Fala do Trono durante a Abertura da Assembleia Legislativa
Pedro Américo, c.1873, Museu Imperial, Petrópolis.
Alguns autores defendem a importância dos políticos republicanos no fim da monarquia. Mas é importante destacar que essa participação parece não ter sido tão forte, já que o Partido Republicano foi fundado em 1870 e, mesmo gozando da mesma liberdade concedida aos outros partidos, elegeu pouquíssimos vereadores em 19 anos de existência.
Em 1870,
ano de sua fundação, o Partido Republicano publicou o Manifesto Republicano, no
qual atacava a centralização do poder e o despotismo. No entanto, esta última
expressão não pode ser entendida ao pé da letra, mas, sim, como fruto da visão
da época, no calor dos acontecimentos. Pelo Manifesto, via-se a
descentralização político-administrativa como a melhor solução para as
províncias, que passariam a ter, com a República, autonomia para atender às
conveniências das camadas dominantes locais.
Os
interesses haviam se diversificado de tal forma que não era mais possível
subordinar-se apenas às decisões da aristocracia escravista, que, apesar de
falida, ainda detinha o poder político.
Durante os primeiros 20 anos do Segundo Reinado, os
partidos Liberal e Conservador dominaram a cena política. Em 1868, o primeiro
dividiu-se em moderado e radical. O
setor radical adotou os ideais republicanos e, em 1870, nascia o Partido
Republicano - primeiramente no Rio de Janeiro e, depois, em São Paulo.
Rapidamente, clubes e jornais republicanos divulgaram suas ideias pelo País.
Os principais membros do partido eram profissionais
liberais e comerciantes, que recebiam o apoio das populações empobrecidas, do
interior e dos centros urbanos, além da solidariedade dos fazendeiros do Oeste
Paulista (os fazendeiros do Vale do Paraíba não participavam de tal movimento).
Em 1873,
na província de São Paulo, reuniu-se a Convenção de Itu, através da qual a
elite cafeicultora paulista aderiu formalmente ao movimento republicano. Dos
poderosos participantes dessa convenção, saíram futuros presidentes da
República, como Prudente de Morais e Campos Sales.
Era
possível perceber que existiam duas facções no Partido Republicano. Na
primeira, estavam os revolucionários, que desejavam a
implantação da República através de uma revolução popular. Seu principal líder
era o advogado Antônio da Silva Jardim, um ativo, inflamado e intransigente
defensor da República e da abolição do trabalho escravo.
Mas os
republicanos eram em sua grande maioria contrários à revolução. O principal
representante dessa corrente de evolucionários era Quintino
Bocaiúva. A esse grupo também juntaram-se os seguidores do filósofo
francês Augusto Comte, fundador do Positivismo, movimento que, inclusive,
inspirou a inscrição “ordem e progresso” na bandeira brasileira.
Do ponto
de vista ideológico, a implantação do regime republicano estava associada à
difusão dos ideais políticos do Positivismo. Entre o final do século XIX e
início do XX, alguns pensadores tomaram como parâmetro o desenvolvimento das
ciências da natureza e procuraram dar fundamentos científicos ao conhecimento
humano. Havia a convicção de que uma ciência sobre os homens teria de passar
pela negação das religiões, pois estas representariam entraves à busca pelo
conhecimento. Essa doutrina foi abraçada, principalmente, pela jovem
oficialidade do exército.
É interessante ressaltar que a influência política dos
positivistas só se efetivou plenamente no Brasil depois da Proclamação da
República.
Além dos
pensamentos positivistas, alguns fatores imediatos precipitaram o fim da
monarquia brasileira. Pode-se dizer que o Império Brasileiro apoiava-se sobre
três colunas: a aristocracia militar, a Igreja Católica e os fazendeiros
escravistas. Só que o regime acabou perdendo o apoio de cada um desses grupos
em episódios que demonstraram a inabilidade dos monarquistas para realizar
reformas que agradassem aos insatisfeitos e permitissem a sobrevivência do
império.
QUESTÃO RELIGIOSA
O
catolicismo era a religião oficial do Brasil e, como em Portugal, a
Igreja estava subordinada ao Estado. A Constituição Imperial, já em sua
primeira versão de 1824, previa entre seus artigos duas características
herdadas das constituições portuguesas. A primeira era o Padroado, que dava ao
imperador o direito de nomear e remunerar membros do clero, que ficavam, desta
forma, subordinados diretamente ao monarca. A segunda era o beneplácito, que exigia
que qualquer Bula (decreto emitido pelo Papa) fosse aprovada pelo Império antes
de vigorar em território brasileiro.
