Hoje em dia, muitos de nós vemos a França como um dos países
mais importantes do mundo. É fundamental ressaltar que os demais países da
Europa pensam o mesmo, desde a Idade Média, quando sequer o Estado Nacional
francês estava consolidado. Por isso, todo tipo de movimentação política,
cultural ou social que ocorresse na França teria repercussão no continente.
Paris era uma capital onde a turbulência intelectual iluminista ganhava cada
vez mais espaço, e tais ideias atingiram até mesmo as colônias que ficavam na
América.
Ao longo de
todo o século XVIII, filósofos ilustres tinham pregado reformas radicais.
Quando a revolução começou, em 1789, os principais deles já haviam morrido,
como Montesquieu, Rousseau, Voltaire, Diderot, D’Alembert e Quesnay. Porém,
suas obras continuaram a exercer forte influência entre os desejosos de
mudanças, que clamavam por igualdade de direitos, fim dos privilégios da
nobreza e soberania popular.
Em fins do
século XVIII, entretanto, a França atravessava um período marcado por uma série
de crises. Era de conhecimento público que as despesas da monarquia, com sua
prática intervencionista, haviam esvaziado o tesouro. O período áureo da
política dos cardeais e do “Rei Sol” dava lugar a uma decadência crescente.
Havia uma
série de privilégios concedidos ao clero e à nobreza, como a isenção do
pagamento de impostos, doações, pensões vitalícias, leis e tribunais especiais
para um grupo de cerca de 650 mil pessoas, que
comprometiam seriamente as rendas do Estado, em detrimento da situação do
restante da população, cerca de 23 milhões de pessoas.
Enquanto a
Inglaterra expandia sua produção industrial e o comércio exterior, a França
continuava a ser um país essencialmente agrícola. Na verdade, por volta de 80%
da população vivia nas zonas rurais e dedicava-se à agricultura.
A derrota
para os ingleses na Guerra dos Sete Anos (1756-1763)
fez que tratados comerciais fossem assinados de maneira a conceder baixas
tarifas alfandegárias aos produtos britânicos.
As manufaturas francesas não suportaram a concorrência e
muitas firmas faliram, gerando um altíssimo desemprego. Para agravar o quadro,
as péssimas colheitas de 1787 e 1788 aumentaram a fome e a insatisfação
popular. As cidades e as estradas estavam cheias de mendigos.
A burguesia
francesa tentava
conquistar mais poder, incitando o povo contra o Absolutismo e divulgando o pensamento iluminista. Enquanto isso, cresciam os choques entre burgueses
ligados ao Estado e a nobreza, que procurava diminuir a influência política e
administrativa de seus opositores. Na verdade, a reação aristocrática impediu
que a burguesia francesa chegasse ao poder pacificamente. O rei, que na época
era Luís
XVI(1774-1792), perdia a condição de mediador entre aristocratas e burgueses, o que,
durante muito tempo, lhe permitiu manter-se no poder.
Luís XVI, Antoine_François Callet, c. 1789, Château de Versailles, França.
Neste
contexto, o rei convocou a assembleia de representantes dos três estados (Estamentos que tinham origem na sociedade medieval)
da França. O objetivo inicial era tirar o país da crise da forma mais
simplória: ampliar os tributos sobre o grosso da população e, assim, sanear as
contas públicas.
Além da estrutura absolutista, vários elementos de origem
feudal sobreviviam na França, como a servidão e suas obrigações (talhas e
corvéias), cobranças de pedágios e a própria produção, que estava limitada
pelas técnicas rudimentares na agricultura e o controle das corporações de
ofício nas cidades.
A sociedade francesa dividia-se da
seguinte forma:
Primeiro Estado: o clero - Acredita-se que, na época
da revolução, o clero francês era formado por pouco mais de 400 mil membros,
divididos em alto clero (bispos, arcebispos, cônegos e cardeais) e baixo clero (padres, monges, frades e curas).
