem do Imperador. A reação de D. Pedro I foi enérgica: ordenou a suas tropas que invadissem o recinto da Constituinte e dispersassem à força os deputados.



Foi, então, nomeada pelo Imperador uma comissão de dez “notáveis” para elaborar uma Constituição "ainda mais liberal", mas a redação final coube a Carneiro de Campos, que era conhecido por estar ligado à corte portuguesa. A Constituição Outorgada ficou pronta em 1824 e as principais características dela foram:
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O voto era censitário, ou seja, limitação da participação dos eleitores pela renda que possuíam;
·      Os senadores eram vitalícios;
·     Igreja vinculada ao Estado: pelo regime do Padroado, delegava ao Estado a nomeação e a remoção de padres e bispos, e, através do beneplácito, qualquer instrução vinda de Roma precisaria da concordância do monarca;
·       Havia quatro poderes:
1.     Executivo:  exercido pelo  Imperador e por ministros de Estado escolhidos pelo monarca;
2.     Legislativo:  composto por deputados eleitos por voto censitário e indireto e senadores vitalícios;
3.     Judiciário: exercido por juízes e magistrados, todos nomeados pelo imperador;
4.     Moderador: exclusivo do Imperador. O monarca  tinha direito de dissolver a Câmara, escolher senadores a partir de uma lista tríplice e cassar parlamentares e juízes.
Pode-se notar que o Brasil iniciou sua história independente de forma elitista e centralizadora, muito embora tentasse divulgar uma imagem progressista.

PROBLEMAS POLÍTICOS DO PERÍODO

Com a dissolução da Assembleia Nacional Constituinte, explodiu em 1824, na província de Pernambuco, uma rebelião que ficou conhecida como Confederação do Equador, liderada por Manuel de Carvalho Paes de Andrade e contando com o apoio de Frei Joaquim do Amor Divino Rebelo, ou simplesmente Frei Caneca, responsável pelo jornal republicano Tífis Pernambucano, e pelo jornalista Cipriano Barata, que editava vários jornais pelo Nordeste, dentre eles o Sentinela da Liberdade. As propostas contaram com a adesão das províncias da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará. Tal evento pode ser visto como um desdobramento da fracassada Insurreição Pernambucana de 1817, pois o setor açucareiro continuava em crise e as ideias liberais eram ainda mais fortes naquela parte do país.

O clima tornou-se tenso quando a Junta Democrática e Independente foi destituída de seus poderes de governar a região, isso por ordem do próprio José Bonifácio. A formação de uma nova junta, muito mais conservadora do que a anterior, não agradou a população. A manutenção de Paes Andrade no cargo foi um sinal de rompimento com o poder central.
A Confederação adotou o regime republicano e, provisoriamente, utilizou a Constituição colombiana. Mas a decisão de abolir a escravidão fez que os rebeldes perdessem o apoio da aristocracia rural. A divisão entre os revoltosos facilitou a repressão.

O movimento foi violentamente reprimido pelas forças imperiais, lideradas pelos mercenários Cochrane e Taylor, além do brigadeiro Francisco de Lima e Silva (pai daquele que se tornou o Duque de Caxias). Cercados e divididos, os confederados foram derrotados. Paes de Andrade conseguiu asilo político na Inglaterra e Frei Caneca foi condenado à morte por enforcamento. Como não se conseguiu encontrar um carrasco que executasse a pena, o frei carmelita teve de ser fuzilado (quadro ao lado). Esse fato comprometeu a popularidade de D. Pedro I, que passou a ser visto cada vez mais como um tirano pelos brasileiros.

No plano externo, a província Cisplatina, sob a liderança de Lavalleja, separou-se do Brasil e, posteriormente, foi anexada pela Argentina. A guerra que se sucedeu entre Brasil e Argentina consumiu vultosas somas retiradas dos cofres públicos, bem como um grande número de vidas de ambos os lados. A Guerra ou Questão da Cisplatina (1825/ 1828) só foi resolvida com a intermediação da Inglaterra, que acabou por incentivar a criação da República Oriental do Uruguai.

