As Ricas Horas do Duque de Berry

As Ricas Horas do Duque de Berry
As Ricas Horas do Duque de Berry. Produção dos irmãos Limbourg - séc. XV. Mês de julho

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

O Absolutismo

Chamamos de absolutismo a organização política que caracterizou os países da Europa durante os séculos da Idade Moderna, na qual o poder estava centralizado nas mãos de um monarca, que recebia sustentação política da nobreza, justificativa e base moral da Igreja Católica e apoiava-se economicamente na burguesia.

O Renascimento Comercial fez surgir uma nova classe social, que apresentava necessidades bastante específicas. Os burgueses precisavam de estradas confiáveis e livres de bandidos, sistemas unificados de pesos, medidas e moeda, além de uma uniformização tributária. O poder descentralizado do feudalismo representava um empecilho a essa nova classe, que viu no rei a materialização de seus anseios.

O absolutismo pode, então, ser caracterizado como a aliança da burguesia com o rei, em que a primeira fornecia os meios financeiros para o combate ao poder regional, recebendo em troca proteção e uniformidade. O rei era, então, capaz de pagar um corpo burocrático para governar o país e formar um exército nacional profissional e, posteriormente, uma marinha, colocando a "nação" a serviço da burguesia.

TEÓRICOS DO ABSOLUTISMO

Vários autores tentaram explicar a origem do poder dos reis absolutos. Tais ideias tornaram-se necessárias na medida em que as populações estavam submetidas aos nobres feudais e, assim sendo, a autoridade do rei parecia algo distante da realidade.
Mas é preciso lembrar que também era grande o número de pessoas que sentia a necessidade de desfrutar um mundo no qual fossem reconhecidos elementos nacionais, isto é, elementos que criassem ligações e identidade entre aqueles que moravam próximos. Significa dizer que havia público para aceitar e seguir língua, religião e outros símbolos nacionais.

Entre os principais pensadores da época, pode-se destacar o florentino Maquiavel, os franceses Jean Bodin e Jacques Bossuet e o inglês Thomas Hobbes. Mas estes não foram os primeiros a pensar a política como um assunto que deveria ter uma prática definida. O teólogo Tomás de Aquino, criador da escolástica, talvez tenha sido o precursor deles. O tomismo defendia que a moral e o respeito aos direitos naturais humanos eram fundamentos limitadores do poder político.



Maquiavel, retratado por Santi di Tito, s.d., Palazzo Vecchio, Florença, Itália.


Nicolau Maquiavel (1469 - 1527) - Esse florentino pertenceu ao governo da poderosa família aristocrática Médici, e nunca aceitou a fragmentação política da Itália. É o autor da célebre obra O Príncipe, em que defendeu a teoria de que o Estado e a ordem dele advinda justificariam os meios necessários à sua implantação. Dessa forma, a mentira, a traição, a violência e quaisquer outros meios para a manutenção do poder seriam plenamente justificados, já que o Estado poderia trazer a paz e a ordem. Maquiavel chegou a dizer que o monarca não deveria se preocupar com o fato de o povo amá-lo ou não, pois o que garantiria o respeito seria o temor, e não o amor.


Jean Bodin 


Jean Bodin (1529 - 1596) - Defendia a teoria de que o rei era para a nação aquilo que um pai representava para seus filhos, devendo, dessa forma, ser obedecido sem contestação. Acreditava na ideia da “soberania não-partilhada”, ou seja, o poder real não poderia sofrer restrições ou ameaças, pois a autoridade real emanava de Deus. Nesse sentido, o rei poderia legislar sem precisar do consentimento de quem quer que fosse.

Hobbes, por John Michael Wright, s.d., National Portrait Gallery, Londres


Thomas Hobbes (1588 - 1679) - Foi o autor de O Leviatã, considerada a mais notável dentre todas as obras do pensamento absolutista. Nela, o autor defende a tese de que os homens em estado natural (livres da sociedade) comportam-se como animais. Na sociedade primitiva, “em estado de natureza”, ninguém está sujeito às leis, seguindo apenas o interesse próprio; na prática, há uma “guerra de todos contra todos. Nesse sentido, se na natureza cada animal tem seu predador, o homem seria o seu próprio”. Sintetizou essa ideia na conhecida frase ”o homem é o lobo do homem” .
Acreditava que somente um soberano absoluto poderia garantir à sociedade a tranquilidade necessária para a prosperidade. Para isso, os homens dotados do sentimento de autoconservação e da razão buscariam a união para formar uma sociedade civil, mediante um contrato social, segundo o qual cada um abriria mão de seus direitos, renunciaria à liberdade e cederia poderes amplos ao soberano, em nome da manutenção da ordem e da paz, contra a violência e o caos da sociedade primitiva. Segundo Hobbes, “é lícito ao rei governar despoticamente, já que o próprio povo lhe deu o poder absoluto”.

Bossuet por Hyacinthe Rigaud, Galleria deglie Ufizzi, Florença, Itália.