Os integrantes do alto clero eram de origem nobre e, tal como a nobreza,
gozavam de vários privilégios, sendo, portanto, contrários às propostas de
mudanças. Já o baixo clero não dispunha de tantos privilégios, mas tinha
isenção de impostos. O clero francês era, de modo geral, riquíssimo e dono de
um patrimônio invejável, mas tal riqueza era repartida desigualmente.
Segundo Estado: a nobreza - Havia menos nobres do que clérigos na
França, algo próximo de 230 mil pessoas. Os mais prestigiados eram chamados de nobreza
de sangue, pois tinham uma linhagem aristocrática mais antiga. Mas nem
todos os nobres eram ricos ou faziam parte da corte. Muitos haviam empobrecido
e passavam por dificuldades econômicas. Essa nobreza de sangue era composta
pela alta (proprietários de terras) e
baixa nobreza (cavaleiros e senhores
feudais arruinados). Levavam uma vida dispendiosa e muitos deles eram cortesões
sem função definida.
Outra divisão possível é a de caracterizar os nobres mais
próximos de Versalhes, sede da corte francesa, como palacianos; e os que se mantinham em suas propriedades como provinciais.
Finalmente, havia uma parcela significativa de nobres que
não tinha linhagem aristocrática, mas havia comprado o título de nobreza,
sendo, então, chamados de togados.
Eram descendentes de burgueses ricos, mas eram conservadores e, muitas vezes,
defendiam os privilégios da sociedade estamental, pois esperavam poder
desfrutar esses benefícios.
Terceiro Estado: o povo - Representava
aproximadamente 96% da população francesa. Era composto pelas várias camadas
distintas, como artesãos, jornaleiros, camponeses, burgueses, sans-culotte,
entre outros. Era a classe dos que pagavam impostos e não tinham participação
política.
A burguesia era o setor social mais rico e instruído de toda
a população. Mesmo as mulheres burguesas tinham oportunidade de estudar, ainda
que fosse em um internato. Eram profissionais liberais, comerciantes, donos de
terras e banqueiros que reivindicavam liberdade individual, igualdade de
direitos, participação política, reconhecimento social, enfim, propostas que
pudessem atrair a simpatia dos demais integrantes do terceiro estado.
A classe dos trabalhadores rurais era bastante
diversificada. Havia pequenos proprietários, com uma razoável quantidade de
bens, que estavam insatisfeitos devido às crescentes dívidas provocadas pela crise
econômica . E havia, no outro extremo, o grande número de camponeses que ainda
estavam presos à terra, tendo de cumprir obrigações servis, demonstrando que o
interior da França estava ainda muito ligado à tradição feudal. As más
colheitas deixaram esses camponeses em difícil situação, o que favoreceu o
fortalecimento do clima revolucionário.
OS ESTADOS GERAIS
Por toda
parte, multiplicavam-se panfletos contendo críticas ao governo. As finanças do
Estado estavam comprometidas com os crescentes déficits públicos, a dívida
externa e os gastos da corte parasitária. A ideia de participar da guerra de
independência dos Estados Unidos, apenas para prejudicar os rivais ingleses,
trouxe ainda mais despesas.
A monarquia
não tinha como financiar suas necessidades imediatas. Tentando solucionar o
problema, o Rei Luís XVI passou a substituir ministros que, sem sucesso,
tentavam controlar a crise, como foram os casos de Turgot, Brienne e Calonne -
este último sugeriu a formação da chamada Assembleia de Notáveis. O objetivo de
Calonne era convencer os representantes do clero e da nobreza da necessidade de
o primeiro e o segundo estados pagarem impostos.
Embora
grande parte da nobreza defendesse alguns limites ao poder real, esta era
intransigente quando o assunto se referia à manutenção dos privilégios herdados
do feudalismo. Calonne demitiu-se, abrindo caminho para a admissão de um novo
ministro das finanças, o banqueiro Necker. Foi ele quem sugeriu a Luís XVI a
convocação dos Estados Gerais, ou seja, uma assembleia formada por
representantes dos três estados.
