As Ricas Horas do Duque de Berry

As Ricas Horas do Duque de Berry
As Ricas Horas do Duque de Berry. Produção dos irmãos Limbourg - séc. XV. Mês de julho

domingo, 30 de março de 2014

O Golpe de 1964:deposição da democracia e imposição do Regime Militar

A última quinzena de março de 1964 foi palco de uma escalada de tensão crescente. O turbilhão tivera sua origem bem antes: 25 de agosto de 1961 com a renúncia de Jânio Quadros ao cargo de presidente da República e ali já se engendrava o desrespeito à Constituição de 1946, pois a UDN e os setores conservadores temiam pela posse do vice-presidente João Goulart (afilhado político de Getúlio, seu ministro do Trabalho entre 1953-54 e grande simpatizante das causas populares) que naquela altura se encontrava em viagem ao exterior e buscava retornar o quanto antes.

De um lado, os legalistas que defendiam o cumprimento da sucessão sem quaisquer alterações, destacando-se aí o papel do então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, que com o uso dos recursos ao seu alcance, lançou a "campanha da legalidade" para defender João Goulart, não se descartando inclusive, a opção armada de resistência.

Nesse processo, o resultado foi a saída conciliatória, que através de um projeto de Emenda Constitucional, estabelecia a mudança do sistema político de governo, implantando no regime republicano, o parlamentarismo. Jango (apelido de João Goulart) assumiria a Presidência, com poderes esvaziados e simbólicos de Chefe de Estado enquanto o poder estaria concentrado no Primeiro-Ministro, como Chefe de Governo, apoiado por uma bancada majoritária no Congresso Nacional, desse modo, o novo sistema de governo implantado seria submetido a um plebiscito marcado para 1965.

A partir de então, Jango travou uma longa luta para que o plebiscito fosse antecipado, fato este ocorrido em 4 de janeiro de 1963, dando então, a posse com plenos poderes a Jango que obtivera cerca de 82% de votação em favor do presidencialismo.

Dotado de plenos poderes, Jango começou o processo que levaria a uma nova ebulição política, pois faria com que as elites e setores conservadores buscassem a pressão constante contra os projetos reformistas de Jango. Temia-se a "guinada à esquerda" aos moldes cubanos. Alias, conjuntura internacional era ainda explosiva: a tentativa de deposição de Fidel Castro, apoiada pelos EUA fracassara na Baía dos Porcos; a construção do Muro de Berlim em agosto de 1961 e a "III Guerra Mundial" quase fora detonada pelo embate entre a URSS e os EUA, quanto à implantação de mísseis nucleares soviéticos em Cuba em outubro de 1962.  

A América Latina era pensada e entendida como uma "área natural de influência" dos EUA e qualquer intromissão ou distanciamento desta postura implicava numa "quebra de ordem" da hegemonia estadunidense, fosse qual fosse o governo/governante, não havia espaço para novas "Cubas".

Mas, no âmbito interno, existia uma situação bastante clara: o Brasil mudara bastante em duas décadas, ampliando sua indústria numa política clara de substituição das importações, gerando um crescimento do PIB, bem como uma mudança no perfil social, que deixava de ser exclusivamente rural para cada vez mais se urbanizar. No entanto, a distribuição de renda era muito desigual e privilégios de origem colonial se preservavam nos rincões do país para o benefício das camadas dominantes.

Fonte: Atlas de História do Brasil - editora Scipione


Quase 30% da riqueza produzida pelo país se encontrava nas mãos de 1% da chamada "classe A", além da concentração de riqueza, a concentração fundiária era um tema tido por "intocável", especialmente pela bancada ruralista presente no Congresso Nacional. Qualquer ação que apontasse para alterar questões como remessas de lucro ao estrangeiro, reforma agrária ou que alterasse a organização da lógica produtiva seria vista e interpretada como "atitudes comunistas".

Aos 13 de março de 1964, no discurso da Central do Brasil, proferido a uma multidão de mais de 500.000 pessoas, Jango apontara com firmeza seu caminho: a implantação das Reformas de Base (agrária, habitacional, saúde, transporte, educação). Ruptura do status quo que lançava um alerta para todos os setores da direita, pois se algo não fosse feito, a "nação corria perigo".

Em 14 de março de 1964, Jango assinou o decreto que declarava como "áreas de interesse social para fins de desapropriação" as terras juntos aos eixos ferroviários e rodoviários federais, bem como a áreas improdutivas que teriam se beneficiado com programas de apoio e de irrigação do governo.

A resposta veio num relâmpago: em diferentes cidades do Brasil, mas tendo como epicentro São Paulo, ocorreu em 19 de março de 1964, a "Marcha da Família com Deus pela Liberdade", contando com cerca de 100.000 pessoas(os números são controversos e variam de acordo com a fonte consultada), articuladas através da Liga das Senhoras Católicas, da Tradição Família e Propriedade, além do apoio de diferentes setores civis e mesmo militares (os soldados foram dispensados neste dia para se integrarem a Marcha), portanto, uma resposta clara e bem ativa ao discurso da Central do Brasil e o objetivo era muito bem delimitado: exortavam que as Forças Armadas depusessem o governo João Goulart para salvar o Brasil do comunismo.

Fonte: Atlas de História do Brasil - editora Scipione

O processo de polarização continuava. Tinha-se a impressão que o país estava rumando para o caos, já que a oposição a Jango buscava bloquear seus projetos no Congresso, incitava a população civil à desordem e ainda havia, naqueles últimos dias de março, algum apoio significativo das Forças Armadas ao governo, porém, tudo foi muito transitório, especialmente com a postura indulgente de Jango para com a rebelião de marinheiros em 24 de março de 1964, tendo nesse caso, a necessidade da intervenção do Exército contra os marujos rebelados, mas Jango não lhes punira e sim, lhes anistiara, qualificando dessa forma, o que se entendia como quebra da disciplina e da hierarquia na ordem militar, algo inaceitável para os comandantes das três armas.

Jango se sustentava, perante às Forças Armadas, com uma "dispositivo militar" que se propunha defendê-lo de possíveis ameaças e talvez, como sugerem alguns, de mantê-lo no poder e assim, abririam o espaço para um golpe à esquerda. O ministro da Guerra, Jair Dantas Ribeiro, bem como o comandante do I Exército, Armando de Moraes Âncora e do II Exército, Amaury Kruel (amigo próximo a Jango) e para o III, as tropas do Sul eram chefiadas pelo general Benjamin Rodrigues Galhardo.

Como inimigos de Jango: Carlos Lacerda (governador da Guanabara), Magalhães Pinto (governador de Minas Gerais) e Ademar de Barros (governador de São Paulo); no campo dos aliados continuavam Leonel Brizola (ex-governador do Rio Grande do Sul) e Miguel Arraes (governador de Pernambuco). No campo social, o apoio das Ligas Camponesas, encabeçadas por Francisco Julião, defensor das reformas "na lei ou na marra", além de diferentes sindicatos em diferentes centros industriais.