Outro problema externo que Pedro I enfrentou foi a sucessão do trono português. Em 1826, com a morte de Dom João VI, o monarca brasileiro passou a ser o legítimo herdeiro da coroa de Portugal. Se por um lado havia a possibilidade de o Brasil voltar a  ser colônia portuguesa, o imperador temia que os brasileiros retomassem a luta por um modelo monárquico liberal, assim como era em Portugal desde a Revolução do Porto. Dom Pedro I decidiu-se pela abdicação em favor de sua filha, Maria da Glória, então com 7 anos de idade. Esta seria tutelada por Dom Miguel, irmão de D. Pedro I e regente do trono até a maioridade da sobrinha. Entretanto, Dom Miguel aprisionou a sobrinha, usurpou a coroa e autoproclamou-se rei de Portugal.

Dom Pedro I moveu uma guerra contra seu irmão a fim de recuperar a coroa para a filha. Os gastos com tal conflito foram tantos que o Banco do Brasil abriu falência. Os opositores do monarca não lhe pouparam críticas. Dois jornais destacavam-se nesse exercício: A Aurora Fluminense, sob a responsabilidade de Evaristo da Veiga e mais moderado, e O Observador Constitucional, que tinha à frente o jornalista Líbero Badaró, que acusava o imperador de ser antibrasileiro.
Vitorioso na guerra contra o irmão, Dom Pedro I não dava sinais de que pretendia abrir espaço para seus opositores. Isso incentivou alguns partidários do monarca a defendê-lo dos inimigos. Foi isso que levou um juiz paulista a contratar um pistoleiro para assassinar Líbero Badaró no centro de São Paulo.

Tendo sua popularidade seriamente abalada pelos episódios da Constituinte, da execução de Frei Caneca, da questão Cisplatina, da guerra de sucessão e da morte de Líbero Badaró, D. Pedro I resolveu visitar pessoalmente algumas províncias como forma de aproximar-se de seus súditos. A primeira visita foi à província de Minas Gerais, onde foi recebido friamente, chegando a ver casas nas quais havia tecidos pretos nas janelas em sinal de luto.

Os portugueses residentes no Rio de Janeiro prepararam uma grande festa para receber o Imperador e seu retorno à capital, mas os brasileiros tentaram destruir os preparativos e acabaram envolvendo-se em uma "batalha" com os portugueses. O episódio de 13 de março de 1831 ficou conhecido como Noite das Garrafadas, e serviu como mais um significativo indicador da impopularidade do Imperador.

D. Pedro I decidiu, então, formar um gabinete somente com brasileiros, mas dissolveu esse gabinete logo depois de um mês, substituindo-o pelo Ministério dos Marqueses, composto somente com pessoas de sua confiança. A população passou, então, a exigir a volta do Ministério dos Brasileiros e D. Pedro I, determinado a não recuar, renunciou em favor de seu filho, Pedro de Alcântara, e partiu para Portugal a bordo da fragata inglesa Warspite.

"A abdicação de D.Pedro I", Aurelio de Figueiredo, 1991, Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro.


Na data da abdicação, 7 de abril de 1831, o herdeiro tinha 5 anos de idade, o que fez necessário um requerimento de nomeação de um corpo regente para administrar o Império até a maioridade do Imperador, como mandava a Constituição de 1824. Como o  Parlamento estava em recesso, foi nomeada uma Regência Trina Provisória até o retorno dos deputados. Os integrantes dessa regência, que durou de abril a julho de 1831, foram os senadores Nicolau de Campos Vergueiro e José Joaquim de Campos, além do brigadeiro Francisco de Lima e Silva

PERÍODO REGENCIAL (1831-1840)

Forças de diversos setores da sociedade (elite rural, camadas médias, republicanos, liberais e grupos populares) uniram-se e formaram uma oposição “nacionalista” contra o imperador, visto como um inimigo comum naquele momento. Mas o que houve, na verdade, como decorrência dessa subordinação das camadas populares à liderança da aristocracia rural, foi o estabelecimento de um governo que se diferenciava muito pouco do anterior. No entanto, o afloramento de aspirações populares não foi sufocado com facilidade. Por isso, o período regencial costuma ser visto como o mais conturbado e problemático de toda a fase monárquica brasileira.
Ao analisarmos o contexto político da Regência, precisamos pensar nos conceitos de federalismo e de centralismo, pois o primeiro implica na concessão de maior autonomia às regiões que integram um país, partilhando o poder com os grupos políticos locais, enquanto o segundo, se conduz na direção oposta, o poder político esta concentrado num pólo e dele partem as decisões, acatadas pelas demais partes.