A assembléia foi criada durante o século XIV pelo rei Felipe,
o Belo, e tinha sido convocada pela última vez em 1614. Cada um dos estados
enviava seus representantes e cada estado tinha direito a um voto (portanto,
clero e nobreza possuíam a maioria). Interessados em implementar as reformas,
os representantes do Terceiro Estado procuraram ampliar o número de
representantes (de 300 para 600), conseguindo a autorização real para isso. O
objetivo era que cada Estado tivesse 600 representantes e o voto fosse mudado
"pour la tête", isto é,
por cabeça ao invés de por Estado. Assim o Terceiro Estado obteria uma pequena
maioria, contando com os descontentes entre o baixo clero e pequena nobreza, o
rei estabeleceu que somente seriam discutidos problemas econômicos, e não
políticos.
Esse
posicionamento frustrou as expectativas dos burgueses, pois exigiam que o voto
fosse individual. Diante da impossibilidade de conciliar interesses, Luís XVI
decidiu-se pela dissolução da assembleia, chegando a impedir a entrada de
deputados no plenário. Os representantes do Terceiro Estado rebelaram-se e,
após se trancarem em uma sala de jogos, juraram não se separarem enquanto não
pudessem elaborar uma Constituição. Esses deputados receberam o apoio de vários
integrantes do baixo clero e de alguns nobres simpáticos às ideias liberais, e,
em 9 de julho de 1789, declararam que ali se formara a Assembleia Nacional Constituinte.
O rei
ordenou, então, que todos abandonassem a sala e mobilizou seus soldados. Mas a
situação piorou quando se espalhou a notícia da demissão do ministro Necker,
considerado o único membro do governo que defendia a necessidade de reformas.
O confronto
entre as tropas e uma multidão de populares que tomava conta das ruas tornou-se
inevitável. Em 14 de julho de 1789, centenas de pessoas invadiram a prisão
destinada aos inimigos políticos do rei. A Queda da Bastilha transformou-se no
mais importante marco do processo revolucionário, que estava apenas começando.
A rebelião tomou conta de Paris e espalhou-se pela França ao longo do mês de julho e início de agosto, chegando
até a zona rural, onde os camponeses passaram a invadir os castelos, incendiar igrejas, expulsando os nobres de suas terras, ou
ainda, cometendo uma série de massacres conhecidos como Grande Medo e que
provocaram a fuga daqueles que não aceitavam as mudanças ou tentavam resistir a
elas.
ASSEMBLEIA NACIONAL
Entre
1789 e 1791 formou-se uma Assembléia Nacional constituinte, que elaborou uma
Constituição em 1791, jurada por Luís XVI, que apresentava uma estrutura
favorável à alta burguesia por estabelecer o voto censitário (isto é, somente
os indivíduos que tivessem uma determinada renda poderiam votar, sendo tais
cidadãos denominados cidadão ativos).
A Assembléia
estava formada por membros da alta burguesia, sendo dividida entre os
girondinos (burguesia industrial e comercial), os feuillants (burguesia financeira) e os jacobinos (pequena
burguesia). Esta configuração representava, portanto, as divergências entre a
burguesia, que deixou de ser um grupo homogêneo com interesses comuns como no
início da Revolução.
Nesse
ínterim, os países absolutistas somados aos "emigrados" (nobres que
fugiram com medo de represálias por parte dos revolucionários) armaram uma conspiração
com o objetivo de devolver os poderes absolutos a Luís XVI, que numa ação
precipitada tenta fugir para o Sacro Império, sendo identificado e preso na
fronteira e tendo de retornar a Paris como traidor.
Em
virtude das circunstâncias, tropas prussianas invadiram a França, motivando a
convocação da população para a defesa do país pelos líderes jacobinos Danton e
Robespierre, que declararam a "Pátria em perigo". Os jacobinos
armaram a população e formaram a Comuna Insurrecional de Paris, obtendo a participação
maciça das camadas mais populares, os sans-cullotes.
O choque
entre franceses e prussianos foi decisivo na batalha de Walmy em 29 de setembro
de 1792, cuja vitória coube aos franceses, e assim iniciou-se o processo de
radicalização da revolução. A vitória em Walmy representou a forte manifestação
do nacionalismo francês que auxiliou o povo destreinado e mal armado a vencer
um dos mais poderosos exércitos da Europa. A força deste nacionalismo pode ser
sentida nas palavras da canção La Marseillaise, hino das tropas que
guarneciam a região de fronteira com o rio Reno e que posteriormente se
transformou num hino da Liberdade.