Em 30 de março de 1964, Jango se destinara à sede do Automóvel Clube, no intuito de conversar com os jovens militares, tendo desse modo, uma postura maior de indulgência para com os soldados, marinheiros, cabos e sargentos, do que esperava o alto comando militar.

No entanto, a situação de deterioração da ordem era encarada pelos militares como o momento da ação e justamente, tudo já se articulava desde o comício da Central do Brasil. Nomes como os generais Humberto Castelo Branco, Arthur da Costa e Silva, Ernesto Geisel, Olympio Mourão Filho,Carlos Luiz Guedes e o coronel Golbery do Couto e Silva

Enquanto isso, o governo de Lyndon Johnson acompanhava com atenção o desenrolar dos fatos, tendo seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, além de outro diplomata de grande prestígio, Vernon Walters, informações detalhadas sobre tudo que se dava "nos dois lados da trincheira". Johnson autorizara o envio de uma força-tarefa para apoiar a ação militar brasileira em caso de resistência de João Goulart. Era a famosa "Operação Brother Sam" para se deslocar ao Atlântico sul, "mostrando a bandeira" e no limite das águas territoriais brasileiras.

Na madrugada de 31 de março de 1964, o general Olympio Mourão Filho mobiliza suas tropas em direção ao Rio de Janeiro, tendo gradativamente ao longo do dia, ampliação do apoio em relação ao decréscimo da lealdade pelos legalistas. O apoio dado a Jango foi minguando e quando seu amigo, Amaury Kruel mudou de lado, a sensação era de que tudo já estava se perdendo.

Fonte: Atlas de História do Brasil - editora Scipione


Jango optou pelo não-enfrentamento. Voou do Rio para Brasília, seguindo depois para Porto Alegre, num avião da FAB, enquanto nesse ínterim, não tendo renunciado ou sido preso, nas sombras daquela madrugada de 1 para 2 de abril, uma "sessão extraordinária" do Congresso fora convocada e nela se "declarou a vacância da Presidência da República" e foi dada a posse ao presidente da Câmara Deputado Ranieri Mazzilli. Buscava-se no abrigo das sombras dar um ar de legalidade à deposição de Jango, que horas mais tarde, atravessou a fronteira do Rio Grande do Sul e se destinara a uma de suas estâncias no Uruguai.

Os militares golpistas renderam seus companheiros legalistas e assumiram o controle da máquina governamental. Sob a bandeira da "segurança e ordem", a chamada "Revolução Redentora de 1964" desfechava os últimos passos contra as eventuais ameaças: naquelas primeiras horas já se mapeavam todos aqueles que seriam  empecilhos ao novo regime, criando-se listas para detenção de civis (5000 detidos até os idos de 7 de abril de 1964) e de militares (punição para 421 oficiais tirados da ativa para a reserva), além da deposição de diretorias de sindicatos com mais 5000 associados. Por outro lado, aqueles que se colocaram como leais ao governo militar foram agraciados com promoções.

Já seria bastante forte falar das prisões e aposentadorias forçadas, mas naquelas primeiras horas, houve espaço para outras formas de violência, como por exemplo, o caso de Gregório Bezerra (militante do PCB em Pernambuco) que fora espancado e arrastado amarrado na traseira de um jipe militar pelos bairros pobres de Recife. Somam-se cerca de 20 mortos, decorrentes de ações de prisão ou suicídios, no caso de alguns militares que não aceitaram a hipótese de serem presos, uma vez que, não cometeram crimes, mas tornaram-se "inimigos" da Revolução de 1964.

Atos de desforra, de covardia e oportunismo foram marcantes naqueles primeiros meses pós-golpe, encobertos sob a perspectiva de que tudo deveria ser defendido pelo bem da Segurança Nacional e pouco a pouco, já apontavam o crescente dos abusos, que muito buscaram minimizar na condição de "excessos ou exageros" no cumprimento do dever.  A posição oficial era negar a existência de qualquer mecanismo repressivo que envolvesse violência e tortura.

Se Jango e seus aliados foram neutralizados com significativa rapidez, sem derramamento de sangue em larga escala, o turbilhão de forças começava a se manifestar dentro das próprias Forças Armadas, pois a visão sobre o que seria dali era distinta: Castelo Branco defendia uma breve passagem dos militares pelo poder dentro de uma democracia restringida, mas do outro lado, estavam os oficiais da chamada "linha dura" que pensavam num governo de "longo prazo".

Sob os aplausos dos conservadores de diferentes segmentos da sociedade, sucumbia a tão jovem democracia da República Liberal , implantada com a Constituição de 1946, dando lugar a um Regime Militar que alcançara o poder através de um golpe civil-militar, imbuídos de elevado princípios morais e de valores cívicos que propunham a salvação da nação e colaboraram para a extensão do governo militar em 21 anos, buscando exterminar todo tipo de ação contrária ao regime.

 A sociedade brasileira viu sucumbir pouco a pouco, seus direitos e liberdades, sendo vítima de 17 "AI"(decretos-lei  de validade imediata chamados de Atos Institucionais) que se somavam aos "IPM"(Inquéritos Policiais Militares pelos quais os chamados "subversivos" era julgados) e todo um aparelho repressivo que unia as inteligências das Forças Armadas, bem como o centro do processo de espionagem, o SNI(Serviço Nacional de Informação), que municiava o Poder Executivo federal com todas as informações necessárias para a defesa da "Doutrina de Segurança Nacional".

Mais uma página bastante sinistra que foi escrita em nossa história e agora começamos a estudá-la melhor.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Resenha crítica: "300: a ascensão de um Império"

Mutilações, sangue e muito mais sangue. Muito sangue em combates que, para o espectador, pelos efeitos em 3D, lhe "espirram sobre a face", acompanhado de uma trilha sonora e efeitos gráficos de imensa plasticidade, conferem ao filme "300: a ascensão de um Império" uma rica roupagem e, em certa medida, superam os efeitos do "300" de Zack Snyder de 2007. 

"300" 



O filme de Noam Murro deve ser visto como um conto de ficção com "inspirações históricas" para um mero plano de fundo, afinal, os eventos ocorrem dentro do contexto das Guerras Médicas (490-448 a.C.) no processo expansionista do Império Persa sobre a Europa oriental, tendo ali, uma resistência tenaz das cidades-Estado gregas, dando-se o destaque para a Esparta de Leônidas e a Atenas de Temístocles.

A isso, podemos somar a reconstituição das batalhas navais com os birremes gregos e dos persas, algumas vestimentas e armas. No mais, a História naufragou junto com os destroços ali apresentados.

