Uma série de fatores proporcionou
a ocorrência do Renascimento a partir da Baixa Idade Média. Inicialmente, houve
o renascimento comercial, isto é, a
generalização do comércio pela Europa, fenômeno que se tornou irreversível
desde a abertura do Mediterrâneo. Isso tudo foi acompanhado pelo renascimento urbano, que implicou o
surgimento de novas cidades e uma série de funções para elas; a cultura
renascentista foi essencialmente urbana.
"Mercador e sua esposa", Quentin de Metsys, c. 1514 - Museu do Louvre, Paris - França
Ocorreu
também o surgimento e a ascensão dos
mercadores, ligados principalmente ao comércio marítimo. Para que isso
acontecesse, foi necessária a centralização do poder em algumas partes da
Europa, o que favoreceu a redução do poder da Igreja e das ideias que
condenavam o comércio de maneira geral. Tais mercadores, enriquecidos, passaram
a viver em palácios tentando igualar-se à nobreza de sangue. Passaram, então, a
praticar o mecenato, ou seja, a
abrigar, financiar e incentivar artistas, tornando-se protetores das
artes. Estes artistas entraram em contato com a herança do Império
Romano presente em esculturas, pinturas, obras arquitetônicas e literárias
espalhadas por toda a Península Itálica.
Outro
fator impulsionou o Renascimento foi que, com a queda de Constantinopla, que passava às mãos dos turcos, muitos sábios bizantinos fugiram para o Ocidente,
encontrando refúgio nos palácios dos burgueses e dos nobres italianos. Não se pode
esquecer de que, em Constantinopla, se consolidou a presença de centros de estudo, assim, os textos clássicos ainda eram lidos, e o latim e o grego eram
línguas correntes entre poetas e literatos.
Aos
burgueses interessava duplamente financiar os artistas da época, pois, ao mesmo
tempo em que ascendiam socialmente dentro da Itália, divulgavam seus nomes e
sua grandeza até mesmo nos países distantes. O patrocínio dado às artes favorecia a distinção e prestígio da burguesia, a qual era bastante ansiosa em se igualar à nobreza, porém esta última não se sentia muito feliz com esta aproximação.
O RENASCIMENTO E O CONTEXTO HISTÓRICO
Durante a
Baixa Idade Média ocorreu o renascimento comercial e urbano, o qual favoreceu
em especial algumas regiões da Europa como a Flandres (região que hoje
compreende Bélgica e Holanda) e o norte da Itália em virtude da intensa
atividade comercial. Neste momento , começou o fortalecimento do poder
monárquico em detrimento da nobreza, mas tanto na Itália não se formou uma
monarquia nacional centralizada, uma vez que constituíam regiões dominadas por
pequenos Estados sob o controle da burguesia (as Repúblicas de Florença,Gênova,
Lucca, Siena e Veneza);da nobreza (os Ducados de Milão, Módena, Ferrara,
Savóia) e da Igreja (região central da Itália). A região de Flandres era uma possessão dos Duques de Borgonha (passando
no final do século XV para o domínio dos Habsburgo) e era dotada também de
intensa atividade comercial, tendo porém uma burguesia desinteressada em
nobilitar-se como era o caso da italiana, valorizando portanto, sua posição de
mercadores e comerciantes.
Lorenzo di Medici, "il Magnifico", governante de Florença entre 1469 e1492.
O
enriquecimento das cidades italianas fez com que as famílias burguesas que
controlassem o governo das comunas a partir do podestá (líder político) que tinha sob seu controle um exército de
mercenários liderados pelo condottieri (chefe
de armas ou capitão de guerra). Em Veneza , porém, havia a figura do doge (chefe
da República) apoiado pelo senado e pelo temível Conselho dos Dez (órgão
sigiloso, com poderes de vida e morte sobre os cidadãos, composto por membros
da aristocracia veneziana).
Destacaram-se
como importantes membros da burguesia italiana os Médicis em Florença, os
Baglioni em Perúgia e os Bentivoglio em Bolonha; em algumas cidades os próprios
condottieri controlavam o poder como
os Sforza em Milão.
ITÁLIA: O "BERÇO
DO RENASCIMENTO"
O
Renascimento tem como seu "berço" a Península Itálica devido a um
conjunto de fatores que favoreceram sua formação. Em primeiro lugar, o fato de
ter sido o centro do Império Romano e guardar milhares de ruínas e resquícios
da cultura greco-romana, como templos, estátuas, prédios públicos e dessa
forma, os italianos tinham uma convivência muito próxima com seu "glorioso
passado". Em segundo lugar, o enriquecimento proveniente do comércio
mediterrâneo que permitiu aos burgueses o investimento nas artes, sendo
denominados mecenas, com o objetivo de legitimar sua posição na sociedade e
buscar uma visão de mundo que se relacionasse com seu modo de vida, rompendo
portanto, coma visão de mundo medieval, na qual eram simples trabalhadores
inferiorizados pela nobreza e clero. O mecenato,
no entanto, não ficou restrito aos burgueses, pois nobres, papas e príncipes
também o fizeram.
