As Ricas Horas do Duque de Berry

As Ricas Horas do Duque de Berry
As Ricas Horas do Duque de Berry. Produção dos irmãos Limbourg - séc. XV. Mês de julho

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Descendentes de vítimas do Holocausto repetem tatuagens de Auschwitz

Fonte: Portal iG - BBC Brasil 

Como outros israelenses, Doron Diamant gravou em seu braço a mesma tatuagem à qual seu pai foi submetido à força quando chegou a campo de concentração.

BBC
A tatuagem de Doron Diamant, que imita a do pai

O israelense Doron Diamant, de 40 anos, gravou em seu braço uma tatuagem com o número 157622 - a mesma tatuagem à qual seu pai, Yosef, foi submetido à força quando chegou ao campo de concentração de Auschwitz em 1942.
"Fiz essa tatuagem para expressar o quanto me identifico com meu pai e quero preservar sua memória", disse Diamant à BBC Brasil. "E para que o Holocausto não seja esquecido."
Diamant, que é marceneiro, diz que as pessoas que encontra no seu dia a dia sempre perguntam o que significa o número tatuado em seu braço. "Pelo menos duas vezes por dia eu conto sobre meu pai e o que ele sofreu em Auschwitz, se não tivesse a tatuagem isso não aconteceria", disse. "Além do número também gravei o desenho de um diamante, que representa o nome da nossa familia - Diamant", acrescentou.
História
O pai de Doron, Yosef Diamant, que nasceu na aldeia de Mishkov, na Polônia, tinha 16 anos quando foi preso e levado a Auschwitz - o maior campo de extermínio nazista. Dos seis milhões de judeus que foram exterminados durante a Segunda Guerra Mundial, um milhão foram assassinados em Auschwitz.
"Desde que nasci minha vida foi sempre à sombra do Holocausto por causa da história do meu pai, ele foi o único que sobreviveu de toda a sua família, além de um primo distante", afirmou.
Quando Yosef Diamant foi libertado do campo de concentração, em 1945, ao final da guerra, ele procurou sua família porém não achou ninguém. Em 1948 imigrou para Israel, onde se casou e teve cinco filhos e 22 netos. Durante a maior parte de sua vida trabalhou como motorista de ambulância.
"Ele se orgulhava muito de ter ajudado no parto de 89 mulheres que levou na ambulância", acrescentou o filho. Mais quatro membros da família Diamant fizeram a mesma tatuagem - a irmã de Doron e três de seus sobrinhos.
Outros jovens israelenses tomaram a mesma decisão, sem conhecer a família Diamant, e também movidos pelo desejo de homenagear seus avós e manter viva a memória do Holocausto.
'Falta de reflexão'
No entanto, para o historiador Avraham Milgram, a repetição da tatuagem de Auschwitz "demonstra uma falta de reflexão". Milgram, que trabalha no Museu Yad Vashem, em Jerusalém, disse à BBC Brasil que, ao fazerem a tatuagem, a motivação desses jovens "não é negativa, o jovem quer se identificar com o avô, mas acaba homenageando os nazistas e não o avô".
De acordo com o historiador, a tatuagem dos prisioneiros em Auschwitz foi um ato de desumanização. Cerca de 400 mil pessoas foram tatuadas com números ao passarem pela "fila da seleção" no campo de concentração.
Geralmente a tatuagem era executada em prisioneiros destinados a trabalhos forçados. A grande maioria dos idosos e das crianças não foi tatuada. Essas pessoas, que não tinham condições de trabalhar, eram mandadas diretamente para as câmaras de gás, onde morriam asfixiadas.
"Por que não lembrar o avô como ser humano e não como número?", questiona Milgram, "por que repetir o ato dos nazistas?". A tatuagem, por jovens judeus, com os números do campo de concentração é "mais uma expressão do trauma que o povo judeu sofreu no Holocausto", afirmou.
Segundo Milgram, o Holocausto deixou um trauma psicológico profundo, que afeta não só a geração das pessoas que sofreram diretamente com o nazismo, mas também "várias gerações de descendentes".
"Nesse ato da tatuagem há uma certa ironia, uma ironia triste, existem tantas formas humanas de lembrar, adotar justamente um simbolo desumano é um absurdo", concluiu o historiador.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A tecnologia e seus dilemas

Em Eclesiastes 1, 1-2, segundo a Vulgata  de São Jerônimo, está escrito: "Vanitas vanitatum, et omnia vanitas", quer dizer, "Vaidade das vaidades, tudo é vaidade" e com certeza, podemos transpor esta citação do mundo antigo para o nosso tão tecnológico e digital mundo contemporâneo, especialmente, quando pensamos o consumismo e a obsoletização  programada, a qual enreda os ávidos consumidores com os "cantos de sereia da modernidade e atualização", impingindo um valor maior para um determinado produto em detrimento de outro.