Definiu-se um “novo” quadro partidário na política interna. No Partido Brasileiro, que já estava dividido em duas facções antes da abdicação, a partir de 1831, consolidou-se a divisão em Partido Liberal Moderado, representante da aristocracia rural que defendia a partilha das responsabilidades administrativas, do poder e dos tributos com o governo central, Partido Liberal Exaltado, fruto da aglutinação de representantes das camadas urbanas e partidário de uma ampla autonomia para as províncias e, finalmente, o Partido Restaurador, herdeiro do Partido Português e que lutava pela volta de Dom Pedro I ao trono, logo dissolvido em virtude da morte deste em 1834.

Com o fim do recesso parlamentar e o retorno dos parlamentares, foi nomeada uma Regência Trina Permanente, composta por José da Costa Carvalho, João Bráulio Muniz e pelo mesmo Francisco Lima e Silva, que representava os militares.
O clima de agitação que vinha desde abril acabou repercutindo em motins nos batalhões de infantaria no Rio de Janeiro, tanto da polícia quanto do exército. Os revoltosos apresentavam reivindicações que iam de reformas democráticas à deportação dos senadores portugueses.

O ministro da Justiça da época era um líder moderado, Padre Diogo Antônio Feijó, que assumira o cargo com plena autonomia para reprimir quaisquer manifestações, tornando-se o “homem forte” da Regência. Requisitando soldados instalados em Minas Gerais e São Paulo, Feijó pressionou os rebeldes, que retiraram suas exigências. Tais movimentos eram um sinal de que as tropas regulares não eram dignas de confiança da parte dos regentes, fazendo-se necessário tomar alguma atitude no sentido de garantir o poder da elite agrária.


Foi com esse objetivo que, em agosto de 1831, o ministro da Justiça criou a Guarda Nacional, uma força paramilitar composta por cidadãos com renda anual superior a 200 mil-réis. Os comandantes da Guarda eram escolhidos por eleição direta, podendo receber do governo a patente de coronel ou major. Em virtude de sua influência, os latifundiários foram os responsáveis pelo comando da Guarda, ficando livres para selecionar pessoas que lhes permitissem exercer o poder local de fato, desse processo derivou o fenômeno político, denominado a posteriori, de coronelismo.
Em 1832, ocorreu uma tentativa de golpe que tinha por objetivo reconduzir Dom Pedro I ao trono, mas acabou fracassando. Os moderados estavam convictos de que tal evento havia sido preparado e patrocinado por José Bonifácio, o que, inclusive, chegou a ameaçar sua tutoria sobre o herdeiro da Coroa.

Os embates políticos opunham moderados e restauradores, abrindo caminho para o chamado Avanço Liberal, que culminou com a aprovação de reformas constitucionais pela Assembleia Geral. As principais medidas tomadas foram somadas a outras já estabelecidas entre 1832 e 1833, como a concessão de poderes para que os deputados modificassem a Carta de 1824 e a criação do Código de Processo criminal (o que dava maior autonomia judiciária aos municípios).

O Ato Adicional de 1834 , no qual a redação final espelhou as opiniões do articulador político Bernardo Pereira de Vasconcelos, introduziu algumas alterações importantes na Constituição Brasileira, como a substituição dos Conselhos Provinciais pelas Assembleias Legislativas (que podiam legislar sobre questões civis e militares, ensino público, política e economia local), fim do Conselho de Estado (principal órgão assessor do imperador), transformação da Regência Trina em Regência Una (sendo que o pretendente ao cargo seria eleito por voto direto) e, por fim, a cidade do Rio de Janeiro seria separada da Província Fluminense e transformada em Município Neutro.
Realizadas as eleições, assim como determinou o Ato Adicional, foi eleito regente uno o Padre Feijó, que tomou posse em outubro de 1835. Um ano antes, em setembro de 1834, morria Dom Pedro I, pondo fim ao movimento restaurador.