Jacques Bossuet (1627 - 1704) - Apresentou a mais conhecida e tradicional justificativa para a centralização absolutista, muito provavelmente como consequência de seu trabalho junto à corte francesa, uma vez que educou pessoalmente o filho do rei Luís XIV. Em seu livro Política Segundo a Sagrada Escritura, afirmava que o rei não devia prestar contas a ninguém senão a Deus, já que "o trono real não é o trono de um homem, mas o trono do próprio Deus". Em outras palavras, o rei era indicado diretamente pelo Todo-Poderoso, a quem ninguém poderia questionar. Estava assim estabelecido o chamado direito divino dos reis.

ABSOLUTISMO NA PENÍNSULA IBÉRICA

A formação da Monarquia Nacional espanhola esta diretamente relacionada com o fim da Guerra de Reconquista em 1492 devido a expulsão dos mouros de Granada, finalizando oito séculos de guerra constante e representou a união definitiva dos reinos cristãos, pois desde 1469 as coroas de Castela e Aragão foram unificadas com o casamento dos Reis Católicos, Isabel e Fernando.
A unificação do Estado permitiu a Coroa espanhola investir na empreitada marítima assim como Portugal vinha fazendo e tal processo culminou com a chegada dos espanhóis ao chamado Novo Mundo e assim puderam construir um vasto império colonial já no século XVII.
O absolutismo teve sua manifestação mais clara a partir da dinastia Habsburgo , uma família nobre de origem austríaca que através de uma hábil política de casamentos conseguiu obter quase toda Europa central e ocidental sob seu poder. Tal processo teve início com o imperador Carlos V e chegou ao apogeu com seu filho Felipe II, senhor de um vasto império no qual "o sol nunca se punha" .

Carlos V

Felipe II


Os Habsburgo ambicionavam em unir sob sua coroa toda Europa e para tanto rivalizavam com as outras duas dinastias rivais: os Bourbon na França e os Tudor na Inglaterra. Quanto aos ingleses , Felipe II tentou invadir a Inglaterra com a Invencível Armada, mas não obteve sucesso em virtude de uma forte tempestade e da ação dos corsários da rainha Elisabeth, liderados por Francis Drake. Em contrapartida, os espanhóis formaram um vasto império colonial nas terras americanas, o qual foi responsável pelo enriquecimento através das minas de ouro e prata conquistadas pelos espanhóis dos astecas e dos incas, povos dominados que habitavam a América antes da chegada dos espanhóis.
           
ABSOLUTISMO NA FRANÇA

A centralização do poder monárquico se concretizou na França após a Guerra dos Cem Anos (1337-1453) com a expulsão dos ingleses do território francês e o estabelecimento da dinastia Valois, pois a autoridade real foi expandida para todo o reino, submetendo os nobres.
O absolutismo francês, no entanto, não foi totalmente implementado neste período, porque sua organização se deu de forma lenta através da transição entre o controle indireto pelo rei até o poder total, principalmente em virtude das tumultuadas relações entre a Coroa e a burguesia pela propagação da fé protestante na França, no caso, o calvinismo.

Durante o período de 1453 e 1589, os reis da dinastia de Valois procuraram ampliar seu poder através da supremacia dos tribunais reais sobre a autoridade local como também combateram as heresias e a expansão do protestantismo. No intuito de reduzir os choques com os protestantes, a rainha-mãe Catarina de Médici (regente durante a infância de Carlos IX) favoreceu os huguenotes com o Edito de Saint-Germain, a partir do qual concedia liberdade de culto nos subúrbios de Paris e dava-lhe o controle de duas cidades Montauban e La Rochelle.

O apaziguamento foi tentado também com a união de Margarida de Valois (princesa católica) e Henrique de Navarra (príncipe protestante). No entanto, a desconfiança de setores católicos radicais,a forja de uma "conspiração huguenote" e a ação de Catarina de Médici para a repressão dos protestantes foram fatores para que em 24 de agosto de 1572 ocorresse o massacre da "Noite de São Bartolomeu", quando mais de 5000 protestantes foram assassinados pelos partidários católicos do rei, agravando o clima de tensão entre católicos e protestantes, fazendo com que a morte de Carlos IX em 1574 e ascensão de Henrique III (1574-1589) mostrassem sinais do enfraquecimento da Coroa .

A figura real ficou extremamente abalada, principalmente no reinado de Henrique III, quando eclodem as "Guerras de Religião", tendo de um lado a Liga Católica sob a liderança do duque Henrique de Guise (que contava com o apoio da rainha-mãe Catarina de Médici) e de outro as facções protestantes. O rei Henrique III ordena o assassinato do duque Henrique de Guise e é deposto pela Liga Católica, dessa forma, busca o apoio de Henrique de Navarra, ajudando-o com suas tropas no cerco de Paris em 1589, mas Henrique III morre durante os combates e nomeia Henrique de Navarra como seu sucessor. Sendo de formação protestante renegou sua fé em cerimônia pública em julho de 1593, tornando-se conhecido pela expressão "Paris vaut bien une messe" (Paris bem vale uma missa) em virtude de sua conversão por motivos políticos.