CONVENÇÃO NACIONAL
A
Assembleia Legislativa foi substituída pela Convenção Nacional, um
parlamento com deputados eleitos por sufrágio universal masculino. Foi
proclamada a república e o rei enfrentou um julgamento por alta traição, sendo
condenado à morte na guilhotina.
Com a
criação da Convenção, as tendências políticas ficaram mais evidentes. Os
girondinos, mais conservadores, passaram a sentar-se do lado direito da
assembleia. Os jacobinos, radicais, estabeleceram-se do lado esquerdo, ocupando
os lugares mais altos, o que lhes valeu o apelido de montanheses. Havia, também, o grupo conhecido
como pântano
ou planície
que representava a burguesia financeira. Não tinham um projeto político
definido e apoiavam ora a gironda, ora os jacobinos.
A Convenção
criou um novo calendário que se iniciou em 1793. O poeta dramático Fabre
D’Eglantine renomeou os meses de acordo com eventos ligados às estações do ano
no país. Assim, os meses do outono
passaram a ser chamados de vindimário (colheita das uvas), brumário
(neblina) e frimário (geadas); os do inverno
tornaram-se nivose (neve), pluviose (chuvas) e ventose
(ventos); chamou-se os meses da primavera
de germinal
(germinação), floreal (flores) e prairal (prados) e, finalmente, os
do verão eram messidor (colheita nos
campos de cereais), termidor (calor) e frutidor (frutos). Cada mês possuía
30 dias e os cinco dias complementares do ano eram reservados para comemorações
cívicas. A Constituição do ano I substituiu a vigente, instituindo o ensino
público gratuito e obrigatório e a abolição da escravidão nas colônias.
A acusação
e execução de Luís XVI constituiu-se numa vitória do grupo jacobino. Mas o
governo francês continuava nas mãos da burguesia girondina, majoritária na
Assembleia. E os problemas que ameaçavam a Revolução ainda não haviam sido
solucionados; as necessidades das massas ainda não haviam sido atendidas.
21 de janeiro de 1793: a execução de Luís XVI como traidor. Gravura Alemã. Coleção particular.
Nesse
período, as potências europeias declararam guerra à França, temerosas de que a
Revolução se alastrasse por toda a Europa. Formava-se a Primeira Coligação Antifrancesa,
composta pelos exércitos de Inglaterra, Áustria, Holanda, Sardenha, Prússia e
Espanha.
A radicalização da situação conduziu os jacobinos, liderados
por Robespierre, ao poder, o que deu início a um verdadeiro governo
revolucionário. Foram tomadas medidas que buscavam atender aos anseios
populares, como o fim das indenizações aos nobres, a divisão das grandes
propriedades (reforma agrária), a redução de impostos, o tabelamento de preços
(Lei do Máximo), a renovação do exército, o fim do privilégio da primogenitura,
entre outras.
Com
Robespierre, teve início a fase do Terror, na qual foram criados o Tribunal e o Comitê de Salvação Pública,
para dirigir o país e julgar os contrarrevolucionários. Isso abriu caminho para
a execução de nobres, clérigos, burgueses e elementos do povo em geral.
Milhares de pessoas foram mortas sob a acusação de atuarem contra a revolução.
A política
radical dos jacobinos foi responsável por deter a contrarrevolução, tanto
interna quanto externamente, problemas que os girondinos não conseguiram
contornar. Entretanto, as execuções indiscriminadas provocaram a perda de
controle da situação e do apoio popular. Com o assassinato de Marat por uma
prostituta girondina, Danton e Robespierre voltaram o Comitê de Salvação
Pública contra a Gironda.
A fase
popular da Revolução Francesa foi marcada pelo controle radical dos jacobinos,
responsáveis pela transformação do cenário político com a promulgação em 1793
de uma Constituição que regulamentava o sufrágio universal masculino aos
maiores de 21 anos. Porém esta Constituição foi suspensa logo em seguida, pois
Robespierre retirou as liberdades individuais para poder julgar os inimigos da
Revolução.