No anos 80, quem tinha um carro usado ficava sendo ridicularizado por não conseguir um carro novo e naquela época, nem todos tinham carro, trocá-lo anualmente era para uma elite e ter um usado significava algum conforto, mas ao mesmo tempo, poderia trazer muitas dores de cabeça, principalmente se a manutenção ficasse a desejar. Recordo-me desta época de uma expressão usada para carros mais velhos: "poisé", que era, uma alusão a expressão "pois é", ao iniciar a lista de explicações de qual era o motivo de mais uma quebra entre tantas outras já incontáveis.

Nos anos 90, o advento da telefonia celular trouxe aos bem-aventurados daquele contexto, uma ideia de "status e prestígio" daquele "tijolo digital", citado de forma pomposa até em letra de pagode. Com o avançar dos anos eles ficaram cada vez menores, chegando a caber na palma da mão. Porém, o tempo sempre é capaz de surpresas....

Na virada o milênio, a expansão da Internet, a ampliação da sua velocidade e das tecnologias sem fio promoveram um revolução conservadora: os celulares voltaram a crescer, tendo grandes telas e teclados, assumindo a condição de um computador de bolso, coisa que só fora vislumbrada em textos de ficção científica como "Jornadas nas Estrelas", mas ainda nos falta a benção do "tele-transporte"...

Já depois de uma década, hoje vemos proliferar o dito "smartphone" com sua tela sensível ao toque e tudo se revela como um passe de mágica e dessa forma, os celulares de tela e tecla aparentemente ganharam o status de "contemporâneos dos dinossauros"...

A reportagem abaixo mostra como o "Império" lida com esse drama transcendental do consumismo: a vergonha de não ter um aparelho de pelo menos 7 polegadas de tela touch screen e todas as vantagens da internet digital 3G ou 4G.

Bem, usando um expressão antiga, um dia a ficha vai cair...



Nos EUA, celulares BlackBerry se tornam motivo de vergonha para seus donos

NICOLE PERLROTH
DO "NEW YORK TIMES" Fonte: Portal UOL 

Rachel Crosby fala sobre seu celular BlackBerry da mesma maneira que alguém poderia falar sobre um parente que causa embaraços.
"Tenho vergonha dele", disse Crosby, representante de vendas em Los Angeles, que conta não mostrar mais seu BlackBerry quando participa de jantares e conferências de negócios. Em reuniões, ela diz esconder o BlackBerry por sob seu iPad, por medo de que os clientes formem opinião negativa sobre ela caso o vejam.

O BlackBerry costumava ser ostentado pela elite e pelos poderosos, mas as pessoas que ainda têm um deles dizem que o aparelho se tornou motivo de zombaria e desdém da parte das pessoas equipadas com o iPhone e os mais recentes celulares Android.


Divulgação
Smartphone BlackBerry, da canadense RIM: uso de celulares da marca vem perdendo o prestígio de outrora
A Research in Motion (RIM) talvez continue a encontrar sucesso com a venda do BlackBerry em países como a Indonésia e a Índia, mas nos Estados Unidos ela se vê reduzida a menos de 5% do mercado de celulares inteligentes --ante dominantes 50% apenas três anos atrás. O futuro da companhia depende de uma nova família de modelos cujo lançamento foi postergado diversas vezes e agora devem chegar ao mercado no ano que vem.

Enquanto isso, a RIM registrou prejuízo líquido de US$ 753 milhões no primeiro semestre deste ano, ante lucro de mais de US$ 1 bilhão no período em 2011.
Entre os mais recentes sinais de perda de prestígio: quando Marissa Mayer assumiu como presidente-executiva do Yahoo, um dos seus primeiros passos para reconstruir a imagem antiquada da companhia foi substituir os BlackBerrys dos funcionários por iPhones e celulares Android. O BlackBerry talvez persista em Washington, Wall Street e entre os profissionais de Direito, mas no Vale do Silício eles são tão raros quanto gravatas.