Abaixo a imagem de um trirreme (3 sequências de remos)



O elo de "A ascensão do Império" com o primeiro filme é a cena final deste que é retomada, apresentando a cólera de Xerxes que, em pessoa, decapita o corpo de Leônidas e sai de Termópilas rumando em direção à Atenas, onde a pilha e a incendeia, exibindo a cabeça de Leônidas aos atenienses que fogem ou pelo menos tentam escapar da morte, da escravização e da violência.

As cenas são acompanhadas da narrativa de Gorgo, a rainha e viúva de Leônidas, reportando que tal processo que se abatia sobre o mundo grego tinha uma origem: a batalha de Maratona em 490 a.C., quando os gregos derrotaram os persas e Temístocles atingiu mortalmente Dário I, o pai de Xerxes, que percebera o perigo a que se pai se expusera e tenta salvá-lo, mas não o faz a tempo. Daí vem a dor da perda do pai, um ódio misturado a dor e pouco a pouco, com alguma manipulação, surge o rei-deus Xerxes.





Tudo que descrevi até aqui são elementos fictícios que receberam alguma pinceladas de "História": Leônidas fora decapitado a mando de Xerxes e não pelo próprio. Atenas foi pilhada e destruída, mas sua população já tinha sido evacuada e Dario morrera com mais de 70 anos doente e não de uma flechada de Temístocles.

Por outro lado, Xerxes não era o "primogênito", mas assumira indicado por Dario, sem manipulações de ninguém, pois no filme , Xerxes seria uma "criação" de Artemísia, a rainha de Halicarnasso, cidade-estado no litoral da atual Turquia que , de fato, se aliara a Xerxes e comandara sua esquadra contra os gregos. 

Mas de outro lado, a "vilã" Artemísia é fruto do mais rebatido clichê holywoodiano: a menina que vira o brutal assassinato de seus pais, a destruição de sua terra e sofrera todos os tormentos, até que foi encontrada por um inimigo de seus inimigos e aí, treinada e preparada pelos persas, se transforma numa "assassina a serviço de Dario" e depois "almirante" de sua frota e com a morte de Dario, jogou e manipulou para colocar Xerxes no trono como se ele fosse um frágil marionete.

Alias, como uma cultura tão patriarcal permitiria tamanho espaço? O próprio mensageiro persa, que fora ameaçar Leônidas se indignara com a interferência de Gorgo no "300" e este personagem reaparece em "a ascensão do Império" como justamente aquele que "salvara e treinara" Artemísia, numa postura não condizente com aquela sociedade escravista e estamental que entendia que uma escrava morrendo na rua e um monte de estrume não tinham muita diferença.

Roteiro batido de muitos filmes de ação que se repete, tendo Temístocles como antagonista e assim, o heroi, responsável pela reunião dos gregos contra um terrível poder: Artemísia, além de inúmeros navios, tinha um com estrutura de metal e carga de piche (petróleo cru) que foi usado como arma incendiária contra os pequenos navios de madeira gregos, bem como, havia também, "homens-rã suicidas"que tinham nas costas tanques deste óleo que poderia explodir, tal qual veríamos bem mais tarde, os homens-bomba da atualidade.

Sem contar a retomada do discurso que estivera presente em "300": a Grécia símbolo de "Razão, Justiça e Liberdade" enquanto a Pérsia representava "o Misticismo, a Opressão e Escravidão", além de que a fala de Temístocles sempre exaltava a importância do "país" que naquela altura era inexistente, os soldados eram homens livres, mas a produção e sustento provinha da exploração de escravos e nem todo grego era um filósofo que através do conhecimento fazia da Razão seu único caminho de ação.

Do primeiro filme também ressurge o disforme traidor Efialtes que, continuava aliado dos persas, mas numa posição subalterna, simples lembrança da traição que praticara, sem muito propósito ou importância.

Antes da batalha final, a vilã Artemísia tenta cooptar Temístocles, seduzindo-o diretamente, pois a tensão política se extrapola numa tensão sexual, fazendo com que Temístocles tente se impor como o "macho dominante" possuindo a fogosa Artemísia, que luta pelo controle sexual também, mas ele não se rende aos caprichos de sua sedutora inimiga, abandonando-a em meio ao coito.

Bem, o que dizer? Cena irreal e apelativa, desnecessária para um filme sério, mas para um pobre roteiro, tenta salvar algo. 

Por fim, a batalha de Salamina, que fora em sequência a de Termópilas e antes de Plateia, fica como algo secundário, mas historicamente sabemos que o conhecimento do litoral e de sua navegabilidade, bem como do clima local, deram aos gregos uma imensa vantagem, favorecendo-lhes com a vitória.

Xerxes assistira tudo, do alto de um penhasco, vendo inclusive um episódio onde Artemísia se destaca e assim, seus cronistas colocam que "seus homens lutaram como mulheres, mas sua mulher lutara como um homem". Apesar de tudo isso, Artemísia se vê encurralada e para escapar do ataque grego, acabara atacando um navio persa, querendo assim, dar a entender que mudara de lado, mas tudo não passou de uma cortina de fumaça, que lá do alto, Xerxes tivera dificuldade de perceber.

Não foi isso que o filme mostrou, pelo contrário, há o enfrentamento das esquadras, Temístocles luta e mata Artemísia (que na realidade não morrera naquela batalha) e quando tudo parecia perdido para os gregos, aparece Gorgo, a rainha de Esparta, comandando sua esquadra, liderando seus homens como fizera Leônidas, lutando ombro a ombro. 

Sabemos que as mulheres espartanas eram treinadas, mas para na pior da hipóteses, serem a última linha de defesa na cidade de Esparta, uma vez que o exército estivesse ausente. Gorgo era , na realidade uma mulher inteligente e perspicaz, mas não estava no comando de Esparta e nem liderou um ataque em Salamina  com a frota espartana, pois naquela altura, o governo passara a Plistarco, filho de Leônidas.

Caem as cortinas ao som de "War Pigs", do Black Sabbath, na voz de Ozzy Osborne. Ficou, aparentemente, subentendido que virá um terceiro filme...

Que os deuses tenham piedade de nós!


Enquanto espetáculo plástico em 3D, como um conto fictício de inspiração histórica, vale a pena, mas não honra a memória daqueles que buscaram a "bela morte" no campo de batalha ao seguir Leônidas e seus bravos 300 guerreiros.


"300: a ascensão de um Império"


















quarta-feira, 19 de março de 2014

Hoje, há exatos 50 anos, ocorria a Marcha da Família com Deus pela Liberdade

O Brasil de hoje, é sem sombra de dúvida, resultado de uma construção histórica bastante complexa e diversa. Fomos colônia de Portugal (1500-1808), sede do Império Português (1808-1815), Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves (1815-1822), Império do Brasil (1822-1889) e por fim, somos desde 1889, a República Federativa do Brasil.