O Ato Adicional provocou uma reorganização do quadro partidário, principalmente com o fim dos restauradores. Conservadores, liberais moderados e restauradores aglutinaram-se em um grupo que, em comum, não via com bons olhos a “liberdade” que o Ato Adicional havia proporcionado. Por discordarem da nova ordem política, passaram a ser chamados de regressistas, em oposição aos defensores dos termos do Ato, que ficaram conhecidos como progressistas. É preciso tomar muito cuidado com essas denominações, que retratam muito mais os embates pelo poder político naquele momento, existindo muito pouco, ou quase nada, de divergências de caráter ideológico ou social.

Os dois anos em que o Padre Feijó esteve à frente do governo foram muito difíceis. Ele governou sem maioria no Parlamento, o que o impedia de conseguir o apoio necessário para levar adiante sua administração. Foi também nessa fase que explodiram as mais violentas revoltas nas províncias, como a Cabanagem, no Pará, e a Farroupilha, no Rio Grande do Sul. Diante das dificuldades de derrotar os rebeldes e das sucessivas crises geradas pelas disputas políticas entre regressistas e progressistas, Feijó renunciou ao cargo. O conservador Pedro de Araújo Lima foi escolhido para substituí-lo em caráter interino.




As eleições de 1838 confirmaram o mesmo Araújo Lima no cargo de regente uno, mas seu governo terminou antes dos quatro anos previstos pelo Ato Adicional, em virtude da antecipação da maioridade de Dom Pedro II. O gabinete formado por Araújo Lima ficou conhecido como Ministério das Capacidades, pois era formado por personalidades ilustres da época, como Bernardo Pereira de Vasconcelos e Miguel Calmon.
Entre as obras realizadas nesse período, pode-se citar a criação do Colégio Pedro II, a fundação de uma Escola de Agricultura no Rio de Janeiro e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, além de uma reestruturação do Exército.

Verifica-se nessa fase uma rearticulação de políticos mais conservadores, com o objetivo de anular as leis liberais aprovadas no início das regências e recuperar a preponderância do poder central sobre as províncias. Essas medidas ficaram conhecidas como regresso conservador. Em maio de 1840, em meio aos protestos dos liberais, era aprovada a Lei Interpretativa do Ato Adicional, suprimindo a autonomia das províncias, o que garantiu a centralização, além de submeter a Guarda Nacional a delegados nomeados pelo poder central. A regência, que começara liberal, caminhava para seu fim nas mãos dos conservadores, e isso tem uma explicação: a ascensão da economia cafeeira.

Por volta de 1830, o café já estava prestes a tornar-se o principal produto de exportação do Brasil, suplantando o açúcar. Os líderes políticos que se identificavam com os conservadores eram representantes da nova elite cafeeira. Foi nesse ambiente que os liberais progressistas começaram a cogitar a possível antecipação da maioridade de Pedro II.

REBELIÕES REGENCIAIS

O Período Regencial foi uma época extremamente conturbada da vida nacional, marcado por revoltas e agitações políticas provocadas pelo “vazio político” gerado pela vacância do Trono, já que o papel do Imperador, enquanto chefe de Estado era agir como a “cabeça da Nação” e assim, a menoridade de D. Pedro produziu a sensação de que o Império “não tinha um governo”, estando portanto, acéfalo.
Para as camadas livres, mas que não eram proprietárias, a revolta tornou-se a única perspectiva de alteração do quadro social. Assim, em vários pontos do País, ocorreram movimentos rebeldes que buscavam desde a autonomia local até a implantação da república. Questionava-se o excesso de centralização política, a cobrança de impostos exorbitantes e a miséria que assolava a maioria da população.