Robespierre
procurou agir através de leis favoráveis às camadas populares, estabelecendo o
Edito do Máximo (congelamento de preços), ensino gratuito e obrigatório,
divisão de terras, criação da escola Politécnica, do Museu do Louvre e do
Conservatório Nacional. No entanto, agiu de maneira radical contra os inimigos
da Revolução, atuando com o grupo mais intransigente, os chamados
"les
enragé", isto é, os enraivecidos. Sob o comando de Robespierre, denominado
"o incorruptível", executaram-se mais de 30.000 pessoas tidas como
inimigas da Revolução.
Este
período é tido como autofágico, ou seja, as execuções chegaram aos próprios
líderes como por exemplo Danton e Hérbert, considerados traidores e assim a Revolução
consumia seus líderes, enfraquecendo-se.
O pântano, representando a burguesia descontente, acusou
Robespierre de tentar restabelecer a monarquia e de ter mergulhado a França num
banho de sangue. Um golpe de Estado foi organizado pelos opositores dos
jacobinos e, em 9 termidor, Robespierre e seu aliado, Saint-Just, foram presos.
Posteriormente, eles e os últimos líderes jacobinos foram condenados e
decapitados. Encerrava-se o Terror, que havia levado milhares de pessoas à
morte.
A Reação Termidoriana pôs fim à fase
popular da revolução. A Constituição do ano III restabeleceu o voto censitário,
fechou os clubes jacobinos e criou o Conselho
dos Quinhentos e o Conselho dos Anciãos. O poder executivo ficava nas mãos
de um Diretório composto por cinco membros
eleitos pelo Legislativo. Até mesmo a execução da Marselhesa foi proibida.
DIRETÓRIO
Itália e
Áustria declararam guerra à França e tentaram invadir seu território. Contra os
dois países, o Diretório destacou um jovem general chamado Napoleão Bonaparte.
Suas vitórias contra os italianos e austríacos garantiram grandes vantagens
territoriais e financeiras para a França.
Enquanto
isso, dentro do território francês, Graco Babeuf liderou um movimento conhecido
como a Conjura dos Iguais, que
pretendia resgatar o caráter radical da revolução, como o fim das desigualdades
sociais, a abolição da propriedade privada no país e a criação de uma “ditadura
dos humildes”. A tentativa de tomada do poder fracassou e Babeuf foi mais um a ser guilhotinado.
De volta à
França e aclamado como herói em Paris, Napoleão pregou a necessidade de uma
guerra econômica contra a Inglaterra, com a invasão de suas colônias mais
ricas. Apoiado pelo Diretório, Bonaparte tomou o Egito aos ingleses mas perdeu
seus navios na Batalha de Aboukir, ficando isolado em território egípcio.
Era grande
a insegurança da alta burguesia quanto ao destino das conquistas
revolucionárias. Por isso, pensou-se na queda do Diretório, que deveria ser
substituído por um governante mais carismático. Cresceu o apoio a um eventual
golpe de Estado.
A Europa
conservadora unia-se novamente, formando a Segunda Coligação (Inglaterra,
Rússia, Áustria e Reino de Nápoles) e ameaçando a revolução burguesa francesa,
não só militarmente como economicamente, já que o comércio exterior estava
parcialmente bloqueado.
A alta burguesia decidiu-se pela perda de parte das
liberdades individuais em troca da manutenção de várias outras conquistas que
vieram com o fim do Antigo Regime. Retornando da guerra, Napoleão Bonaparte
derrubou o Diretório com amplo apoio dos girondinos e de setores do pântano,
assumindo o poder com o Golpe de
18 de Brumário.
