sexta-feira, 4 de setembro de 2015

II Reinado (1840-1889) - O fim da Monarquia



Fala do Trono durante a Abertura da Assembleia Legislativa
Pedro Américo, c.1873, Museu Imperial, Petrópolis.

Alguns autores defendem a importância dos políticos republicanos no fim da monarquia. Mas é importante destacar que essa participação parece não ter sido tão forte, já que o Partido Republicano foi fundado em 1870 e, mesmo gozando da mesma liberdade concedida aos outros partidos, elegeu pouquíssimos vereadores em 19 anos de existência.
Em 1870, ano de sua fundação, o Partido Republicano publicou o Manifesto Republicano, no qual atacava a centralização do poder e o despotismo. No entanto, esta última expressão não pode ser entendida ao pé da letra, mas, sim, como fruto da visão da época, no calor dos acontecimentos. Pelo Manifesto, via-se a descentralização político-administrativa como a melhor solução para as províncias, que passariam a ter, com a República, autonomia para atender às conveniências das camadas dominantes locais.

Os interesses haviam se diversificado de tal forma que não era mais possível subordinar-se apenas às decisões da aristocracia escravista, que, apesar de falida, ainda detinha o poder político.
Durante os primeiros 20 anos do Segundo Reinado, os partidos Liberal e Conservador dominaram a cena política. Em 1868, o primeiro dividiu-se em moderado e radical. O setor radical adotou os ideais republicanos e, em 1870, nascia o Partido Republicano - primeiramente no Rio de Janeiro e, depois, em São Paulo. Rapidamente, clubes e jornais republicanos divulgaram suas ideias pelo País.
Os principais membros do partido eram profissionais liberais e comerciantes, que recebiam o apoio das populações empobrecidas, do interior e dos centros urbanos, além da solidariedade dos fazendeiros do Oeste Paulista (os fazendeiros do Vale do Paraíba não participavam de tal movimento).
Em 1873, na província de São Paulo, reuniu-se a Convenção de Itu, através da qual a elite cafeicultora paulista aderiu formalmente ao movimento republicano. Dos poderosos participantes dessa convenção, saíram futuros presidentes da República, como Prudente de Morais e Campos Sales.

Era possível perceber que existiam duas facções no Partido Republicano. Na primeira, estavam os revolucionários, que desejavam a implantação da República através de uma revolução popular. Seu principal líder era o advogado Antônio da Silva Jardim, um ativo, inflamado e intransigente defensor da República e da abolição do trabalho escravo.
Mas os republicanos eram em sua grande maioria contrários à revolução. O principal representante dessa corrente de evolucionários era Quintino Bocaiúva. A esse grupo também juntaram-se os seguidores do filósofo francês Augusto Comte, fundador do Positivismo, movimento que, inclusive, inspirou a inscrição “ordem e progresso” na bandeira brasileira.

Do ponto de vista ideológico, a implantação do regime republicano estava associada à difusão dos ideais políticos do Positivismo. Entre o final do século XIX e início do XX, alguns pensadores tomaram como parâmetro o desenvolvimento das ciências da natureza e procuraram dar fundamentos científicos ao conhecimento humano. Havia a convicção de que uma ciência sobre os homens teria de passar pela negação das religiões, pois estas representariam entraves à busca pelo conhecimento. Essa doutrina foi abraçada, principalmente, pela jovem oficialidade do exército.
É interessante ressaltar que a influência política dos positivistas só se efetivou plenamente no Brasil depois da Proclamação da República.
Além dos pensamentos positivistas, alguns fatores imediatos precipitaram o fim da monarquia brasileira. Pode-se dizer que o Império Brasileiro apoiava-se sobre três colunas: a aristocracia militar, a Igreja Católica e os fazendeiros escravistas. Só que o regime acabou perdendo o apoio de cada um desses grupos em episódios que demonstraram a inabilidade dos monarquistas para realizar reformas que agradassem aos insatisfeitos e permitissem a sobrevivência do império.