Em 1864, o
Papa Pio IX emitiu a Bula Syllabus
condenando a “ordem secreta” da maçonaria e proibindo o clero de participar
dessa sociedade. O Império, entretanto, não aprovou tal documento, pois muitos
políticos (e, provavelmente, o próprio Dom Pedro II) eram maçons.
Desrespeitando o imperador, porém obedientes ao Papa, o
bispo de Olinda, Dom Vital de Oliveira, e o bispo de Belém, Dom Macedo,
expulsaram vários padres e suspenderam irmandades de suas dioceses por práticas
maçônicas.
Por
solicitação das irmandades atingidas, Dom Pedro II anulou as suspensões. Como
os bispos não voltaram atrás em suas decisões, foram julgados e condenados a
quatro anos de prisão e trabalhos forçados. A comutação da sentença, feita pelo
Primeiro Ministro Duque de Caxias, não livrou o Império do mal-estar de haver
condenado clérigos, nem lhe devolveu o apoio da Igreja. As prisões afastaram os
católicos do governo imperial.
QUESTÃO ESCRAVISTA
Os cafeicultores da Baixada Fluminense atravessavam grandes dificuldades
financeiras devido ao fracasso das fazendas que haviam instalado no Vale do
Paraíba. Passaram, então, a sobreviver de seus empregos na administração
imperial e do aluguel de seus escravos (negros de ganho). Ao mesmo tempo, um
novo grupo começava a despontar no cenário econômico brasileiro. Eram os
cafeicultores do Oeste Paulista que, por falta de capital, tinham sido obrigados
a lançar mão do trabalho assalariado e abrir novas terras sertão adentro. E
eles acabaram enriquecendo muito, devido à fertilidade do solo.
Esses
cafeicultores, entretanto, enfrentavam dificuldades para transportar seu
produto até o porto de Santos, uma vez que tinham de utilizar carros de boi e
lombo de burro. Pediram, então, ao governo imperial a construção de uma
ferrovia ligando suas terras ao litoral. Diante das negativas sistemáticas da
coroa, a ferrovia foi construída com capitais privados a partir de uma
associação entre ingleses e o Barão de Mauá. Assim, em 1867, foi inaugurada a
Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, aumentando as hostilidades entre cafeicultores
do Oeste Paulista e políticos do Império.
Nesse
cenário, havia também a questão do trabalho escravo no Brasil, que sofria
pressões externas para que a abolição fosse promovida. Sem dúvida, a chegada do
trabalhador imigrante facilitou o caminho. Mas o Brasil ainda insistia neste
sistema vergonhoso.
A pressão
inglesa para a abolição da escravidão já havia feito várias “vítimas” entre os
traficantes de escravos, principalmente com o Bill Aberdeen de 1845. Nunca é demais lembrar que a preocupação da
Inglaterra não era movida por razões humanitárias, mas, sim, pelo promissor
mercado consumidor que seria aberto no Brasil, se aqui predominasse o trabalho
assalariado. Além disso, a própria conjuntura econômica internacional (ideologia
liberal, industrialização, resultado da Guerra de Secessão) provava que a
escravidão estava com os dias contados.
Em meados
do século XIX, começaram a ser aprovadas as primeiras leis antiescravistas. Em
1850, foi decretada a Lei Eusébio de Queiroz, que
extinguia o tráfico negreiro para o nosso país. Para muitos fazendeiros, a
solução mais comum depois do fim do tráfico foi a compra de escravos do
Nordeste.
Em 1871, o
ministro Visconde do Rio Branco sugeriu e viu a aprovação pela Assembleia da
chamada Lei do Ventre Livre, estabelecendo que, a
partir de maio daquele ano, todos os filhos de escravos seriam considerados
livres. Os proprietários seriam tutores das crianças até os 7 anos de idade,
quando elas deveriam ser entregues à responsabilidade do Estado. Em troca, os
fazendeiros teriam direito a uma indenização de 600 mil-réis ou, então,
poderiam utilizar o trabalho do “libertado” até os 21 anos. Tal lei previa uma
libertação gradual, o que permitiria aos escravocratas adaptarem-se à nova
realidade.