Nessa longa trajetória, o papel do poder centralizado em relação aos interesses locais, conseguiu preservar a integridade do território, somando-se a isso, o uso de uma mesma língua (o português) a partir da erradicação das culturas indígenas e africanas, que conseguiram ainda dar alguma contribuição linguística e cultural ao Brasil, mas ocorrendo no âmbito privado e não institucional, além do papel da religião Católica que colaborou em muito para fornecer as bases de nossa sociedade e que também, no âmbito privado, recebeu contribuições de outras culturas, mas sem que isso fosse dominante.

Na economia, a escravidão foi presente por "quase quatro séculos, seja do indígena ou do africano, condição vil, cruel e desumana, sem justificativa aceitável aos nossos olhos de hoje e que nos deixou com dezenas de tipos de preconceitos (racial, social, religioso, ....) e foi uma importante forma de acumulação de riqueza para a nossa elite, bem como, um cruel mecanismo de exclusão social cujos efeitos ainda hoje são sentidos.

Olhando de hoje para atrás, percebemos que o papel do "mando", do "uso da força", do "controle do poder", marcaram profundamente nossa sociedade, fazendo com que o poder na sua forma autoritária fosse uma constante e portanto, tido por "natural e correto". 

Todo tipo de mobilização popular foi colocada como "ameaça" e tratada com ampla violência pelo poder constituído, sendo reprimidas de modo sangrento. Assim foi com a as rebeliões coloniais (Inconfidências Mineira e Baiana, Insurreição Pernambucana), as rebeliões do Império (Balaiada, Cabanagem, Sabina e Farroupilha) e da República (Canudos, Vacina, Contestado).

A concepção de uma "cidadania" é muito recente, pois tal condição, desde a colônia até pelo menos 1946, era sempre dos privilegiados, dos bem-nascidos, daqueles que detinham o poder.

Nossa cidadania não passou por situações como a Inglaterra do século XVII, a Independência dos EUA em 1776 ou a Revolução Francesa de 1789. Aqui, tudo no geral, sempre veio de "cima para baixo", como se fosse a coisa mais comum da vida.

Nos fins do século XIX, a Monarquia era vista pelos republicanos como algo retrógrado e descompassado e a saída era uma "República eleita pela nação". Muito bem, aos 15 de novembro de 1889, um golpe de Estado liderado pelo Exército e com apoio de setores civis depôs o imperador D. Pedro II, implantando a República.

Entre 1889-94, a Chamada República da Espada foi marcada pelo autoritarismo de Deodoro da Fonseca (1889-1891) e de Floriano Peixoto (1891-1894). A partir de 1894, assumiu o 1o. presidente civil, o político cafeicultor Prudente de Moraes. Começava a chamada "República das Oligarquias" que durou até 1930, quando um novo golpe de Estado, apoiado por parte da sociedade civil e liderado pelo Exército, depôs o presidente Washington Luís em 1930, dando lugar a Getúlio Vargas e tal "sucesso" fez com que os golpistas o chamassem de "Revolução de 1930".

Vargas permaneceu no poder enquanto contou com o apoio do Exército, de 1930 a 1945, sendo deposto pelos militares e assim, mais uma vez se buscou a "via democrática". De 1946 a 1964 temos a chamada República Liberal, mas este período não escapou de ameaças golpistas.
A pressão política sobre Getúlio em 1954, que culminou com seu suicídio, pode ser vista como uma tentativa de golpe. 

Entre 1954 e 1955, Café Filho deveria fazer a transição do poder para Juscelino Kubitschek, mas os setores conservadores não queriam que isso ocorresse, então o Ministro da Guerra General Henrique Teixeira Lott aproveitara o afastamento de Café Filho da presidência (por motivos de saúde), e assim depôs o presidente interino Carlos Luz (favorável ao golpe contra JK) e deu posse ao presidente do Senado, Nereu Ramos, que concluiu seu mandato sobre "estado de sítio" e finalmente, transmitiu a faixa presidencial para Juscelino.

Juscelino no seu mandato (1956-1961) sofreu dois levantes militares : Jacareacanga (fev/1956) e Aragarças (dez/1959), porém foram facilmente debelados. A oposição a JK conseguiu eleger seu candidato em 1960: Jânio Quadros.

No entanto, as tensões vividas nos poucos meses de governo de Jânio, especialmente por sua postura de tendências autoritárias e de desdém dos políticos, fez com que o presidente pensasse numa ação golpista: envio seu vice, João Goulart (também conhecido como Jango) para uma longa viagem ao exterior (URSS e China), tentou a renúncia e com o vice-presidente distante, mas contando com o apoio de seu eleitorado, Jânio tentaria voltar ao poder "nos Braços do povo" e neutralizaria seus opositores como, por exemplo, o Congresso Nacional. 

Jânio renunciou em 25 de agosto de 1961, o eleitorado nem se manifestou e o processo de sucessão prosseguiu. Jango voltou mas a tensão política estava elevadíssima no ar: os setores conservadores não queriam que ele tomasse posse, pois era considerado próximo ao socialismo e poderia ser um risco ao Brasil. Para evitar uma possível guerra civil, foi aprovado pelo Congresso Nacional uma Emenda Constitucional que instituiu o regime parlamentarista: Jango seria o Chefe de estado, mas sem poderes efetivos, os quais seriam exercidos por um Primeiro-Ministro apoiado pela maioria do Congresso Nacional.

Mais uma vez, a quebra da regra falou mais alto. Estava marcado para 1965 um plebiscito que deveria confirmar ou não a continuidade do parlamentarismo. Jango conseguiu antecipá-lo para 06 de janeiro de 1963 e o presidencialismo foi restaurado. A crise não se concluiu, pelo contrário, começou a acelerar seus movimentos, pois João Goulart queria aprovar as Reformas de Base "na Lei ou na marra".

Em 13 de março de 1964, no Comício da Central do Brasil, no centro do Rio de Janeiro, Jango reafirmou suas posições que tendiam cada vez mais à esquerda e eram vistas como graves ameaças ao País e como resposta a Jango, aos 19 de março de 1964, cerca de 90.000 pessoas relacionadas aos segmentos conservadores da Igreja Católica, mas também de outros segmentos cristãos, com o apoio dos militares (o Exército dera folga aos soldados para participarem da Marcha)  foram para as ruas de São Paulo na chamada "Marcha da Família com Deus pela Liberdade" e clamavam que as Forças Armadas salvassem o Brasil das garras do comunismo.

A resposta veio 12 dias depois, com o golpe militar apoiado e aplaudido por uma parcela dos civis, em 31 de março de 1964.

