terça-feira, 10 de março de 2015

Reflexões sobre a História


A História enquanto ciência se pauta na construção de discursos sobre os atos humanos no passado e para tanto necessita de fontes, as quais serão analisadas e a partir disso, surgirão as bases para a produção de conhecimento histórico.


Na origem, a palavra histor significa "narrador" em grego, portanto, a história ganha a dimensão da narração. Mas narração do que ?


Se formos pelo senso comum, a narração "dos fatos e acontecimentos", mas sabemos que hoje a História se constrói muito mais pela análise processual do que factual, afinal, os fatos não mudam, mas análise das fontes históricas, sim.


Cada geração busca se apropriar do passado, fazendo sua releitura, mas as bases são as mesmas: entender como, onde e porque ocorreu determinado processo histórico? Quais foram as permanências e mudanças dentro do processo ?


Até a primeira metade do século XX, existiu um predomínio das fontes escritas sobre outras possibilidades que hoje trabalhamos. Por exemplo, é dessa visão que surgiu o conceito de que a História passou a existir depois da invenção da escrita e todo o gigantesco período anterior foi rotulado de "Pré-História" e ainda, acompanhado de um juízo de valor bastante negativo: época do homem primitivo inferior ao homem civilizado, que só passou a existir depois da escrita, que assinalaria o conceito de civilização.


Hoje ainda utilizamos o conceito de "Pré-História", mas acompanhado das devidas ressalvas e reflexões que o questionam, bem como, a divisão herdada dos positivistas (História Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea). Para nós, brasileiros, até muito pouco tempo atrás, ainda ensinavam nas escolas que nossa história começava com o "descobrimento" liderado por Cabral em 22 de abril de 1500, portanto, os povos indígenas não tinham uma história.

Paredão com pinturas rupestres - Serra da Capivara (PI) cerca de 23.000-17000 a.C.

Urna funerária antropomórfica - Cerâmica Maracá - sul do Amapá . c. 1000 d.C. Museu Nacional UFRJ 



Avançando neste processo, já nos libertamos da imposição factual e passamos a explorar outros territórios: a oralidade, a cultura material e imaterial, os discursos presentes nas diferentes artes e sempre tendo em mente que o objeto é o homem ou suas diferentes sociedades no tempo passado e que nesta busca, não há uma visão única, mas visões que mesmo diversas ajudam a compreensão da História e não invalidam seu status de ciência, pois desse modo, escapamos da visão doutrinária que impõe "Verdades", sabendo que o questionamento e crítica dos saberes estabelecidos são uma constante para o avanço do conhecimento e não heresias.


A imposição de uma "História oficial" geralmente resulta de uma perspectiva autoritária, que se recusa a permitir uma reflexão ou debate sobre o passado, legitimando quem naquele contexto exerce o poder sobre os homens ou sobre suas almas.

É justamente a diversidade de aportes teóricos e metodológicos que favoreceram o estabelecimento de diversas correntes historiográficas e disso, temos distintas linhas de pesquisa e áreas de atuação para se pensar o fazer histórico, que se amplifica e se enriquece com o contraditório.

A História, pensada através de uma perspectiva que valoriza a pluralidade cultural, pode favorecer a desconstrução das ideias que sustentam a exclusão e o preconceito. Afinal, a História não é "mera guardiã do passado", mas um poderoso instrumento de conhecimento e valorização do ser humano. 

Num país como o nosso, que padece de vários males, dentre eles uma "relativa amnésia" ou vergonha de seu passado, conhecer e compreender a História é um dos caminhos para o exercício da cidadania.



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