Henrique IV, o fundador da Casa de Bourbon




Ao vencer as tropas da Liga Católica, Henrique de Navarra ascendeu ao trono como Henrique IV, dando início a dinastia de Bourbon, decretando a liberdade de culto e reafirmando o controle sobre as cidades de Larochelle e Montauban através do Edito de Nantes em 1598.
Henrique IV foi assassinado por um fanático em 1610, quando seu filho Luís XIII assume o trono sob a regência da mãe Maria de Médici, a qual delegou poderes ao cardeal Richelieu que se tornou ministro de Estado. O reinado de Luís XIII foi marcado pela forte influência de Richelieu que continuou a frente do governo mesmo com a maioridade do rei, sendo responsável pela perseguição aos protestantes com retomada das cidades sob seu controle, mantendo apenas a liberdade de culto. Richelieu procurou fortalecer o poder da França na Europa através de sua participação na Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), pois objetivo era atacar a hegemonia dos Habsburgo.

Com a morte de Luís XIII em 1643 e de Richelieu no ano anterior, ascendeu ao trono Luís XIV aos cinco anos e portanto esteve sob a regência de sua mãe Ana d'Áustria e do cardeal Mazzarino até 1661. Neste período ocorreram as Frondas (1648-1653), ou seja, revoltas da nobreza com apoio burguês em virtude de  uma política de aumento de impostos, da crise de abastecimento e da exclusão de nobres do poder .

Luís XIV, o Rei Sol


Com a morte de Mazzarino em 1661, Luís XIV passa a governar sozinho, pois assumiu que " L'Etat c'ést moi", isto é, o Estado sou eu, encarnando a figura central do poder e tornava-se um soberano absoluto com a submissão da nobreza e da burguesia, conhecido como o Rei Sol e exercia o governo a partir de um conselho de ministros e sua autoridade era incontestável, sustentada pela teoria do direito divino dos reis de Jacques Bossuet.
Uma das principais obras de Luís XIV foi a construção do Palácio de Versalhes, centro do poder e morada real que contava com o séquito de mais de 10.000 pessoas entre cortesãos, criados, soldados e consumia aproximadamente 8% da renda do Estado francês.
Apesar de representar o apogeu do absolutismo na França, o reinado de Luís XIV também foi o início da decadência devido aos gastos vultuosos com a corte e com as guerras no exterior.


ABSOLUTISMO NA INGLATERRA
           
Pela Magna Carta (1215) imposta pela nobreza ao rei João Sem-Terra, o monarca da Inglaterra ficava proibido de criar novos impostos e de administrar a justiça, que passavam a ser prerrogativas exclusivas do Parlamento, composto por nobres, burgueses e clero.

Significa dizer que, na Inglaterra, o estabelecimento de um poder verdadeiramente centralizado sempre enfrentou duríssimos obstáculos. Com as mãos atadas, os reis ingleses foram obrigados a lançar mão de uma série de recursos para ampliar seu poder, sendo o principal deles a perseguição religiosa deflagrada por Henrique VIII (1509-1547) contra os puritanos (calvinistas), que lideravam o Parlamento, e contra a Igreja Católica, grande proprietária de terras no país. Aliás, foram exatamente os monarcas da dinastia Tudor os responsáveis pela instalação do absolutismo entre os ingleses.
Eduardo VI, filho e sucessor de Henrique VIII, reinou por pouco tempo (1547-1553), o que praticamente não afetou a reforma religiosa inglesa. Mas a sucessora de Eduardo VI, a católica Maria I, fora educada sob o rígido catolicismo da Espanha e restabeleceu essa religião na Inglaterra, perseguindo ferozmente os protestantes, o que lhe valeu a alcunha de “Maria Sanguinária”.

Maria I (Bloody Mary)

Elizabeth I



Elizabeth I (1588-1603), filha do segundo casamento de Henrique VIII, continuou a obra do pai, perseguindo católicos e calvinistas que se opusessem a ela e ao seu poder. Construiu uma frota para aumentar o poderio inglês no mar e incentivou a pirataria, o que lhe garantiu renda para o financiamento da industrialização da Inglaterra. Foi durante seu governo que teve início o processo efetivo de colonização da América do Norte. Quando já tinha o respeito dos políticos e demonstrava dominar a arte da política, o Parlamento passou a ser convocado raramente e chegou perto de ser extinto.

REVOLUÇÕES INGLESAS DO SÉCULO XVII

Com a morte de Elizabeth I, seu primo Jaime Stuart assumiu o trono. Jaime I, que era escocês e católico, uniu o trono da Escócia ao da Inglaterra e tentou impor-se como rei absoluto, provocando sucessivos choques com o Parlamento.

Carlos I (1625-1649), filho e sucessor de Jaime, prosseguiu a política centralizadora de seu pai, tentando recriar antigos impostos (ship-money). O Parlamento exigiu do rei o juramento da Petição de Direitos, sob pena de não mais votarem a aprovação de novos impostos. O rei aceitou a exigência e jurou a petição, mas tão logo os novos impostos foram votados e aprovados, o monarca dissolveu o Parlamento, enganando os deputados.