Hoje, vemos novamente grupos conservadores preocupados com "elevados padrões de moral e ética" se organizarem novamente para pedir a intervenção dos militares, entendendo que somente o pulso firme da corporação militar poderia garantir a "restauração da ordem", pois em nome desta última, tudo é válido, inclusive, a perda da liberdade, segundo seus apoiadores.

Já escrevi isso, mas não canso de repetir : A República Federativa do Brasil somos nós. Se ela não funciona direito é porque deixamos de fazer a nossa parte, que não se resume em eleger, mas também em fiscalizar e cobrar nossos representantes.

Minha pergunta é: o que Deus tem com tudo isso? Porque uma imposição forçada e golpista não pode ser substituída por uma ação responsável e participativa da sociedade como um todo? 

Num esboço de resposta, uma hipótese: para alguns pensar e decidir dá trabalho demais e cansa. Portanto, é muito mais cômodo obedecer sem pensar e daí, o risco de se abrir espaço para tudo aquilo que o autoritarismo traz dentro de si: repressão, censura, violência e não necessariamente a "visão salvadora" de que com ele a corrupção e imoralidade vão desaparecer.

Os escândalos que hoje são denunciados, só vem à público, em virtude da liberdade de imprensa, pois seria de uma ingenuidade pueril acreditar que não houve nenhum um tipo de corrupção durante o Regime Militar (1964-85). Porém, não havia liberdade de imprensa.

Outra questão a ser esclarecida é a argumentação frágil, destemperada embasada nas mais mirabolantes teorias conspiratórias: a existência de um "poder internacional" encabeçado por algo que seria a "Nova Ordem Mundial", cujo líder seria o Barão Nathaniel Charles Jacob Rothschild (descendente de uma poderosa família de banqueiros judeus alemães que se radicou na Inglaterra no século XVIII), o qual estria articulando uma "ação" para implantar o bloco comunista na América Latina. E mais, que os governos que tivemos desde 1985 foram fruto da manipulação e vontade do Barão Rothschild e ainda também, que o nosso conhecido senador e ex-presidente José Sarney seria o seu "emissário " aqui.

A expressão "Nova Ordem Mundial" é usada pelos maçons na sua forma latina "Novus Ordo Secolorum" e aqui, por incrível que pareça, estão ressuscitando das trevas, as mesmas teorias conspiratórias que circulavam entre os fins do século XIX e no início do século XX, sobre a existência de uma conspiração maçom judaica para "dominar o mundo". Nesse período, circulava por diferentes países um panfleto apócrifo (texto sem autoria identificável ou estabelecida) que ficou conhecido como "Protocolos dos Sábios de Sião". Lembremos que, tal pensamento, foi extremamente importante para a germinação do nazismo.

Muito bem, temos aqui uma situação ímpar:  o medo e a ignorância das "conspirações diabólicas" que ameaçam o mundo e o saudosismo do autoritarismo que, para seus defensores, é a "solução" para a nossa "ineficiente República" e a vã ilusão que uma intervenção militar será "transitória", somente para "arrumar as instituições" e depois restaurar a democracia. Em 1964, o general Castelo Branco e seus apoiadores pensaram o mesmo e a "democracia restringida" foi substituída por um longo governo autoritário que durou 21 anos.

E sobre Deus, bem, acredito que muitos dos seus seguidores que endossam o golpismo esquecem dos ensinamentos e valores cristãos, especialmente, a importância do amor ao próximo e a responsabilidade dada pelo livre arbítrio e que não há mal que se justifique pelo maior bem que se almeje.

domingo, 16 de março de 2014

Pensando um pouco sobre a História

Muitas vezes, a percepção que se tem sobre a História é de "uma longa lista de datas e acontecimentos" colocados no tempo passado. Fatos e  acontecimentos fazem parte da História, mas são vistos atualmente, como ferramentas para buscarmos os seus "agentes responsáveis": as diferentes sociedades humanas que viveram no tempo passado.

Historicizar é tentar dar vida ao passado e tal processo, infelizmente, é sempre fragmentário e provisório, pois o trabalho do historiador está associado às fontes documentais que ele dispõe, sua metodologia de análise e daí virão os resultados de suas pesquisas: maiores ou menores, mais ou menos consistentes, porém, descomprometidos de apresentar uma "Verdade" intocável.

Entendendo, portanto, o discurso histórico como uma construção elaborada, geração à geração, o saber histórico hoje acumulado poderá ser revisto pelas gerações futuras, fornecendo à História um movimento dinâmico que busca entender melhor e mais precisamente o passado.

Como uma provocação, tentando incitar a curiosidade, bem como gerar desconforto em "verdades" aparentemente estabelecidas ou pelo menos aceitas por estudantes menos questionadores, apresento o início de minhas aulas com o clip do Pearl Jam, "Do the evolution", produzido em 1995, criando desse modo, um ponto de contraste com a "visão de história" dos alunos, do clip e por conseguinte, da própria música para podermos repensar ou reavaliar algumas ideias.

Muitos alunos conversam comigo depois, dizendo que gostaram outros já se colocam um pouco assustados, mas de um modo geral, este processo acaba sendo uma espécie de "terapia de choque" para pensar a História e seu processo de construção.

Eis o clip:




Segue abaixo a letra e tradução:

Do The Evolution – Pearl Jam

Woo...
I'm ahead, I'm a man
Estou à frente, sou um homem
I'm the first mammal to wear pants, yeah
Sou o 1º mamífero a usar calças cumpridas
I'm at peace with my lust
Estou em paz com minha luxúria
I can kill 'cause in God I trust, yeah
Posso matar porque confio em Deus
It's evolution, baby
É a evolução, baby!

I'm at peace, I'm the man
Estou em paz, sou um homem
Buying stocks on the day of the crash
Compro ações no dia que a Bolsa quebra
On the loose, I'm a truck,
Quando estou livre, sou um trator
All the rolling hills, I'll flatten 'em out, yeah
descendo montanhas, eu as nivelo ao chão
It's herd behavior, uh huh
É o comportamento-padrão!
It's evolution, baby
É a avolução, baby!

Admire me, admire my home
Admire-me, Admire a minha casa
Admire my son, he's my clone
Admire meu filho, eis  meu clone!
Yeah, yeah, yeah, yeah
This land is mine, this land is free
esta é minha terra, esta terra é livre.
I'll do what I want but irresponsibly
Farei o que eu quiser irresponsavelmente.
It's evolution, baby
É a avolução, baby!

I'm a thief, I'm a liar
sou um ladrão, sou um mentiroso
There's my church, I sing in the choir: Eis
a minha igreja e eu canto no coro:
(hallelujah, hallelujah)
Aleluia, Aleluia!