CABANAGEM (1835 – 40) - A revolta dos cabanos teve como ponto de partida dois elementos: as disputas locais em torno da nomeação do presidente da província do Grão-Pará, o que acabou dividindo a elite local e por outro lado, a imensa miséria que predominava na província, inclusive na capital Belém. O termo “cabano” deveu-se à efetiva participação da população humilde (índios, mestiços e negros), que morava em casebres próximos aos rios.
Durante o período colonial, o Pará era dominado por um poderoso grupo de comerciantes portugueses, aliados dos altos funcionários civis e militares, controlando o escoamento da produção da província, como tabaco, arroz, cacau e as “drogas do sertão”.   Insatisfeitos com os privilégios das oligarquias e também com o objetivo de melhorar as precárias condições de vida que levavam, os rebeldes tomaram a cidade de Belém em janeiro de 1834, executaram Bernardo Lobo de Sousa, que era o governador local, e assumiram o governo.
O primeiro governo cabano foi presidido por Félix Antônio Clemente Malcher, um antigo marginalizado político do período pós-independência. Entretanto, surpreendendo a todos, Malcher declarou-se fiel ao imperador e prometeu ficar no poder até a maioridade deste. Deu início a uma repressão contra os próprios companheiros que o haviam colocado no poder, como Vicente Ferreira Lavor e Eduardo Nogueira Angelim.

Enquanto realizava um governo hesitante, Malcher permitiu a ascensão do comandante das Armas, o lavrador Francisco Pedro Vinagre, que acabou por derrubá-lo, executá-lo e substituí-lo no cargo. Mas, uma vez presidente, Francisco Vinagre apresentou o mesmo comportamento autoritário de seu antecessor, chegando a ameaçar entregar ao poder central todos aqueles que fossem contrários à regência. Seu irmão, Antônio Vinagre, conseguiu que as negociações com o governo regencial cessassem e, apesar da traição, Francisco foi mantido no cargo.
O governo regencial enviou uma tropa chefiada por Manuel Jorge Rodrigues para assumir o poder em Belém. Francisco Vinagre traiu os cabanos pela segunda vez e o contingente militar do governo assumiu o controle da capital.

No interior, os cabanos reagruparam-se e avançaram sobre Belém, retomando o controle da cidade em agosto de 1835. Enquanto Jorge Rodrigues refugiava-se, os revoltosos proclamaram a república e a independência da província. O novo governo, marco da primeira revolta da história brasileira na qual o povo chegou ao poder, foi chefiado pelo cearense Eduardo Angelim.
Mas, no ano seguinte, a regência enviou uma poderosa esquadra com o novo presidente nomeado: o brigadeiro Francisco José de Sousa Soares. A frota da repressão desembarcou em Belém em maio de 1836, depois de enfrentar uma pequena resistência. Enfraquecidos, desunidos e desorganizados, os cabanos recuaram novamente, abrindo caminho para uma das mais violentas repressões de que se tem notícia no Brasil, deixando um saldo de mais de 30 mil mortos, cerca de 20% da população paraense.

SABINADA (1837 - 38) -  Na fase regencial, eclodiram várias rebeliões de escravos, sendo a mais importante a Revolta dos Malês, de 1835, protagonizada por negros islâmicos que lutavam contra a escravidão e a imposição do catolicismo. Apesar do sucesso inicial ao tomarem Salvador por três dias, foram duramente reprimidos pelo governo provincial, implicando na execução de seus líderes e o banimento dos demais envolvidos.

Mas o caráter radical de revoltas como essa influenciou a articulação nos movimentos seguintes, pois seus líderes recusavam-se a mobilizar a camada popular, temerosos de perder o controle sobre ela. Esse foi o caso da Sabinada, que recebeu esse nome por ter como líder o médico Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira, à frente de um movimento restrito à classe média de Salvador.

O motivo da rebelião foi a insatisfação com as autoridades nomeadas pelo governo regencial, centralizadoras e autoritárias, levando os rebeldes a proclamar a República Bahiense. Entretanto, não havia um ideal separatista, pois o objetivo era manter a autonomia provincial somente até a maioridade de Pedro II. Mas a repressão do governo foi violenta. Tropas comandadas pelo Marechal João Crisóstomo Calado, com a ajuda dos fazendeiros da zona do Recôncavo, dominaram os rebeldes em março de 1838, com centenas de pessoas presas e cerca de 1800 mortas, inclusive os principais líderes, que terminaram executados.