Carlos I


O rei Carlos havia declarado guerra aos presbiterianos (calvinistas) escoceses, pois estava determinado a impor o anglicanismo na Escócia. Frustrado em duas tentativas, Carlos I foi obrigado a convocar o Parlamento para conseguir verbas para a guerra. Os parlamentares, liderados por Oliver Cromwell, recusaram-se a aprovar novos impostos e acusaram os conselheiros do rei de alta traição. Em 1641, a Irlanda católica revoltou-se contra a Inglaterra e o rei solicitou verbas para reprimir os irlandeses. Diante da negativa do parlamentares, o monarca invadiu o Parlamento e tentou prender seus líderes.

Como resultado, iniciou-se uma guerra civil, a Revolução Puritana (1642-1649), que opôs os Cavaleiros (partidários do rei) e os cabeças-redondas (partidários do Parlamento). Com a vitória das forças parlamentares, o rei fugiu para a Escócia, onde foi aprisionado pelos presbiterianos e vendido ao parlamento inglês. Carlos I foi julgado por traição e executado em 30 de janeiro de 1649. Foi, então, proclamada a república, chamada de Commonwealth, e Oliver Cromwell assumiu o poder com o título de "Lorde Protetor da Inglaterra".

Durante seu governo, Cromwell lutou contra a Irlanda e a Escócia, além das perseguições internas. No caso irlandês, ordenou um massacre de católicos, confiscou as terras destes e entregou-as aos protestantes. Fez tudo isso acreditando que estaria “evitando novos derramamentos de sangue no futuro”. Entretanto, a chamada Questão da Irlanda, isto é, a oposição entre católicos e protestantes, é um dos principais problemas políticos que o governo inglês enfrenta até os dias de hoje.

Sem dúvida, o fato mais marcante de seu governo foi a aprovação dos Atos de Navegação. Baixados por Cromwell em 1651, tais atos proibiam a participação de navios de estrangeiros como intermediários no comércio com a Inglaterra. A Holanda era responsável pela maior parte dos transportes marítimos na Europa e foi diretamente atingida pela medida. Para se ter um exemplo, Portugal utilizava navios construídos na Holanda, mas que eram considerados "estrangeiros" pela Inglaterra. Esse fato obrigou Portugal a utilizar exclusivamente navios ingleses no comércio entre os dois países.

Oliver Cromwell


A guerra entre a Holanda e a Inglaterra durou três anos, ao fim dos quais a Holanda aceitou os Atos de Navegação, que permitiram a supremacia inglesa nos mares. A morte de Oliver Cromwell em 1659 foi recebida com alívio por toda a Inglaterra. Seu filho Ricardo não conseguiu manter o poder e foi obrigado a renunciar seis meses depois.
O Parlamento convidou Carlos II, filho herdeiro de Carlos I, a assumir o trono, o que ocorreu em 29 de agosto de 1660, pondo fim à Republica Inglesa. Em 1679, o Parlamento votou e aprovou o Ato de Exclusão, pelo qual os católicos ficavam proibidos de ocupar cargos públicos e de usar o Habeas Corpus, medida jurídica que garante ao indivíduo proteção legal contra as detenções arbitrárias. O rei reelaborou as leis de navegação e da frota inglesa, aumentando os rendimentos da Coroa, e não mais convocou o Parlamento de 1682 a 1685.

Em 1685, Jaime II assumiu o trono, após a morte do monarca, que era seu irmão. Educado na França, o novo rei tentou reintroduzir o catolicismo no país, mas sua atitude não preocupou o Parlamento, devido à sua idade avançada e pelo fato de suas duas filhas estarem casadas com nobres protestantes. Mas, quando a segunda esposa do rei lhe deu um filho do sexo masculino (que excluiria suas irmãs da sucessão ao trono), batizado segundo o ritual católico, os parlamentares ficaram inquietos e procuraram Guilherme de Orange (Stathouder (governante) da Holanda, protestante e marido da filha mais velha de Jaime II) e pediram que ele invadisse a Inglaterra para defender o protestantismo.

Guilherme III


Guilherme de Orange assumiu o poder na Inglaterra em 1688, enquanto seu sogro fugia do país. A transição sem derramamento de sangue ficou conhecida como Revolução Gloriosa. O Parlamento obrigou Guilherme III a assinar a Declaração de Direitos (Bill of Rights), na qual se comprometia a dar tratamento preferencial à Inglaterra e exercer o poder executivo, deixando o legislativo e a criação de impostos para o Parlamento. Nascia o parlamentarismo na Inglaterra.
Esse fato afirmava o poder da burguesia inglesa sobre o rei, criando as condições necessárias para a Revolução Industrial. Em 1714, Jorge I herdou o trono inglês, iniciando uma nova dinastia, a dos Hannover – a mesma até os dias de hoje, tendo no entanto, o nome Windsor, adotado durante a Primeira Guerra Mundial em 1917.

CAPITALISMO

O mercantilismo foi o conjunto de práticas econômicas dos Estados absolutistas. Os reis absolutos acreditavam que o sucesso financeiro da burguesia nacional traria lucros e vantagens para toda a nação. Dessa forma, o lucro da burguesia passou a ser um negócio de Estado, mobilizando todas as forças (frequentemente a militar) de um país.
As origens do capitalismo mercantil remontam à formação do Estado Moderno e ao desenvolvimento da revolução comercial. Os pequenos mercados locais da época medieval deram lugar a um amplo mercado nacional, formado pela população e pelo território administrado pela monarquia centralizada.