O LEGADO DA REVOLUÇÃO FRANCESA
A
Revolução Francesa representou não só a tomada do poder pela burguesia, mas
também o estabelecimento de um novo modelo de Estado, cujas bases estavam no
respeito à propriedade privada, das liberdades individuais garantidas pela
Constituição e na maior participação política através do sufrágio universal
masculino. Estas instituições burguesas tiveram sua expansão pelo resto da
Europa, fornecendo elementos para a ocorrência de outras revoluções nos países
absolutistas. A Europa, apesar das medidas reacionárias, não foi mais a mesma
depois de 1789.
Dentro
deste pensamento, costuma-se entender a figura de Napoleão Bonaparte como a
propagadora dos ideais e instituições da burguesia revolucionária para além da
França, favorecendo a decadência do que os revolucionários chamaram de Ancien
Régime (Antigo Regime), ou seja, o Absolutismo.
PERÍODO NAPOLEÔNICO
Napoleão, Primeiro Cônsul da França. Jean-Auguste Dominique Ingres, c. 1803-04, Musée de Beaux-Arts de Liège, Liège, Bélgica.
CONSULADO (1789 - 1804) - Criado logo depois do golpe
de 18 Brumário, o Consulado seria formado por três cônsules com a
responsabilidade de governar o país, mas, na verdade, o primeiro cônsul,
Napoleão, centralizava todos os poderes. Os outros dois membros eram o abade
Sieyès e o general Roger Ducos.
Um mês
depois do golpe, era posta em vigor uma nova Constituição, que estabelecia um
mandato de dez anos para o primeiro cônsul, conferindo a Napoleão poderes
ditatoriais. Bonaparte empenhou-se em eliminar o perigo externo e, por isso,
avançou contra a Segunda Coligação. Os austríacos foram derrotados em 1800; os
russos deixaram o conflito e, quanto aos ingleses, foi assinada uma trégua, a
chamada Paz de Amiens.
Bonaparte,
já na condição de Cônsul Vitalício, obteve importantes êxitos, como a fundação
do Banco da França, responsável pela emissão de papel-moeda e o controle da
inflação, e a criação de uma nova unidade monetária: o franco. Estimulou a
indústria nacional e a produção agrícola. Reatou relações diplomáticas com a
Igreja, rompidas desde o princípio da Revolução, através de uma concordata
assinada com o Papa Pio VII. Entretanto, os bispos seriam nomeados pelo
primeiro cônsul e o clero receberia seus vencimentos pagos pelo Estado.
Em 1804,
foi outorgado o Código Civil Napoleônico, que passou a ter grande penetração
entre os camponeses depois de lhes garantir a propriedade sobre as terras que
haviam sido confiscadas pelos jacobinos na fase do Terror. O novo Código
institucionalizou as transformações burguesas, assegurando a igualdade formal
perante a lei e o direito à propriedade, proibiu sindicatos e greves de
trabalhadores e ratificou a reforma agrária realizada durante o governo
jacobino. Este último item garantiu a Napoleão o importante apoio dos camponeses
ao seu governo, que já tinha a simpatia dos militares e da burguesia. Em 1804,
através de um plebiscito, a população aprovou a nova Constituição e aclamou
Bonaparte como novo Imperador.
IMPÉRIO (1804 - 1815)
Napoleão I, Imperador dos Franceses. Jean-Auguste Dominique Ingres, c. 1806, Musée de L'Armée, Paris, França.
Napoleão venceu a Terceira
Coligação composta por Inglaterra, Rússia, Áustria e Suécia nas
batalhas de Ulm e Austerlitz, mas foi derrotado pelos ingleses do almirante
Nelson e perdeu sua frota na Batalha de Trafalgar. Para a Inglaterra, as lutas
contra os franceses eram inevitáveis, já que a França surgia como concorrente
em potencial das indústrias inglesas. A França, por seu lado, teria de
conquistar os mercados consumidores europeus, até então sob domínio inglês.
Dessa maneira, a paz francesa passava pela disseminação das instituições burguesas
pelo restante da Europa.
Napoleão
venceu a Quarta Coligação e levou as fronteiras da França a limites
jamais alcançados por seus predecessores, tornando-se o grande senhor da
Europa. Os territórios que não eram diretamente dominados estavam entregues a
aliados e familiares. José, Luís e Jerônimo, todos irmãos do imperador,
tornaram-se reis, respectivamente, da Espanha, de Nápoles e da Holanda.