Em 1879, a
campanha
abolicionista chegou ao auge, e o grupo partidário da libertação dos
escravos já apresentava duas tendências. A primeira, moderada, defendia o fim
do escravismo por meio de leis e tinha como principais representantes José
do Patrocínio, Joaquim Nabuco e Jerônimo Sodré. A segunda, um pouco
mais radical, pregava que a abolição deveria ser conquistada pelos próprios
escravos, estimulando as revoltas destes. Seus defensores mais destacados foram
Raul
Pompéia, André Rebouças, Luís Gama e Antônio Bento - este último era um
juiz municipal que ficou famoso por dar pareceres que sempre favoreciam os
escravos contra seus senhores.
As
campanhas concentravam-se nas cidades, em comícios, festas beneficentes,
quermesses e conferências. Havia jornais e clubes antiescravistas. Os
ferroviários de São Paulo chegaram a arrecadar dinheiro para comprar a alforria
dos escravos. Em Fortaleza, houve casos de tipógrafos que se recusaram a
imprimir textos que defendessem a escravidão.
Em meio a
tantas agitações populares, os ministros José Antônio Saraiva e Barão de
Cotegipe apresentaram, em 1885, a Lei dos Sexagenários (ou Lei
Saraiva-Cotegipe), que estabelecia que os escravos ganhariam a liberdade ao
completarem 60 anos, mas trabalhariam até os 65 como forma de indenizar os
fazendeiros. As reações a essa lei foram péssimas, tanto que surgiu a expressão
“gargalhada nacional”, uma vez que eram poucos os escravos que chegavam à tal
idade – e os que chegavam não conseguiriam encontrar ocupação se fossem
libertados.
Enquanto
isso, em 1887, num documento assinado pelo Marechal Osório, então presidente do
Clube Militar, o Exército declarava que não mais cumpriria a função de capitão-do-mato, ou seja, não mais
perseguiria escravos fugitivos. O final da escravidão era inevitável.
No começo de 1888, os deputados votaram o fim do trabalho
escravo e a proposta, que foi enviada pelo ministro liberal, João Alfredo
Correia de Oliveira, foi aprovada com 92 votos a favor e 9 contra. Em 13 de
maio do mesmo ano, a Princesa Isabel, que ocupava a posição de Regente em
virtude da ausência de Dom Pedro II, durante uma viagem do imperador pela Europa
para tratamento de saúde, assinou a Lei Áurea, ratificando a extinção da
escravidão no Brasil.
Cabe
ressaltar que, não houve nenhum plano de governo que garantisse a absorção do
negro ao mercado de trabalho, o que dificultou muitíssimo a integração dos
ex-escravos à sociedade, originando as tão conhecidas formas camufladas de
discriminação e marginalização, das quais se encontram resquícios até hoje no
Brasil.
Os cafeicultores do Vale do Paraíba, em sua maioria
escravistas, esperavam receber uma indenização pelos escravos que perderiam e,
como essa indenização não foi acessível à grande maioria, boa parte deles ingressou
no Partido Republicano, ficando conhecidos como “republicanos do 13 de maio”.
QUESTÃO MILITAR
Desde
o fim da Guerra do Paraguai, o Exército brasileiro passara a defender a tese de
que os políticos (casacas), ligados a seus interesses mesquinhos, não eram
capazes de dar a devida atenção aos negócios públicos, e somente os militares
estariam capacitados a exercer o poder. Paralelamente a isso, deve-se destacar
a influência do positivismo
(ideologia criada por Augusto Comte que propunha uma ditadura científica como
forma ideal de governo), difundido pelo militar e professor, Benjamin
Constant, na academia militar.
O primeiro
conflito entre o Exército e o Império teve como pivô o tenente-coronel Sena Madureira, veterano da Guerra do
Paraguai, que publicou um artigo no jornal a respeito da Reforma do Montepio do Exército – projeto pelo qual
as famílias dos militares mortos ou mutilados na Guerra do Paraguai receberiam
uma pensão. Tal atitude foi repreendida pelo Ministro da Guerra, o civil
Marquês de Paranaguá, que proibiu, desde então, qualquer outra manifestação
de militares através da imprensa. O Exército reagiu afirmando que o soldado era
um cidadão fardado e que, assim sendo, teria direito de opinar sobre a política
nacional. Mas tal protesto não obteve sucesso.