BALAIADA (1838 - 41) - Em dezembro de 1838, eclodiu no Maranhão uma revolta que só foi esmagada depois de dois anos de sangrentas lutas. Como um de seus chefes, Manuel Francisco dos Anjos Ferreira, era fabricante de balaios (cestos), o movimento ficou conhecido como “Balaiada”. Mas, a rigor, esta não foi uma revolta unificada. Ao lado de Francisco dos Anjos, Raimundo Gomes, o “Cara Preta”, e Cosme Bento das Chagas também se destacaram, sendo que este último liderava um grupo de aproximadamente 3000 escravos fugitivos.

A principal atividade econômica do Maranhão era o cultivo e a exportação de algodão, mas a região enfrentava uma terrível decadência, devido à concorrência com os Estados Unidos.
Os rebeldes, constituídos por pobres e miseráveis, incluindo escravos que sonhavam com a liberdade, contestavam os privilégios dos latifundiários e comerciantes portugueses. Os balaios chegaram a ocupar a Vila de Caxias, importante centro urbano da província, e ameaçaram tomar a capital São Luís.
Devido à falta de unidade entre os rebeldes, o movimento entrou em rápido declínio, facilitando os trabalhos das tropas regenciais, chefiadas pelo Coronel Luís Alves de Lima e Silva, que reprimiram o movimento e retomaram o poder na província. Inclusive foi devido a essa vitória que o coronel recebeu o título de Barão de Caxias.
A definitiva “pacificação” da revolta só ocorreu com a anistia concedida aos rebeldes sobreviventes, em 1841, seguida da manutenção da condição de escravos para os negros que haviam participado da rebelião e do enforcamento de Cosme Bento, em 1842. O próprio Caxias estimou em mais de mil o número de mortos entre os rebeldes.



REVOLUÇÃO FARROUPILHA (1835 -1845) - No Rio Grande do Sul, ocorreu a Guerra dos Farrapos que, pelos seus dez anos de duração, foi a guerra civil mais prolongada da história brasileira. Apesar do nome do movimento ser uma referência aos esfarrapados que compunham a maioria das tropas rebeldes, tal mobilização deve ser entendida como uma revolta da elite gaúcha criadora de gado.

Alguns fatores contribuíram para a eclosão do movimento, como as lutas políticas entre moderados (chimangos) e exaltados (farroupilhas). Estes últimos acusavam o governo de não atender às necessidades da província e exigiam maior autonomia. Outra questão era a própria realidade econômica do Rio Grande do Sul, bem diferente do que se via no restante do País. Os gaúchos formaram-se a partir da criação de gado nas estâncias (latifúndios), tendo a produção de charque (carne salgada), graxa e couro voltada para o mercado interno desde a época da mineração. Porém, no início do século XIX, era grande a concorrência entre o charque produzido no Sul e o importado de países como Paraguai e Argentina, principalmente devido às baixas taxas alfandegárias pagas pelos produtos de fora. Em contrapartida, os estancieiros eram obrigados a pagar impostos muito altos e ainda tolerar que os preços de seus produtos fossem determinados pelo governo central.   
Junta-se a tudo isso a propagação de ideais republicanos e separatistas, pois é preciso lembrar que o Brasil era a única monarquia de toda a América.



Em 1835, os farroupilhas exigiram a destituição do novo presidente da província, Antônio Rodrigues Fernandes Braga. Em setembro do mesmo ano, tropas rebeldes lideradas pelo estancieiro Bento Gonçalves da Silva (quadro ao lado) ocuparam Porto Alegre. No ano seguinte, os revoltosos proclamaram a República Riograndense, com sede na Vila de Piratini. Bento Gonçalves tornou-se o primeiro presidente do Rio Grande independente, mas acabou sendo preso num combate contra as tropas unionistas. Foi conduzido à Bahia em 1837, mas, com a explosão da Sabinada e a ajuda de integrantes de lojas maçônicas, teve a oportunidade de fugir e retornar ao Sul, onde reassumiu o comando dos farrapos.
Logo a revolta espalhou-se e atingiu Santa Catarina em 1839, onde foi proclamada a República Juliana, através de um movimento armado liderado por Davi Canabarro e Giuseppe Garibaldi, este último um líder revolucionário italiano, exilado na América, que combatera junto aos movimentos republicanos dos países platinos e se juntara à causa dos farrapos, onde conheceu a brasileira Anita, a qual desposou e ficou conhecida como Anita Garibaldi, companheira inclusive nas batalhas. A participação de Garibaldi nos movimentos latino-americanos e depois seu retorno à Itália para lutar pela Unificação italiana colaborou para a construção da imagem que hoje lhe associamos: “ o herói de dois mundos”.