Admire me, admire my home
Admire-me, Admire a minha casa
Admire my son, admire my clothes
Admire meu filho, admire minhas roupas
'Cause we know, appetite for a nightly feast
Tenho apetite para um banquete
Those ignorant Indians got nothing' on me
Esses ignorantes nada conseguem de mim!
Nothing', why?
Nada, por quê?
Because... it's evolution, baby!
Porque é a evolução, baby.

I am ahead, I am advanced
Estou à frente, estou avançado
I am the first mammal to make plans, yeah
Sou o primeiro mamífero a fazer planos.
I crawled the earth, but now I'm higher
Eu rastejei pela terra e agora aqui de cima,
2010, watch it go to fire
é 2010 e vejo tudo pegar fogo.
It's evolution, baby
É a evolução, baby!
Do the evolution
Faça a evolução.
Come on, come on, come on
Vamos, Vamos!


Um bom contraponto, é outro histórico clip: "Eu nasci há dez mil anos atrás", a primeira apresentação de um videoclip em cores na televisão brasileira em 1976, portanto em si, um fato histórico, mas acho interessante observar os recursos técnicos utilizados, pois para nossos "padrões atuais" são tidos como muito simplórios, mas naquela altura eram "tecnologia de ponta":







-"Um dia, numa rua da cidade
Eu vi um velhinho
Sentado na calçada
Com uma cuia de esmola
E uma viola na mão
O povo parou para ouvir
Ele agradeceu as moedas
E cantou essa música
Que contava uma história
Que era mais ou menos assim:"
Eu nasci!
Há dez mil'anos atrás
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...(2x)
Eu vi Cristo ser crucificado
O amor nascer e ser assassinado
Eu vi as bruxas pegando fogo
Pra pagarem seus pecados
Eu vi!...
Eu vi Moisés
Cruzar o Mar Vermelho
Vi Maomé
Cair na terra de joelhos
Eu vi Pedro negar Cristo
Por três vezes
Diante do espelho
Eu vi!...
Eu nasci! (Eu nasci!)
Há dez mil anos atrás
(Eu nasci há 10 mil anos!)
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...(2x)
Eu vi as velas
Se acenderem para o Papa
Vi Babilônia
Ser riscada no mapa
Vi Conde Drácula
Sugando sangue novo
E se escondendo atrás da capa
Eu vi!...
Eu vi a arca de Noé
Cruzar os mares
Vi Salomão cantar
Seus salmos pelos ares
Eu vi Zumbi fugir
Com os negros prá floresta
Pro Quilombo dos Palmares
Eu vi!...
Eu nasci! (Eu nasci!)
Há dez mil anos atrás
(Eu nasci há 10 mil anos!)
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...(2x)
Eu vi o sangue
Que corria da montanha
Quando Hitler
Chamou toda Alemanha
Vi o soldado
Que sonhava com a amada
Numa cama de campanha
Eu li!
Ei li os símbolos
Sagrados de umbanda
Eu fui criança pra
Poder dançar ciranda
Quando todos
Praguejavam contra o frio
Eu fiz a cama na varanda...
Eu nasci! (Eu nasci!)
Há dez mil anos atrás
(Eu nasci há 10 mil anos atrás!)
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...(2x)
Não! Não!
Eu tava junto
Com os macacos na caverna
Eu bebi vinho
Com as mulheres na taberna
E quando a pedra
Despencou da ribanceira
Eu também quebrei a perna
Eu também...
Eu fui testemunha
Do amor de Rapunzel
Eu vi a estrela de Davi
Brilhar no céu
E para aquele que provar
Que eu tô mentindo
Eu tiro o meu chapéu...
Eu nasci! (Eu nasci!)
Há dez mil anos atrás
(Eu nasci há 10 mil anos atrás!)
E não tem nada nesse mundo
Que eu não saiba demais...(3x)




São duas concepções bastantes ricas e contestatórias, fazendo uma crítica/questionamento do que já fizemos neste planeta e quais desdobramentos, apontando porém, em caminhos distintos.

Em Do the evolution, há o jogo com o conceito do evolucionismo de Darwin, apresentando o avançar do tempo acompanhado da competição entre as espécies (seleção natural) e nesse processo o espaço que o Homo sapiens foi ganhando e aí está o ponto de discussão: seríamos nós , seres humanos, o topo desta evolução? O controle que temos do planeta, o modo como o ocupamos e o exploramos é único se comparado com outras espécies, porém, sabemos que no passado outras espécies de animais tiveram a hegemonia e depois foram extintas. Dessa forma, temos uma compreensão de que um dia chegará a nossa hora, mas por enquanto, a postura mais comum é o interesse por explorar mais e mais o planeta, processo que tem trazido muitos riscos e que muito recentemente, começamos a ponderar e tentar reverter.

Na música de Raul Seixas, a proposição sobre o tempo e por conseguinte, a História é outra: Raul nos passa a ideia de um "viajante do tempo", uma testemunha ocular da História que teria presenciado inúmeros episódios e fatos, mas chamo a atenção para o começo da música: "um velhinho na calçada com uma cuia de esmola e uma viola". Daí começa a trova do velhinho, citando os fatos ao longo de "dez mil'anos". Se ele viu tudo isso, como consegui? Se teve esta vivência, como não prosperou, sendo que era um mendigo numa rua? Por outro lado, o trovador milenar pode ser entendido também como uma pessoa de valor e importância, apesar de suas condições materiais, afinal, geralmente sentimos uma certa repugnância ao ter contato com tais pessoas e muitos passam pelas ruas e nem as enxergam, porém elas podem ter muito a dizer ou ensinar.

Concluo, deixando de lado qualquer tipo de visão doutrinária, que temos muito ainda para entender melhor a História e de como este conhecimento pode ser um diferencial em nossas vidas, uma vez que buscamos uma sociedade mais justa, compreensiva e tolerante, dotada de plena liberdade, mas acompanhada de ampla responsabilidade coletiva para a sua manutenção, do contrário, o que conseguiremos será abreviarmos o momento da nossa extinção.

quarta-feira, 12 de março de 2014

Parte III - Ucrânia e Rússia: relações de tensão seculares

Parte III: o fim da URSS e a reorganização geopolítica da ex-URSS  (1991-2014).


Os anos de Guerra Fria esgotaram a economia da URSS, forçando a população do país a acumular sacrifícios, enquanto as verbas eram destinadas para as despesas militares e para a corrida espacial (outro campo de competição entre as superpotências). No plano interno, a Guerra Fria provocou uma "caça as bruxas" contra os críticos do regime. O terror stalinista perpetuou-se com seus seguidores, Nikita Khrushchev e Leonid Brejnev. Nesse período, as tentativas de participação  popular foram classificadas como "revisionistas" ou de "espionagem imperialista" e violentamente reprimidas.