A lista de amigos que no passado costumavam se comunicar regularmente pelo serviço de mensagens instantâneas do BlackBerry, o BBM, não para de encolher, e os proprietários do aparelho não economizam palavras sobre o que gostariam de fazer com seus celulares.

IRA
"Gostaria de destrui-lo com um bastão de beisebol", diz Crosby, depois de esperar três minutos pelo carregamento do navegador em seu BlackBerry, e aí perder a conexão porque acabou a bateria. "Não se pode fazer nada com ele. Teoricamente seria possível, mas é tudo uma grande enganação".
A animosidade cultural entre os devotos do BlackBerry e todo mundo mais só se agravou ao longo dos últimos 12 meses, quando empresas que anteriormente forneciam BlackBerrys --e nenhum outro celular-- aos seus funcionários começaram a ceder aos pedidos de seu pessoal e substituir os modelos antigos por iPhones e celulares Android.
O Goldman Sachs recentemente ofereceu ao seu pessoal a opção de trocar o BlackBerry por um iPhone. O importante escritório de advocacia Covington & Burling fez o mesmo por insistência dos advogados mais jovens. Até mesmo a Casa Branca, que usava o BlackBerry por motivos de segurança, recentemente começou a permitir o uso do iPhone.
(Alguns membros da equipe do presidente suspeitam que a decisão tenha sido influenciada por Obama, que prefere usar o iPad em seus briefings de segurança nacional. Consultado, um porta-voz da Casa Branca não quis comentar.)
REJEIÇÃO
Lá fora, no mundo, os insultos continuam. Victoria Gossage, 28, que trabalha no departamento de marketing de um fundo de hedge, participou de um retiro empresarial no Piping Rock Club, um country club fino em Locust Valley, Nova York, e pediu um carregador de celular ao recepcionista. "Primeiro ele respondeu que sim, mas ao ver meu celular falou: 'mas não para isso'".
"Você termina se acostumando a esse tipo de rejeição", disse.
"Os usuários do BlackBerry são como os do MySpace", desdenha Craig Robert Smith, músico em Los Angeles. "Devem usar o AOL Instant Messenger para seus chats".

Os condenados ao BlackBerry dizem que sofrem vergonha e humilhação pública ao verem seus colegas usando aplicativos de redes sociais que não estão disponíveis para seus aparelhos, tirarem fotos com resolução mais alta e navegarem com sucesso pelas ruas --e pela internet-- com browsers superiores e um sistema de GPS mais eficiente.
Novas indignidades surgem porque eles precisam terceirizar tarefas como procurar endereços, comprar passagens, fazer reservas em restaurantes ou procurar placares de esportes, recorrendo a namorados, amigos ou colegas equipados com iPhones e celulares Android, que atendem esse tipo de pedido a contragosto.

'SINTO-ME INÚTIL'


"Sinto-me completamente inútil", diz Gossage. "Você vê as pessoas fazendo tudo isso com seus celulares e tudo que tenho a alegar em resposta é que posso conversar com minha família em nosso grupo no BBM".

Ryan Hutto, diretor de uma companhia de informações de saúde em San Francisco, diz que frequentemente precisa recorrer a outras pessoas, usualmente sua mulher, para ouvir música, procurar informações de navegação e descobrir placares de jogos. "Depois de duas ou três perguntas, as pessoas começam a se irritar", diz.

Peter DaSilva/The New York Times
Shannon Hutto usa seu iPhone ao lado de seu marido, Ryan, usuário de BlackBerry
Shannon Hutto usa seu iPhone ao lado de seu marido, Ryan, usuário de BlackBerry



Sua mulher, Shannon Hutto, diz, com um suspiro: "Sempre que saímos juntos, preciso procurar o mapa com meu celular. Se estamos procurando um restaurante, eu é que tenho o aplicativo do Yelp. Se precisamos de reserva, eu é que recorro ao Open Table. Parece que sou a secretária dele".

TECLADO EFICIENTE


Mas alguns usuários do BlackBerry afirmam que não abandonarão o aparelho, principalmente por conta de seu eficiente teclado físico. "Uso meu BlackBerry por escolha", diz Lance Fenton, 32, investidor que viaja frequentemente e precisa enviar e-mails em viagem. "Não consigo digitar meus e-mails em um telefone com tela de toque".