Um fator
muito importante foi a sobrevivência de muitos textos clássicos através da sua
conservação em bibliotecas de mosteiros e abadias que foram copiados e
traduzidos por monges copistas, do intercâmbio entre sábios bizantinos e também
pela ação dos árabes na tradução e divulgação de vários textos, como por
exemplo o estudo de Aristóteles realizado em Córdova por Ibn Rushd (conhecido no Ocidente como Averróis que viveu entre 1126 e 1198).
Averróis num detalhe do afresco "Escola de Atenas" de Rafael Sanzio, Museus do Vaticano.
A
sobrevivência dos elementos da cultura clássica pode ser relacionado com sua
redescoberta a partir do interesse dos intelectuais pelos studia humanitatis (estudos
humanos que incluíam filosofia, poesia, história, matemática , eloqüência e o
perfeito domino do latim e do grego) , pois não se buscou a mera repetição dos
modelos antigos, mas sua reinterpretação à luz de sua época e dessa forma
constituiu-se o humanismo.
Neste
contexto, destaca-se a obra de Dante Alighieri (1265-1321) A Divina Comédia, poema
épico composto por três partes (Purgatório,
Inferno e Paraíso), escrito em tercetos com versos decassílabos,
totalizando 100 cantos e totalmente escrito em dialeto toscano, o qual
futuramente daria origem a língua italiana. Apesar de inovadora, a Divina
Comédia ainda trazia vários elementos da cultura e visão de mundo medieval,
representados pela hierarquia, linearidade e imobilidade, tendo porém, uma
perspectiva que ressalta o valor humano, pois a passagem de Dante pelo Inferno
e pelo Purgatório não deturpa seu caráter, ao contrário, reafirma-o.
Afresco de Domenico de Michellino, c.1465, Catedral de Santa Maria dei Fiore - Florença, Itália.
O CONCEITO DE RENASCIMENTO
O
conceito de Renascimento vem da palavra italiana renascitá, pois se
acreditava que o período anterior, a Idade Média, fora uma "espessa e
longa noite gótica" imersa nas trevas e desprovida de cultura. Para os
homens deste período, a "verdadeira" cultura encontrava-se na
Antiguidade, a qual foi banida e em seu lugar a Igreja Católica estabeleceu o
teocentrismo. O saber, portanto, encontrava-se nas artes e nos escritos clássicos.
Dessa
forma, os artistas e intelectuais buscavam uma concepção de cultura diferente
da medieval e que tinha suas raízes no mundo greco-romano. A proposta central
era afastar-se do teocentrismo, buscando o antropocentrismo, ou seja, o homem
como medida de todas as coisas.
Ao pensarmos o conceito de Renascimento, a
questão mais importante é pensa-lo como uma releitura de um pensamento
que aparentemente teria desaparecido e seria recuperado pelos estudiosos. Tal
idéia tinha força, porque os homens da época entendiam por arte os modelos da
cultura clássica, os quais desapareceram durante o medievo e portanto
precisavam ser recuperados, segundo Giorgio
Vasari (1511-1574) e Leon Battista Alberti (1404-1472), ambos artistas renascentistas e importantes
personagens na criação dos conceitos renascimento e homem universal
(l’uomo universale), respectivamente.
Apesar
desta repulsa à Idade Média, é importante perceber que as transformações
sofridas durante o Renascimento foram resultados de um processo de continuidade
que perpassou o medievo e atingiu seu esplendor no momento seguinte, portanto,
não se pode considerar a Renascença como uma ruptura total, mas a mudança de
largo processo de experimentação e transformação.
A partir
da reabertura do Mediterrâneo após as Cruzadas (séc. XI-XIII), a Europa assistiu uma intensa
transformação das relações sociais e do modo de vida, pois as cidades voltaram
a crescer e se tornaram o centro das atividades comerciais através da atuação
dos burgueses. A burguesia era um grupo oriundo da ordem dos trabalhadores e
portanto, não possuía a legitimidade como a nobreza ou o clero, os quais
controlavam a vida dos demais .
No que
diz respeito a prosperidade italiana, esta era relacionada com o monopólio do
comércio de especiarias com o Oriente, tendo se destacado as cidades de Gênova,
Veneza, Florença e Pisa. Estas cidades controlavam a venda de especiarias
dentro da Europa e também a sua compra com os árabes e turcos no Mediterrâneo.
Visão de Florença no séc. XV
Visão de Veneza séc. XVI
Visão de Gênova séc. XV
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