Com as navegações, o mercado nacional deu lugar ao mercado mundial e, com o fluxo de metais preciosos da América e de especiarias do Oriente, o comércio europeu foi impulsionado como jamais havia ocorrido em qualquer período anterior.
Entre as práticas realizadas, destacamos:
  • metalismo – crença de que a riqueza de um país poderia ser avaliada pelas reservas de ouro e prata entesouradas;
  • colonialismo - a medida de riqueza de um país seria dada pela quantidade de colônias produtoras de especiarias e de metais preciosos;
  • protecionismo - o Estado deveria proteger suas manufaturas, taxando pesadamente os artigos importados, pois as manufaturas nacionais (quando prósperas) pagavam impostos ao Estado;
  • balança comercial favorável – o predomínio das exportações sobre as importações garantiria o ingresso de moeda no país. Esse objetivo seria atingido através de equilíbrio entre as demais práticas, acrescentando-se o pacto colonial.
O absolutismo e o mercantilismo constituíam, pois, a dupla face do Antigo Regime. Nesse sistema econômico, o Estado exercia um rígido controle sobre todas as atividades produtivas, cujo objetivo era aumentar a produção de mercadorias, regulamentar os diversos tipos de artigos produzidos e estabelecer um sistema de tarifas alfandegárias para proteger o mercado nacional. Era uma forma de nacionalismo na economia, baseado no intervencionismo estatal, no dirigismo econômico e no protecionismo alfandegário.


O nascimento da "Política Moderna"

(...) Nasce daí esta questão debatida: se será melhor ser amado que temido ou vice-versa. Responderá que se desejaria ser uma e outra coisa; mas como é difícil reunir ao mesmo tempo as qualidades que dão aqueles resultados, é muito mais seguro ser temido que amado, quando se tenha que falhar numa das duas. É que os homens geralmente são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ambiciosos de dinheiro, e, enquanto lhes fizerem bem, todos estão contigo, oferecem-te sangue, bens, vida, filhos, como disse acima, desde que a necessidade esteja longe de ti. Mas, quando ela se avizinha, voltam-se para outra parte. E o príncipe, se confiou plenamente em palavras e não tomou outras precauções, está arruinado. Pois as amizades conquistadas por interesse, e não por grandeza e nobreza de caráter, são compradas, mas não se pode contar com elas no momento necessário. E os homens hesitam menos em ofender aos que se fazem amar do que aos que se fazem temer, porque o amor é mantido por um vínculo de obrigação, o qual devido a serem os homens pérfidos é rompido sempre que lhes aprouver, ao passo que o temor que se infunde é alimentado pelo receio de castigo, que é um sentimento que não se abandona nunca. Deve portanto o príncipe fazer-se temer de maneira que, se não se fizer amado, pelo menos evite o ódio, pois é fácil ser ao mesmo tempo temido e não odiado, o que sucederá uma vez que se abstenha de se apoderar dos bens e das mulheres de seus cidadãos e dos seus súditos, e, mesmo sendo obrigado a derramar o sangue de alguém, só poderá fazê-lo quando houver uma justificativa convincente e causa manifesta. Deve, sobretudo, abster-se de aproveitar dos bens dos outros, porque os homens esquecem mais depressa a morte do pai do que a perda de seu patrimônio. Além disso, não faltam ocasiões para pilhar o que é dos outros, e aquele que começa a viver de rapinagem, sempre as encontra, o que não sucede quanto às ocasiões de derramar sangue.

Nicolau Maquiavel. O Príncipe. Cap. XVII. Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1978.


A manifestação do Absolutismo

 É exclusivamente na minha pessoa que reside o poder soberano (...) É só de mim que os meus tribunais recebem a sua existência e a sua autoridade; a plenitude dessa autoridade, que eles não exercem senão em meu nome, permanece sempre em mim, e o seu uso não pode nunca ser voltado contra mim; é a mim unicamente que pertence o poder legislativo sem dependência ou partilha (...) A ordem pública inteira emana de mim, e os direitos e interesses da Nação, de que se ousa fazer um corpo separado do Monarca estão necessariamente unidos com os meus e repousam unicamente em minhas mãos.

Fala de Luís XV ao Parlamento francês em 1766



domingo, 23 de agosto de 2015

II Reinado (1840-1889) - Parte II

POLÍTICA EXTERNA

No plano externo, a política externa do II Reinado foi bastante tumultuada, envolvendo incidentes diplomáticos, questões de limites e até mesmo três guerras. Pode-se até dizer que, em certa medida, o Brasil adotou uma prática intervencionista perante seus vizinhos do Prata, fato que se assemelhava às estratégias das potências imperialistas que caracterizaram o século XIX e XX.
           