QUESTÃO RELIGIOSA 

O catolicismo era a religião oficial do Brasil e, como em Portugal, a Igreja estava subordinada ao Estado. A Constituição Imperial, já em sua primeira versão de 1824, previa entre seus artigos duas características herdadas das constituições portuguesas. A primeira era o Padroado, que dava ao imperador o direito de nomear e remunerar membros do clero, que ficavam, desta forma, subordinados diretamente ao monarca. A segunda era o beneplácito, que exigia que qualquer Bula (decreto emitido pelo Papa) fosse aprovada pelo Império antes de vigorar em território brasileiro.
Em 1864, o Papa Pio IX emitiu a Bula Syllabus condenando a “ordem secreta” da maçonaria e proibindo o clero de participar dessa sociedade. O Império, entretanto, não aprovou tal documento, pois muitos políticos (e, provavelmente, o próprio Dom Pedro II) eram maçons.
Desrespeitando o imperador, porém obedientes ao Papa, o bispo de Olinda, Dom Vital de Oliveira, e o bispo de Belém, Dom Macedo, expulsaram vários padres e suspenderam irmandades de suas dioceses por práticas maçônicas.
Por solicitação das irmandades atingidas, Dom Pedro II anulou as suspensões. Como os bispos não voltaram atrás em suas decisões, foram julgados e condenados a quatro anos de prisão e trabalhos forçados. A comutação da sentença, feita pelo Primeiro Ministro Duque de Caxias, não livrou o Império do mal-estar de haver condenado clérigos, nem lhe devolveu o apoio da Igreja. As prisões afastaram os católicos do governo imperial.

QUESTÃO ESCRAVISTA

Os cafeicultores da Baixada Fluminense atravessavam grandes dificuldades financeiras devido ao fracasso das fazendas que haviam instalado no Vale do Paraíba. Passaram, então, a sobreviver de seus empregos na administração imperial e do aluguel de seus escravos (negros de ganho). Ao mesmo tempo, um novo grupo começava a despontar no cenário econômico brasileiro. Eram os cafeicultores do Oeste Paulista que, por falta de capital, tinham sido obrigados a lançar mão do trabalho assalariado e abrir novas terras sertão adentro. E eles acabaram enriquecendo muito, devido à fertilidade do solo.

Esses cafeicultores, entretanto, enfrentavam dificuldades para transportar seu produto até o porto de Santos, uma vez que tinham de utilizar carros de boi e lombo de burro. Pediram, então, ao governo imperial a construção de uma ferrovia ligando suas terras ao litoral. Diante das negativas sistemáticas da coroa, a ferrovia foi construída com capitais privados a partir de uma associação entre ingleses e o Barão de Mauá. Assim, em 1867, foi inaugurada a Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, aumentando as hostilidades entre cafeicultores do Oeste Paulista e políticos do Império.

Nesse cenário, havia também a questão do trabalho escravo no Brasil, que sofria pressões externas para que a abolição fosse promovida. Sem dúvida, a chegada do trabalhador imigrante facilitou o caminho. Mas o Brasil ainda insistia neste sistema vergonhoso.
A pressão inglesa para a abolição da escravidão já havia feito várias “vítimas” entre os traficantes de escravos, principalmente com o Bill Aberdeen de 1845. Nunca é demais lembrar que a preocupação da Inglaterra não era movida por razões humanitárias, mas, sim, pelo promissor mercado consumidor que seria aberto no Brasil, se aqui predominasse o trabalho assalariado. Além disso, a própria conjuntura econômica internacional (ideologia liberal, industrialização, resultado da Guerra de Secessão) provava que a escravidão estava com os dias contados.
Em meados do século XIX, começaram a ser aprovadas as primeiras leis antiescravistas. Em 1850, foi decretada a Lei Eusébio de Queiroz, que extinguia o tráfico negreiro para o nosso país. Para muitos fazendeiros, a solução mais comum depois do fim do tráfico foi a compra de escravos do Nordeste.
Em 1871, o ministro Visconde do Rio Branco sugeriu e viu a aprovação pela Assembleia da chamada Lei do Ventre Livre, estabelecendo que, a partir de maio daquele ano, todos os filhos de escravos seriam considerados livres. Os proprietários seriam tutores das crianças até os 7 anos de idade, quando elas deveriam ser entregues à responsabilidade do Estado. Em troca, os fazendeiros teriam direito a uma indenização de 600 mil-réis ou, então, poderiam utilizar o trabalho do “libertado” até os 21 anos. Tal lei previa uma libertação gradual, o que permitiria aos escravocratas adaptarem-se à nova realidade.
Em 1879, a campanha abolicionista chegou ao auge, e o grupo partidário da libertação dos escravos já apresentava duas tendências. A primeira, moderada, defendia o fim do escravismo por meio de leis e tinha como principais representantes José do Patrocínio, Joaquim Nabuco e Jerônimo Sodré. A segunda, um pouco mais radical, pregava que a abolição deveria ser conquistada pelos próprios escravos, estimulando as revoltas destes. Seus defensores mais destacados foram Raul Pompéia, André Rebouças, Luís Gama e Antônio Bento - este último era um juiz municipal que ficou famoso por dar pareceres que sempre favoreciam os escravos contra seus senhores.