A segunda
questão militar envolveu novamente o tenente-coronel Sena Madureira por
utilizar as dependências da Escola de Tiro de Campo Grande (Rio de Janeiro)
para uma recepção ao jangadeiro Francisco Nascimento, que havia liderado um
movimento contrário ao embarque de escravos do Ceará para o Sul do País. Sena
Madureira foi, mais uma vez, repreendido, o que provocou novos protestos do
Exército.
A terceira
questão militar começou em uma inspeção de rotina do coronel Cunha Matos, que encontrou numerosas
irregularidades em uma instalação militar no Piauí e concluiu que o
tenente-coronel Pedro José Lima era o responsável, encaminhando seu relatório a
seus superiores. Um deputado civil, amigo do militar denunciado, publicou um
artigo ofensivo à honra de Cunha Matos, como forma de desmerecer seu relatório.
Cunha Matos reagiu instantaneamente com a publicação de um artigo em que respondia
às acusações do civil, e foi punido pelo Ministro da Guerra por desrespeito às
normas do Exército.
Os
militares protestaram, afirmando que um civil havia ofendido um militar, e que
este fora proibido de se defender. Os partidários do Exército publicaram,
então, um manifesto que criticava violentamente a posição do governo. Tal manifesto foi assinado por vários oficiais,
inclusive pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Mais uma vez, o Ministro da Guerra
puniu os signatários do documento, rompendo definitivamente as ligações entre o
Exército e o governo. Deodoro foi convidado a ingressar no Partido Republicano.
Na
tentativa de reduzir a oposição, cada vez maior, Dom Pedro II formou um novo
gabinete, chefiado por Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto, que elaborou, em meados de 1889, um
programa de reformas. Esse programa incluía liberdade de culto, autonomia para
as províncias, mandatos para senadores e liberdade de ensino, entre outras
mediadas. Tais propostas visavam a preservar a monarquia, mas acabaram vetadas
pelos deputados conservadores.
A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA
O governo
do Império tinha perdido suas bases econômicas, militares e sociais. Porém, as
ideias republicanas não tinham grande penetração popular, mesmo às vésperas da
queda da monarquia. O povo estava descrente do regime, mas não havia uma crença
generalizada de que a República seria a solução para os problemas do País.
Havia até certo
temor quanto à questão sucessória do trono. Os dois filhos homens de Dom Pedro
II tinham morrido ainda crianças e, como a sucessora natural era a Princesa
Isabel, casada com o francês Conde d’Eu, não era simpático para a opinião
pública e as forças políticas da época que o terceiro reinado viesse a ser
comandado por um estrangeiro.
Na capital, Rio de Janeiro, os republicanos insistiram junto
ao Marechal Deodoro para que ele chefiasse o movimento que poria fim à
monarquia. Mas Deodoro estava indeciso, pois era amigo pessoal de Pedro II,
pois defendia que a República só seria proclamada após a morte do imperador.
Mas mudou de ideia quando, em 14 de novembro, começaram a circular boatos de
que ele (Deodoro) e o professor Benjamim Constant seriam presos.
Na
madrugada de 15 de novembro de 1889, o Marechal iniciou o movimento golpista
que pôs fim ao regime imperial. Os revoltosos ocuparam o quartel-general do Rio
de Janeiro e, depois, o Ministério da Guerra, e depuseram o Visconde de Ouro
Preto. Na tarde do dia 15, na Câmara Municipal, a República foi proclamada em
cerimônia solene.
Dom Pedro
II, que estava em Petrópolis, retornou ao Rio, pois pensava que o objetivo dos
golpistas era impor a substituição do Ministério. O imperador já articulava a
formação de um novo gabinete quando recebeu das mãos do Major Frederico Sólon
Sampaio Ribeiro uma comunicação, na qual era intimado a deixar o País, pois não
era mais considerado o legítimo governante. Na manhã de 17 de novembro, Dom
Pedro II partiu com toda a família para o exílio na Europa, rumando primeiro
para Portugal, onde falecera a imperatriz Teresa Cristina e depois para Paris,
onde D. Pedro ficou residindo até sua morte em 1891.
Nenhum comentário:
Postar um comentário