As relações entre Brasil e Inglaterra deterioravam-se rapidamente. Em 1842, a Rainha Vitória recusou-se a aceitar a Grã-Cruz do Cruzeiro do Sul, maior condecoração brasileira, oferecida pelo Imperador Dom Pedro II, piorando ainda mais as relações entre os dois países.
Em 1844, o Ministro da Fazenda, Manuel Alves Branco, tentou corrigir décadas de defasagem na política aduaneira, elevando as tarifas alfandegárias dos produtos ingleses em até 30 % para mercadorias sem similares nacionais e 60% em caso contrário, revogando, assim, a condição de nação mais favorecida que a Inglaterra desfrutava desde 1810.

Por outro lado, a Inglaterra, em plena Revolução Industrial, pressionava todas as nações do mundo para que abolissem o tráfico de escravos. No Brasil, a pressão inglesa chocava-se com os interesses dos grandes proprietários escravocratas e dos comerciantes de escravos, que possuíam representação no governo e no Legislativo e, dessa forma, fizeram valer seu poder, e, por um bom tempo, as pressões inglesas foram ignoradas, mas os ingleses dispunham de um poder militar muito maior e através das armas defenderam o “Bill Aberdeen”, um ato aprovado pelo Parlamento Britânico em 1847, influenciado pelo ministro das Relações Exteriores Lord Aberdeen, que dava o direito da marinha britânica atacar e apreender navios negreiros, bem como aprisionar a tripulação, julgar os envolvidos em tribunais britânicos.

As Tarifas Alves Branco, como ficaram conhecidas, provocaram uma tímida tentativa de industrialização por parte da burguesia brasileira, além de um vigoroso protesto por parte dos ingleses, uma vez que seus produtos haviam encarecido bastante para os brasileiros. Embora a nova política protecionista não formasse uma barreira intransponível nem estimulasse decisivamente o mercado interno, foi um importante passo nesse sentido, sem dúvida.
Esses protestos dos ingleses acabaram se traduzindo em ameaças e, por fim, no rompimento das relações diplomáticas entre os dois países. É importante ressaltar que a situação se agravou devido à inabilidade do embaixador inglês no Brasil, William Dougall Christie.

D. Pedro II. João Maximiano Mafra, c. 1851, Museu do estado de Pernambuco, Recife.


QUESTÃO CHRISTIE 

Em 1861, o navio inglês Príncipe de Gales naufragou no litoral do Rio Grande do Sul e teve sua carga saqueada pela população local. O embaixador britânico no Brasil classificou tal ato como pirataria e exigiu que o governo brasileiro indenizasse a Inglaterra em 3.200 libras esterlinas por toda a carga. No ano seguinte, enquanto ainda não havia sido tomada uma decisão em relação à indenização pedida por Christie, alguns oficiais e marinheiros de um navio de guerra inglês, trajando roupas civis, embebedaram-se no Rio de Janeiro e provocaram arruaças na cidade. Presos pela polícia local, negaram-se a se identificar e passaram a noite presos. No dia seguinte, com os ânimos serenados, os marinheiros se identificaram e foram soltos.
O fato serviu de pretexto para que o embaixador Christie exigisse desculpas oficiais do governo brasileiro e pressionasse para que os policiais envolvidos na prisão dos marinheiros fossem demitidos, retomando a polêmica do "Príncipe de Gales". Diante de nova negativa do governo brasileiro, o embaixador foi instruído a apresar navios brasileiros na Baía da Guanabara e levá-los para a ilha de Palmas, no Atlântico Sul.

A questão foi submetida a arbitramento internacional, sendo convidado como árbitro o rei Leopoldo I, da Bélgica. Tentando resolver a questão amistosamente, ou temendo um resultado desfavorável, Dom Pedro II antecipou-se e pagou a indenização aos ingleses. No entanto, o rei belga acabou dando ganho de causa ao Brasil em 1863. O País, então, passou da defensiva à ofensiva no campo diplomático, exigindo desculpas formais do governo inglês. Já se sabia que a Inglaterra não iria se desculpar e, devido a isso, o embaixador brasileiro deixou Londres em 1863 e, logo a seguir, o embaixador britânico partiu do Rio de Janeiro de volta à Inglaterra. As relações diplomáticas somente foram reatadas em 1865, devido ao interesse inglês na guerra que se iniciava contra o Paraguai.

QUESTÕES PLATINAS

O Uruguai já despertava o interesse do Brasil desde os tempos da colonização, quando a região foi incorporada à colônia com o nome de Província Cisplatina. Em 1825, durante o Primeiro Reinado, um movimento popular apoiado pela Argentina tentou anexar a região àquele país, provocando violentos choques com o governo de D. Pedro I. A questão somente foi resolvida em 1828, com um acordo assinado por Brasil e Argentina, no qual os dois países concordavam com a independência da região sob o nome de República Oriental do Uruguai. Porém, as pretensões do Brasil e da Argentina não cessaram.