As campanhas concentravam-se nas cidades, em comícios, festas beneficentes, quermesses e conferências. Havia jornais e clubes antiescravistas. Os ferroviários de São Paulo chegaram a arrecadar dinheiro para comprar a alforria dos escravos. Em Fortaleza, houve casos de tipógrafos que se recusaram a imprimir textos que defendessem a escravidão.
Em meio a tantas agitações populares, os ministros José Antônio Saraiva e Barão de Cotegipe apresentaram, em 1885, a Lei dos Sexagenários (ou Lei Saraiva-Cotegipe), que estabelecia que os escravos ganhariam a liberdade ao completarem 60 anos, mas trabalhariam até os 65 como forma de indenizar os fazendeiros. As reações a essa lei foram péssimas, tanto que surgiu a expressão “gargalhada nacional”, uma vez que eram poucos os escravos que chegavam à tal idade – e os que chegavam não conseguiriam encontrar ocupação se fossem libertados.
Enquanto isso, em 1887, num documento assinado pelo Marechal Osório, então presidente do Clube Militar, o Exército declarava que não mais cumpriria a função de capitão-do-mato, ou seja, não mais perseguiria escravos fugitivos. O final da escravidão era inevitável.
No começo de 1888, os deputados votaram o fim do trabalho escravo e a proposta, que foi enviada pelo ministro liberal, João Alfredo Correia de Oliveira, foi aprovada com 92 votos a favor e 9 contra. Em 13 de maio do mesmo ano, a Princesa Isabel, que ocupava a posição de Regente em virtude da ausência de Dom Pedro II, durante uma viagem do imperador pela Europa para tratamento de saúde, assinou a Lei Áurea, ratificando a extinção da escravidão no Brasil.
Cabe ressaltar que, não houve nenhum plano de governo que garantisse a absorção do negro ao mercado de trabalho, o que dificultou muitíssimo a integração dos ex-escravos à sociedade, originando as tão conhecidas formas camufladas de discriminação e marginalização, das quais se encontram resquícios até hoje no Brasil.
Os cafeicultores do Vale do Paraíba, em sua maioria escravistas, esperavam receber uma indenização pelos escravos que perderiam e, como essa indenização não foi acessível à grande maioria, boa parte deles ingressou no Partido Republicano, ficando conhecidos como “republicanos do 13 de maio”.

QUESTÃO MILITAR 

Desde o fim da Guerra do Paraguai, o Exército brasileiro passara a defender a tese de que os políticos (casacas), ligados a seus interesses mesquinhos, não eram capazes de dar a devida atenção aos negócios públicos, e somente os militares estariam capacitados a exercer o poder. Paralelamente a isso, deve-se destacar a influência do positivismo (ideologia criada por Augusto Comte que propunha uma ditadura científica como forma ideal de governo), difundido pelo militar e professor, Benjamin Constant, na academia militar.
O primeiro conflito entre o Exército e o Império teve como pivô o tenente-coronel Sena Madureira, veterano da Guerra do Paraguai, que publicou um artigo no jornal a respeito da Reforma do Montepio do Exército – projeto pelo qual as famílias dos militares mortos ou mutilados na Guerra do Paraguai receberiam uma pensão. Tal atitude foi repreendida pelo Ministro da Guerra, o civil Marquês de Paranaguá, que proibiu, desde então, qualquer outra manifestação de militares através da imprensa. O Exército reagiu afirmando que o soldado era um cidadão fardado e que, assim sendo, teria direito de opinar sobre a política nacional. Mas tal protesto não obteve sucesso.
A segunda questão militar envolveu novamente o tenente-coronel Sena Madureira por utilizar as dependências da Escola de Tiro de Campo Grande (Rio de Janeiro) para uma recepção ao jangadeiro Francisco Nascimento, que havia liderado um movimento contrário ao embarque de escravos do Ceará para o Sul do País. Sena Madureira foi, mais uma vez, repreendido, o que provocou novos protestos do Exército.
A terceira questão militar começou em uma inspeção de rotina do coronel Cunha Matos, que encontrou numerosas irregularidades em uma instalação militar no Piauí e concluiu que o tenente-coronel Pedro José Lima era o responsável, encaminhando seu relatório a seus superiores. Um deputado civil, amigo do militar denunciado, publicou um artigo ofensivo à honra de Cunha Matos, como forma de desmerecer seu relatório. Cunha Matos reagiu instantaneamente com a publicação de um artigo em que respondia às acusações do civil, e foi punido pelo Ministro da Guerra por desrespeito às normas do Exército.