Porém, a Inglaterra permanecia intocável do outro lado do
Canal da Mancha. Percebendo que era inútil insistir no confronto militar,
Napoleão lançou contra os ingleses seu Bloqueio Continental (1806),
proibindo o comércio dos países europeus com a Inglaterra. Através do embargo
econômico, o imperador da França tentava asfixiar os britânicos.
Mas a
estratégia, que, no início, parecia ser eficiente, tornou-se muito
inconveniente alguns anos depois, pois os ingleses comercializavam com as
colônias ibéricas da América e impediam os franceses de obter matérias-primas
nessa região. Para garantir tal comércio, a Inglaterra financiou a fuga da
família real portuguesa para o Brasil. Por outro lado, os países europeus
tinham problemas para adquirir manufaturados, uma vez que a França não
conseguia suprir a falta de produtos no continente. Foi apenas questão de tempo
para que um intenso contrabando fosse estabelecido.
Para piorar a situação, em 1809, formou-se a Quinta
Coligação a partir da união de Inglaterra e Áustria. Mesmo vitoriosa,
na França, as rachaduras no império tornavam-se cada vez mais visíveis.
Alguns
historiadores classificam como um equívoco a atitude de Napoleão de expandir as
instituições burguesas pela Europa, pois, se antes os soldados franceses eram
vistos como libertadores, a burguesia dos povos dominados voltou-se contra as
tropas de ocupação napoleônicas, que eram, então, encaradas como invasoras e
opressoras. O caso exemplar foi o da antiga aliada Espanha, que nunca admitiu a
saída do Rei Fernando VII e a entrada de José Bonaparte. Organizando-se na forma de guerrilha, os espanhóis começaram
a minar o moral das tropas francesas, tidas até então como invencíveis e tal
situação por sua vez, gerou uma relação ainda mais tensa com os franceses que
massacraram vários levantes e puniram de maneira cruel a população civil com
execuções sumárias e atos violentos como mutilações daqueles que resistiam,
como bem testemunhou o pintor espanhol Francisco Goya na série de gravuras
conhecidas como “Os Desastres da Guerra”. O exemplo espanhol alastrou-se, pois
a população portuguesa também resistiu à presença francesa, recebendo apoio
inglês, os motins contra as tropas napoleônicas não paravam de ocorrer e assim,
as guerras peninsulares se transformaram num problema crescente, culminando com
a vitória dos portugueses em 1810 e dos espanhóis em 1814.
Em 1811, a
Rússia rompeu o Bloqueio Continental e reabriu seus portos aos ingleses. Como
represália, Napoleão lançou um exército de 600 mil homens. Na Polônia, ficaram
150 mil fornecendo a infraestrutura material necessária, e 450 mil invadiram o
território do czar. Os russos utilizaram a tática de “terra arrasada”, isto é,
retiravam-se sem enfrentar o inimigo, levando tudo o que podiam e incendiando
casas e plantações, envenenando rios, tudo que pudesse ser aproveitado pelos
franceses. Napoleão levou suas tropas até Moscou, que foi incendiada pelos
próprios habitantes. O retorno à França foi trágico. Sob a neve, sem agasalhos
nem provisões e vítima dos ataques-relâmpago do exército russo, Napoleão
retornou com pouco mais de 30 mil soldados.
Prússia,
Inglaterra e Áustria uniram-se à Rússia, que obteve a grande vitória em
Leipzig, invadiu a França em 1814. Napoleão foi obrigado a assinar o Tratado
de Fontainebleau. Deposto do trono francês, Bonaparte foi exilado na
ilha de Elba (no mar Mediterrâneo, próxima à Córsega) e assim ocorreu a Restauração
Bourbon, com Luís XVIII (irmão de Luís XVI) sendo coroado rei da França.