Na Argentina, no Uruguai , os partidos Blanco (unitarista) e Colorado (federalista) disputavam o poder. Essa "unidade ideológica", que não respeitava fronteiras, provocava fatalmente o envolvimento de todas as partes em cada revolta ocorrida na região.
Quanto a Dom Pedro II, sempre houve a preocupação de impedir o aparecimento de um país forte na região platina ou de que ocorresse uma união territorial entre argentinos, uruguaios e paraguaios, uma vez que os brasileiros esforçavam-se para estabelecer a livre navegação nos rios platinos, únicas vias regulares de acesso à parte centro-oeste do território do Brasil.
Em 1828, foram realizadas eleições presidenciais no Uruguai, opondo os latifundiários, unidos em torno do blanco Manuel Oribe, que, inclusive, tinha o apoio do argentino Juan Manuel Rosas, contra o colorado Frutuoso Rivera, que representava os comerciantes da região e tinha o apoio explícito do governo imperial brasileiro e do líder político argentino, José Urquiza, que, como governador da província de Corrientes, era o principal opositor de Rosas na Argentina. A vitória coube ao candidato colorado.

Os blancos acusaram os colorados de fraude e pediram ajuda aos blancos dos países vizinhos. Em 1834, depois de vencer as eleições e tornar-se o novo presidente, Oribe aproximou-se de Rosas, provocando a fuga de seu predecessor, Rivera, que se refugiou no Rio Grande do Sul aliando-se ao líder farroupilha, Bento Gonçalves.
Rivera organizou um exército e tomou o poder no Uruguai, aproveitando-se dos problemas enfrentados por Rosas na Argentina. Alguns fazendeiros brasileiros realizaram incursões no Uruguai para garantir suas propriedades, pois estas eram frequentemente invadidas e saqueadas pelas facções em luta dos vizinhos. Em 1839, Rosas conseguiu resolver seus problemas internos na Argentina e anexou o Uruguai, o que causou protestos da Inglaterra, da França e do Brasil. Os ataques às propriedades de brasileiros continuaram de ambos os lados da fronteira, provocando a entrada do Brasil na guerra.

O General Urquiza, comandante das províncias argentinas de Corrientes e Entre-Rios, revoltou-se contra Rosas e aliou-se ao Brasil e ao uruguaio Rivera. As forças brasileiras, comandadas pelo Duque de Caxias e apoiadas pelo bloqueio naval do almirante Grenfelld, tomaram Montevidéu e, a seguir, invadiram a Argentina, depondo Rosas.
Argentina e Uruguai celebraram com o Brasil um tratado de livre comércio e navegação no Rio da Prata, garantindo aos brasileiros o vital acesso à província do Mato Grosso, bem como a “permissão” para comandar os acontecimentos na desembocadura do Rio da Prata.

As lutas entre blancos e colorados prosseguiam no Uruguai a cada eleição e, em 1864, o colorado Venâncio Flores tentou tomar o poder de Atanásio Aguirre, através da luta armada. O Brasil apresentou um protesto junto ao governo do Uruguai, devido aos constantes ataques às propriedades de brasileiros, mas foi ignorado pelo presidente Aguirre. O País decidiu, então, intervir novamente no Uruguai, enviando a Montevidéu um exército comandado por Caxias, enquanto a marinha bloqueava o litoral uruguaio. O presidente Aguirre renunciou e fugiu para o Paraguai, onde pediu auxílio ao ditador Francisco Solano Lopez. Enquanto isso, Flores, o novo presidente do Uruguai, cedia às exigências brasileiras.

A GUERRA DO PARAGUAI (1864-70)

O Paraguai foi, desde sua emancipação em 1810, uma exceção na região. A independência do país não foi obra da elite criolla, como no resto da América espanhola, mas, sim, fruto da união entre os índios guaranis e uma camada militarizada nacionalista, que implantou no Paraguai um modelo de desenvolvimento ligado à realidade local. Durante os longos governos de José Domingos Francia (1811-1840) e Carlos Antônio Lopez (1840-1862), as grandes propriedades foram confiscadas e transformadas em Estâncias da Pátria, que abasteciam o consumo nacional de produtos agrícolas.

Nesse período, o Paraguai não pode ser visto como uma democracia. Mas a escravidão foi abolida, o analfabetismo acabou erradicado, fábricas de armas e de pólvora foram implantadas, assim como indústrias siderúrgicas, estradas de ferro, telégrafo e estaleiro. Tal quadro de relativo sucesso econômico e social e de autonomia internacional foi acompanhado durante o governo de Francisco Solano Lopez, iniciado em 1862, de uma política de ênfase no setor militar.
A intervenção brasileira no Uruguai e o pedido de auxílio formulado por Aguirre ao Paraguai forneceram o pretexto que desencadeou a maior guerra de toda a América Latina. Em 11 de novembro de 1864, Lopez apreendeu o navio brasileiro Marques de Olinda, que navegava no Rio Paraguai, provocando a declaração de guerra por parte do Brasil.
Os paraguaios tentaram tomar a província do Mato Grosso, mas foram repelidos pelas forças brasileiras. Optaram, então, pela libertação do Uruguai, mas, para isso, foi necessário invadir parte do território da Argentina, o que provocou a entrada do país na guerra.