Os militares protestaram, afirmando que um civil havia ofendido um militar, e que este fora proibido de se defender. Os partidários do Exército publicaram, então, um manifesto que criticava violentamente a posição do governo. Tal  manifesto foi assinado por vários oficiais, inclusive pelo Marechal Deodoro da Fonseca. Mais uma vez, o Ministro da Guerra puniu os signatários do documento, rompendo definitivamente as ligações entre o Exército e o governo. Deodoro foi convidado a ingressar no Partido Republicano.
Na tentativa de reduzir a oposição, cada vez maior, Dom Pedro II formou um novo gabinete, chefiado por Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Visconde de Ouro Preto, que elaborou, em meados de 1889, um programa de reformas. Esse programa incluía liberdade de culto, autonomia para as províncias, mandatos para senadores e liberdade de ensino, entre outras mediadas. Tais propostas visavam a preservar a monarquia, mas acabaram vetadas pelos deputados conservadores.

A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

Proclamação da República , Benedito Calixto, 1893. Pinacoteca do Estado de São Paulo, São Paulo.


O governo do Império tinha perdido suas bases econômicas, militares e sociais. Porém, as ideias republicanas não tinham grande penetração popular, mesmo às vésperas da queda da monarquia. O povo estava descrente do regime, mas não havia uma crença generalizada de que a República seria a solução para os problemas do País.
Havia até certo temor quanto à questão sucessória do trono. Os dois filhos homens de Dom Pedro II tinham morrido ainda crianças e, como a sucessora natural era a Princesa Isabel, casada com o francês Conde d’Eu, não era simpático para a opinião pública e as forças políticas da época que o terceiro reinado viesse a ser comandado por um estrangeiro.

Na capital, Rio de Janeiro, os republicanos insistiram junto ao Marechal Deodoro para que ele chefiasse o movimento que poria fim à monarquia. Mas Deodoro estava indeciso, pois era amigo pessoal de Pedro II, pois defendia que a República só seria proclamada após a morte do imperador. Mas mudou de ideia quando, em 14 de novembro, começaram a circular boatos de que ele (Deodoro) e o professor Benjamim Constant seriam presos.
Na madrugada de 15 de novembro de 1889, o Marechal iniciou o movimento golpista que pôs fim ao regime imperial. Os revoltosos ocuparam o quartel-general do Rio de Janeiro e, depois, o Ministério da Guerra, e depuseram o Visconde de Ouro Preto. Na tarde do dia 15, na Câmara Municipal, a República foi proclamada em cerimônia solene.

D. Pedro II deposto


Dom Pedro II, que estava em Petrópolis, retornou ao Rio, pois pensava que o objetivo dos golpistas era impor a substituição do Ministério. O imperador já articulava a formação de um novo gabinete quando recebeu das mãos do Major Frederico Sólon Sampaio Ribeiro uma comunicação, na qual era intimado a deixar o País, pois não era mais considerado o legítimo governante. Na manhã de 17 de novembro, Dom Pedro II partiu com toda a família para o exílio na Europa, rumando primeiro para Portugal, onde falecera a imperatriz Teresa Cristina e depois para Paris, onde D. Pedro ficou residindo até sua morte em 1891.


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