Fenton diz que não consegue compreender a febre do iPhone. "Pergunto constantemente às pessoas o que ele tem de tão espetacular, e as respostas são sempre tolas", diz. "Alguém me disse que estou perdendo o app que mapeia percursos de esqui. Esquio quatro dias por ano. Não preciso de um app de esqui".

Os mais recentes esforços da RIM para reter a fidelidade de seus usuários, e a dos programadores de que precisa para criar aplicativos destinados à sua nova geração de aparelhos, a ser lançada no ano que vem, despertaram repulsa universal. Em um recente vídeo promocional, Alec Saunders, vice-presidente de relacionamento com criadores de software na RIM, é visto cantando um rock intitulado "Devs, BlackBerry Is Going to Keep on Loving You", baseado na balada "Keep On Loving You", do Reo Speedwagon.
"Isso sinaliza uma companhia desesperada", diz Nick Mindel, 26, analista de investimento. "Poxa, BlackBerry. Sempre tive fé em vocês, mas acabam de perder um cliente. E francamente não acho que possam perder muitos mais".

Depois de oito anos usando o BlackBerry, Mindel se inscreveu na lista de espera de um iPhone 5. Quando o novo celular chegar, diz, "estou pensando em tirar a bateria do BlackBerry, encher o vão de cimento e usá-lo como peso de papel".
Tradução de Paulo Migliacci

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Eric Hobsbawm: o legado de um historiador

Eric J. Hobsbawm (1917-2012)

Para todos os historiadores que atuaram e atuam ainda, seja na docência, seja na pesquisa, é praticamente impossível não ter passado nos últimos setenta anos, sem ter lido, falado ou discutido algum trabalho do britânico Eric J. Hobsbawm, falecido nesta manhã em Londres, aos 95 anos.

Sua produção historiográfica percorreu a chamada "História Contemporânea", varrendo da Revolução Francesa ao século XX, com a famosa quadrilogia das "Eras" e ainda escreveu sobre nacionalismo, banditismo, globalização, jazz, entre outros temas.

Numa espécie de auto-biografia recente, intitulada "Tempos interessantes", Hobsbawm mostra como sua vida ao longo do século XX foi se impactando mais ou menos com as inúmeras transformações históricas, socioeconômicas e culturais que ele presenciou.

Enquanto ativista do comunismo, teve uma postura firme e ao mesmo tempo, questionável por muitos, pelo seu apreço e apoio às ações do regime soviético, sem se posicionar de modo revisionista ou realizando concessões. Segundo ele próprio, sua permanência no partido comunista britânico (que ele ajudara a fundar) foi até o contexto da invasão soviética à Hungria em 1956, mas em linhas gerais, não abandonou o marxismo e suas discussões teóricas sobre o mundo, questionando o capitalismo e seus problemas.

Em sua última publicação "Como mudar o mundo",  Hobsbawm retoma o pensamento marxista, buscando corajosamente uma análise rica e fecunda destes tempos tão difíceis e complexos que vivemos e de certa forma, nos oferece um legado precioso: a necessidade de buscarmos uma sociedade mais justa, atendendo melhor nossos semelhantes, independentemente de suas crenças, origens socioeconômicas.

Ao "camarada" Eric Hobsbawm, devemos um muito obrigado pelo apaixonado combate que ele teve pela vida e pela História, legando a nós, historiadores de várias partes do planeta, uma visão plural e rica da disciplina e de seu papel perante à sociedade.

Sugestão bibliográfica:


  • A Era das Revoluções
  • Era do Capital
  • A Era dos Impérios
  • Era dos Extremos
  • Sobre História
  • Globalização, Democracia e Terrorismo
  • Da Revolução Industrial Inglesa ao Imperialismo
  • História Social do Jazz
  • Pessoas Extraordinárias: Resistência, Rebelião e Jazz
  • Nações e Nacionalismo desde 1780
  • Tempos Interessantes (autobiografia)
  • Os Trabalhadores: Estudos Sobre a História do Operariado
  • Mundos do Trabalho: Novos Estudos Sobre a História Operária
  • Revolucionários: Ensaios Contemporâneos
  • Estratégias para uma Esquerda Racional
  • Ecos da Marselhesa : dois séculos reveem a Revolução Francesa 
  • As Origens da Revolução Industrial
  • Como mudar o mundo