Em 1840, Dom Pedro II assumiu o trono e, com a intenção de estabilizar politicamente o País, ofereceu anistia a todos os revoltosos. No entanto, tal medida não surtiu o efeito esperado e os farroupilhas insistiram na luta.
Em 1842, o Barão de Caxias, Luís Alves de Lima e Silva, foi destacado para sufocar a rebelião. Através do corte das vias de comunicação entre gaúchos e uruguaios e da negociação com os rebeldes, Caxias conseguiu abrandar o ímpeto revolucionário. É importante ressaltar que havia um desgaste econômico na província, uma vez que, separado do Brasil, o Rio Grande autoprivou-se de seu principal mercado consumidor.
Para reincorporar a província e por fim à rebelião, Caxias e Davi Canabarro estabeleceram termos que demonstraram boa vontade do governo, apesar das enormes perdas de ambos os lados. Os rebeldes foram anistiados e soldados e oficiais do exército gaúcho foram incorporados ao exército imperial, desfrutando o direito de manter suas patentes. As terras confiscadas pelo governo durante a guerra foram devolvidas aos antigos proprietários e, por fim, os impostos sobre os produtos derivados do gado foram sensivelmente reduzidos.
Como se pode perceber, o movimento elitista dos farrapos terminou em uma mesa de negociações. Já os outros movimentos da época não tiveram a mesma sorte e foram reprimidos com rigor.

GOLPE DA MAIORIDADE

A maioridade do herdeiro do trono só ocorreria em dezembro de 1843. Mas, diante da hegemonia do Partido Conservador, os liberais lançaram uma proposta de antecipar a maioridade do Imperador. O pretexto era de que esta seria a única alternativa para garantir a governabilidade do País e impedir a fragmentação do território, uma vez que o imperador seria “neutro”. Os liberais, na verdade, contavam que, com a ascensão do monarca ao trono, este convidasse o Partido Liberal para a formação de seu gabinete. Surgiram sociedades com o objetivo de promover campanhas pela coroação de Dom Pedro II. Aderiram ao movimento personalidades como Francisco de Lima e Silva, Teófilo Otoni, José Martiniano de Alencar e os irmãos Andrada.

Queremos Pedro Segundo
Embora não tenha idade
A nação dispensa a lei
E viva a maioridade

(versos de autor anônimo)

Os “maioristas” fundaram o Clube da Maioridade para divulgar seus propósitos, e chegou-se a formar uma Comissão, que foi enviada para sondar a opinião do imperador a respeito do assunto. Dom Pedro II não teve dúvidas e aceitou a ideia.

D. Pedro II, Felix Taunay, c. 1837, Museu Imperial, Petrópolis, Rio de Janeiro


A campanha da “maioridade já” ganhava as ruas e, em julho de 1840, a Assembleia Geral proclamava a maioridade do herdeiro. Pedro de Alcântara, então com 15 anos, foi coroado Imperador do Brasil em 18 de julho de 1840. Durante os 49 anos seguintes, a política brasileira foi conduzida por Dom Pedro II, mas o panorama partidário que dominaria todo o Segundo Reinado já estava constituído: uma monarquia parlamentarista, com dois grandes partidos (Liberal e Conservador) e sem base ideológica distinta entre ambos, pois bem se dizia naquele contexto : “Não há nada mais parecido com um ‘Saquarema’ [Conservador] no poder do que um ‘Luzia’ [Liberal] na oposição”.

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