É bem verdade que, durante o governo de Khrushchev, tentou implantar um processo durante o "degelo", que era uma tentativa de eliminar o lado personalista do poder soviético, inclusive divulgando os terrores do governo de Stálin durante o XX Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), além de ensaiar uma pequena abertura. Mas as perseguições continuaram e nem o próprio dirigente era aceito pelo Partido Comunista, pois tinha acatado a ordem de retirar os mísseis nucleares de Cuba em 1962 e buscado aproximar-se dos EUA na sua política denominada “coexistência pacífica”.


A aproximação foi maior após a assinatura de acordos de redução de armas nucleares (em 1972, o presidente Nixon assinou o SALT-1), conversações sobre a limitação de armas estratégicas juntamente com o dirigente soviético Leonid Brejnev (1964-1982) e de tratados de cooperação técnica, econômica e espacial.

Os protestos no interior da União Soviética levaram o Comitê Central do Partido Comunista a liberalizar o regime, indicando Mikhail Gorbachev para ocupar o cargo de Secretário Geral do Partido Comunista e por sua vez, o governo da URSS. As palavras Glasnost (transparência política) e Perestroika (reestruturação econômica) passaram a fazer parte do vocabulário do novo líder. Atendendo às pressões populares, Gorbachev foi obrigado a equilibrar-se entre a "linha dura” do PCUS (velhos comunistas, stalinistas, militares e funcionários graduados do governo) e os reformistas radicais, simbolizados por Boris Yeltsin, que exigiam reformas mais amplas, profundas e rápidas.

Ocorreu em 26 de abril de 1986, o acidente nuclear de Chernobil, na Usina Nuclear de Chernobil (originalmente chamada Vladimir Ilyich Lenin) na Ucrânia (então parte da União Soviética). É considerado o pior acidente nuclear da história, produzindo uma nuvem de radioatividade que atingiu a União Soviética, Europa Oriental, Escandinávia e Reino Unido, com a liberação de 400 vezes mais contaminação que a bomba que foi lançada sobre Hiroshima. Grandes áreas da Ucrânia, Bielorrússia e Rússia foram muito contaminadas, resultando na evacuação e deslocamento de aproximadamente 200 mil pessoas para novas áreas onde pudessem , na medida do possível, retomar suas vidas. Quanta à contaminação além da Ucrânia, aproximadamente 60% de radioatividade caiu em território bielorrusso.
O acidente fez crescer preocupações sobre a segurança da indústria nuclear soviética, diminuindo sua expansão por muitos anos, e forçando o governo soviético a ser menos secreto. Os agora separados países de Rússia, Ucrânia e Bielorrússia têm suportado um contínuo e substancial custo de descontaminação e cuidados de saúde devidos ao acidente de Chernobil. É difícil dizer com precisão o número de mortos causados pelos eventos de Chernobil, devido às mortes esperadas por câncer, que ainda não ocorreram e são difíceis de atribuir especificamente ao acidente. Um relatório da Organização das Nações Unidas de 2005 atribuiu 56 mortes até aquela data – 47 trabalhadores acidentados e nove crianças com câncer de tireóide – e estimou que cerca de 4000 pessoas morrerão de doenças relacionadas com o acidente. O Greenpeace, entre outras organizações governamentais ou não, contestam as conclusões do estudo.
O governo soviético procurou esconder o ocorrido da comunidade mundial, até que a radiação em altos níveis foi detectada em outros países. Segue um trecho do pronunciamento do líder da União Soviética, na época do acidente, Mikhail Gorbachev, quando o governo admitiu a ocorrência:

"Boa tarde, meus camaradas. Todos vocês sabem que houve um inacreditável erro – o acidente na usina nuclear de Chernobil. Ele afetou duramente o povo soviético, e chocou a comunidade internacional. Pela primeira vez, nós confrontamos a força real da energia nuclear, fora de controle."
Em 1990, a "linha dura" reagiu às mudanças, tentando depor Gorbachev. Mas a população saiu às ruas contra o golpe, e os generais foram julgados por alta traição (dois deles suicidaram-se). Boris Yeltsin se apresentou como "símbolo" da resistência ao comunismo e contra a "incapacidade" de Gorbachev. A União Soviética foi extinta e substituída pela Comunidade dos Estados Independentes (CEI) para a qual Boris Yeltsin foi eleito presidente, aprofundando as reformas econômicas e implantando o sistema capitalista no leste europeu. 

                   


Por outro lado, a Rússia, desde 1991 até o presente momento, buscou uma aproximação com o mundo ocidental, por exemplo sendo incluída junto ao influente G7, que passou a ser conhecido como "G8" (as sete nações mais industrializadas do mundo e a partir de 1998, acrescido da Rússia), mas isso não representou para a população russa melhoria de vida - muito pelo contrário. Os russos, endividados, ainda são temidos, pois são detentores do segundo maior arsenal nuclear do mundo. Recentemente, deram mostras de sua determinação em não perder o status de potência militar ao realizarem uma agressiva intervenção militar na Tchechênia (1999-2000) que, assim como, na luta contra a Geórgia em 2008,  nas regiões de Ossétia do Sul e Abkhazia, buscando agregar territórios de maioria russa, bem como ocorre a disputa pelas jazidas de petróleo e gás natural.

Fonte: http://www.bbc.co.uk




Fonte: Wikipedia.org.pt


Comunidade dos Estados Independentes (CEI)  
A CEI é uma organização supranacional envolvendo 11 repúblicas que pertenciam à antiga União Soviética (Armênia, Azerbaijão, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguízia, Moldávia, Rússia, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão, ) fundada em 8 de dezembro de 1991. Este novo acordo de união política teve como principal impulsionador o presidente russo Boris Yeltsin e marcou a dissolução da União Soviética. Desde 26 de agosto de 2005, o Turcomenistão não é mais membro permanente da entidade, atuando apenas como membro associado. As três repúblicas fundadoras da CEI concordaram num certo número de pontos fundamentais, nomeadamente nos seguintes: cada estado-membro mantinha a sua independência; as outras repúblicas da antiga União Soviética seriam bem-vindas como novos membros da Comunidade; qualquer república seria livre de abandonar a CEI após ter anunciado essa intenção com um ano de antecedência; os membros deveriam trabalhar em conjunto para o estabelecimento de economias de mercado; o antigo rublo soviético é a moeda comum dos estados-membros; a Comunidade fica sediada em Minsk, Alma-Ata e São Petersburgo. As Repúblicas Bálticas: Lituânia, Estônia e Letônia nunca fizeram parte do grupo.
A Geórgia se integrou ao Grupo em 1994, mas o seu Parlamento aprovou por unanimidade em 14 de agosto de 2008 a saída do país da Comunidade dos Estados Independentes, devido ao apoio russo às causas de independência da Abkhazia e da Ossétia do Sul.