O GOVERNO DE CEM DIAS
A
nova monarquia teve sérias dificuldades para impor-se ao povo francês e foi
obrigada a governar apoiada nos exércitos invasores. A Restauração favoreceu o
retorno dos emigrados e o período que se seguiu, o Terror Branco, foi
caracterizado por violência e arbitrariedades. Aproveitando-se da
impopularidade do rei, Napoleão Bonaparte desembarcou no sul da França e
marchou em direção a Paris, recebendo adesões em todo o percurso. Luís XVIII fugiu
para a Bélgica enquanto Napoleão entrava triunfalmente na capital e começava a
reorganizar seu exército para enfrentar seus inimigos. Mas seu governo durou
apenas cem dias, pois foi derrotado na Batalha de Waterloo, na Bélgica, caindo
prisioneiro dos ingleses. Napoleão foi mais uma vez,
exilado. Agora, Ilha de Santa Helena, um rochedo de possessão inglesa no meio
do Atlântico sul, onde faleceu em 1821. Luís XVIII foi reconduzido ao trono e as potências vencedoras reuniram-se para discutir o novo
mapa da Europa e o perigo das revoluções liberais no continente.
Desde a
primeira derrota de Napoleão Bonaparte, os vencedores iniciaram conversações
para determinar as fronteiras da Europa. As discussões foram suspensas durante
os cem dias e depois retomadas. Todas as monarquias europeias foram convidadas
a participar dos trabalhos, mas as grandes potências, como Áustria, Prússia,
Rússia e Inglaterra, representadas, respectivamente, pelo Príncipe de Metternich, Hardenberg, Czar Alexandre I e
Lorde Castlereagh, fizeram prevalecer seus interesses.
Uma das
figuras mais destacadas nas reuniões foi Metternich, chanceler austríaco e
responsável pela criação de uma agenda repleta de festas, caçadas e bailes que
entretiveram os reis convidados, permitindo que seus secretários decidissem as
questões importantes nos bastidores da reunião. Talleyrand, representante da
França, soube explorar as diferenças entre os membros, conseguindo a manutenção
das fronteiras francesas anteriores à revolução.
A Europa
criada pelo Congresso de Viena era um retrato da ideologia conservadora e
reacionária, nitidamente austríaca, não respeitando etnias, fragmentando os
Estados europeus e permitindo sua posterior anexação pelo império.
As negociações basearam-se em três princípios políticos:
-
Restauração
do absolutismo monárquico ou Antigo Regime;
-
Legitimidade
das antigas dinastias que haviam sido depostas durante as guerras napoleônicas.
Em consequência deste princípio, os Bourbon retornaram ao trono francês,
espanhol e napolitano; Portugal voltou ao domínio dos Bragança e os Orange
voltaram a governar a Holanda e assumiram o controle do
território que viria a ser a Bélgica a partir de 1830. Os Estados pontifícios foram restabelecidos ao papa.
-
Equilíbrio europeu,
que visava a impedir que qualquer país da Europa pudesse dispor de uma força
militar capaz de dominar os vizinhos.
No
Congresso de Viena também foi criada a Santa Aliança, um instrumento que
pretendia coibir novas revoltas liberais, criando uma aliança de monarquias
absolutas que se comprometiam a sufocar rebeliões em todos os países membros e
garantir os interesses das monarquias europeias.
O apogeu da
Santa Aliança foi marcado por intervenções militares, que esmagaram os
movimentos liberais ou nacionalistas que surgiam na Europa. Em 1819, a Santa
Aliança reprimiu nacionalistas na Alemanha; em 1821 e 1822, foi a vez de
liberais espanhóis e napolitanos serem esmagados. Entretanto, quando os membros
da Aliança tencionavam invadir os jovens países da América e restabelecer o
colonialismo, sofreram um duro golpe: a saída da Inglaterra, que não tinha a
menor intenção de apoiar o resgate do “pacto colonial”.
O então
presidente dos EUA entre 1817 e 1825, James Monroe , combateu veementemente a Santa Aliança, a
qual considerava uma intromissão europeia no continente americano, pois essa
interferência inviabilizava os movimentos de independência das colônias, e
lançou em 1824 a Doutrina Monroe, que defendia "A América para os americanos".
Na prática, era o início de uma política externa de hegemonia norte-americana
sobre os demais países americanos.
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