O colapso da União Soviética em 1991 permitiu a convocação de um referendo que resultou na proclamação da independência da Ucrânia. Após isso, o país experimentou uma profunda desaceleração econômica, maior do que a de algumas das outras ex-repúblicas soviéticas. Durante a recessão, a Ucrânia perdeu 60% do seu PIB entre 1991 e 1999, além de ter sofrido com taxas de inflação de cinco dígitos. Insatisfeitos com as condições econômicas, bem como as taxas de crime e corrupção, os ucranianos protestaram e organizaram greves.
A economia ucraniana estabilizou-se até o final da década de 1990. A nova moeda, o hryvnia, foi introduzida em 1996. Desde 2000, o país teve um crescimento econômico real constante, com média de expansão do PIB de cerca de 7% ao ano.
A nova constituição ucraniana, que foi adotada durante o governo do presidente Leonid Kuchma em 1996, acabou por tornar a Ucrânia uma república semi-presidencial e estabeleceu um sistema político estável. Kuchma foi, no entanto, criticado por adversários por corrupção, fraude eleitoral, desestimulação da liberdade de expressão e muita concentração de poder em seu cargo. Ele também transferiu, por várias vezes, propriedades públicas para as mãos de políticos fiéis a ele.
Em 2004, Viktor Yanukovych, então primeiro-ministro, foi declarado vencedor das eleições presidenciais, que tinham sido largamente manipuladas, como o Supremo Tribunal da Ucrânia constatou mais tarde. Os resultados causaram um clamor público em apoio ao candidato da oposição, Viktor Yushchenko, que desafiou o resultado oficial do pleito. Isto resultou na pacífica "Revolução Laranja", que trouxe Viktor Yushchenko e Yulia Tymoshenko ao poder, enquanto lançou Viktor Yanukovych à oposição.
Yanukovych retornou a uma posição de poder em 2006, quando se tornou primeiro-ministro da Aliança de Unidade Nacional, até que eleições antecipadas em setembro de 2007 tornaram Tymoshenko primeiro-ministro novamente.
Disputas com a Rússia sobre dívidas de gás natural interromperam brevemente todos os fornecimentos de gás à Ucrânia em 2006 e novamente em 2009, levando à escassez do produto em vários outros países europeus. Viktor Yanukovych foi novamente eleito presidente em 2010, com 48% dos votos.
O protestos começaram em novembro de 2013, quando os cidadãos ucranianos exigiram uma maior integração do país com a União Europeia (UE). As manifestações foram provocadas pela recusa do governo ucraniano em assinar um acordo de associação com a UE, que Yanukovych descreveu como sendo desvantajoso para a Ucrânia. Com o tempo, o movimento Euromaidan promoveu uma onda de grandes manifestações e agitação civil por todo o país, o contexto que evoluiu para incluir clamores pela renúncia do presidente Yanukovich e de seu governo.


Fonte: www.g1.globo.com

A violência intensificou-se depois de 16 de janeiro de 2014, quando o governo aceitou as leis Bondarenko-Oliynyk, também conhecidas como leis anti-protestos. Os manifestantes anti-governo então ocuparam edifícios do centro de Kiev, incluindo o prédio do Ministério da Justiça, e tumultos deixaram 98 mortos e milhares de feridos entre os dias 18 e 20 fevereiro. Em 22 de fevereiro de 2014, o Parlamento da Ucrânia destituiu Yanukovych por considerar o presidente incapaz de cumprir seus deveres e definiu uma eleição para 25 de maio para selecionar o seu substituto.

No entanto, o Parlamento local da Crimeia, aprovou a declaração de independência em relação à Ucrânia e já estabeleceu para o dia 16 de março, um referendo para que a população local voto sobre a anexação da Crimeia à Rússia. A Crimeia está ocupada militarmente por tropas russas, algo em torno de 20.000 soldados, além da presença de blindados e aviões de guerra, no entanto, o presidente Putin entende que "não houve invasão" e que a movimentação de tropas na região obedece os acordos assinados com a Ucrânia sobre o uso das bases militares do Mar Negro, sendo que Putin entende se há alguma movimentação de tropas, são de "forças militares da Crimeia pró-Rússia", mas não é este o ponto de vista das potências ocidentais. Alias, estas "forças militares locais" usam uniformes sem identificação, podendo assim, ser compreendido como uma espécie de "cortina de fumaça" para a intervenção russa.


Fonte: www.g1.globo.com


 Paira no ar uma sensação de tensão que extrapola as fronteiras do Leste Europeu, pois UE, EUA observam e calculam com atenção os passos face à reação de Putin sobre aquilo que seria uma "intromissão" do Ocidente onde sempre a Rússia (na época do Império Russo ou da URSS) entendeu como "seu" espaço (área de influência) e quais serão os próximos desdobramentos, porém, quando olhamos para História, alguns se lembram dos resultados da "Conferência de Munique" de 1938, quando França e Grã-Bretanha barganharam com Hitler, cedendo às suas chantagens e permitiram a desintegração da Tchecoslováquia, entregando-a aos nazistas, mas aquilo era um "sacrifício" em nome da Paz. Sabemos que no ano seguinte explodiu a II Guerra Mundial. Estaria, a História, se repetindo?

Sugestões do Gabinete:

"Nothing and Never". Direção: Dmitriy Nepochatov. (2006) 45min: documentário premiado que apresenta de modo breve mas intenso o processo da chamada "Revolução Laranja" na Ucrânia em 2004. O documentário é falado em ucraniano com legendas em inglês.




















"Adeus, Lênin". Direção: Wolfgang Berger. (2003), 118 min. : Em 1989, pouco antes da queda do muro de Berlim, a Sra. Kerner (Katrin Sab) passa mal, entra em coma e fica desacordada durante os dias que marcaram o triunfo do regime capitalista. Quando ela desperta, em meados de 1990, sua cidade, Berlim Oriental, está sensivelmente modificada. Seu filho Alexander (Daniel Brühl), temendo que a excitação causada pelas drásticas mudanças possa lhe prejudicar a saúde, decide esconder-lhe os acontecimentos. Enquanto a Sra. Kerner permanece acamada, Alex não tem muitos problemas, mas quando ela deseja assistir à televisão ele precisa contar com a ajuda de um amigo diretor de vídeos.




















"Senhor das Armas". Direção: Andrew Niccol. (2005), 122 min. : Yuri Orlov (Nicolas Cage) é um imigrante ucraniano, radicado nos EUA e que explorou toda forma de comércio de armas que realizan do negócios nos mais variados locais do planeta, inclusive aproveitando o desmonte do arsenal soviético com o fim da Guerra Fria. Estando constantemente em perigosas zonas de guerra, Yuri tenta sempre se manter um passo a frente de Jack Valentine (Ethan Hawke), um agente da Interpol, e também de seus concorrentes e até mesmo clientes, entre os quais estão alguns dos mais famosos ditadores do planeta.