Em maio de 1865, Brasil, Argentina e Uruguai formaram a Tríplice Aliança, que entregava o comando do bloco belicista ao presidente da Argentina. Os aliados puderam contar ainda com empréstimos e equipamentos vindos da Inglaterra, uma vez que a esta interessava a destruição do Paraguai. As operações navais, sob o comando do Almirante Tamandaré, foram inteiramente favoráveis ao Brasil, enquanto as operações em terra beneficiaram os paraguaios. O Brasil foi obrigado a financiar um exército profissional recrutado pelo Uruguai e também a recrutar negros que seriam alforriados após o conflito. Tal contingente ficou conhecido como os “Voluntários da Pátria”.

De 1866 a 1869, o comando do exército brasileiro foi entregue ao Duque de Caxias, que conseguiu expressivas vitórias sobre a força paraguaia, obrigando Lopez a refugiar-se no norte do país. O comando passou, então, a Louis Phillipe Gaston d’ Orleans, o Conde d'Eu, genro do Imperador, que comandou verdadeiros massacres junto à população paraguaia enquanto perseguia Solano Lopez, que fora morto em 1º de março de 1870 por soldados brasileiros depois da batalha de Cerro Cora.
As consequências da Guerra do Paraguai foram catastróficas para todos os envolvidos. O Paraguai perdeu cerca de 70 % de sua população masculina, segundo as estatísticas mais confiáveis, metade da população paraguaia foi dizimada: de 406.000 habitantes em 1864 para 231.000 em 1872.Apesar da vitória militar, Brasil, Argentina e Uruguai aumentaram seu endividamento em relação à Inglaterra , que foi, em última análise, beneficiada indiretamente com o conflito.

crítica à violência promovida na Guerra do Paraguai


Em pesquisas mais recentes(ver o livro "Maldita Guerra" do Prof. Dr. Francisco Doratioto, da Universidade de Brasília), a Guerra do Paraguai não é mais entendida como uma ação “maquiavélica” da Grã-Bretanha que estava tendo seus interesses ameaçados pela potência em ascensão que seria o Paraguai, pois o conflito foi muito mais uma disputa pelo controle e acesso da bacia Platina, que naquele contexto, era o elo de integração das regiões litorâneas com a região central do continente e nesse caso, a livre-navegação pelos rios da Bacia do Prata era uma questão de Estado para as nações da região.


ECONOMIA E IMIGRAÇÃO

A economia brasileira, desde o período colonial, foi marcada pela tríade monocultura, escravismo e produção para a exportação. O mercado consumidor do País estava além-mar e a produção local era definida segundo os interesses da metrópole portuguesa. Quando o Brasil tornou-se independente, tal tríade foi mantida e, até a primeira metade do século XIX, a cana-de-açúcar continuava a ser o carro-chefe das exportações.
Entretanto, outro produto começou a fazer parte do conjunto de artigos exportáveis do Brasil, para juntar-se à já citada cana, ao algodão, ao fumo e às drogas do sertão. Tratava-se do café.
Essa planta, de origem africana, chegou ao Brasil ainda na primeira metade do século XVIII, mas sua utilização comercial só começou por volta de 1830, na região da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro. O destino da produção era a Europa, especialmente a França.
O café ganhou espaço na região Sudeste, avançando para a Zona da Mata Mineira e para o Vale do Paraíba. Algumas cidades desenvolveram-se nas redondezas em função dessas plantações, mas, na medida em que o café dirigia-se para o Oeste, tais localidades perdiam a função, sendo que algumas delas, se transformaram em cidades “mortas” ou “fantasmas”. Em toda essa área, os trabalhadores eram predominantemente escravos negros.

O café chegou à Província de São Paulo na segunda metade do século XIX e avançou rapidamente para a parte oeste. Isso aconteceu porque o solo (terra roxa) e o clima da região favoreciam a cultura cafeeira, além de haver o próprio interesse do governo em ocupar a região. O problema é que a expansão do café em terras paulistas coincidiu com o aumento das pressões inglesas pela extinção do trabalho compulsório em terras americanas, o que provocou a aprovação do polêmico Bill Aberdeen, que dava aos britânicos o “direito” de aprisionar navios negreiros que se direcionavam para este continente.
O café precisava de mais braços, mas o País ainda se agarrava ao anacrônico e decadente sistema escravista. A solução adotada provisoriamente foi a transferência de trabalhadores negros de fazendas canavieiras nordestinas em crise. Mas esse tráfico interno de escravos não era eficiente, pois ainda mantinha alto o preço da mão-de-obra. Finalmente, o governo resolveu atender às sugestões de fazendeiros paulistas, em especial do senador Nicolau Pereira Campos Vergueiro, e passou a incentivar a vinda de trabalhadores europeus para o Brasil. Em 1846, chegavam da Alemanha e da Suíça mais de 350 famílias de imigrantes para trabalhar nas fazendas do senador, especialmente a de Ibicaba, próxima da cidade de Limeira, no interior de São Paulo.

A primeira experiência concreta de trabalho europeu e assalariado em fazendas brasileiras recebeu o nome de sistema de parceria, e tinha regras muito simples. Os trabalhadores deveriam dividir a produção com o fazendeiro e seriam responsáveis pelo seu próprio sustento. Caso juntassem dinheiro suficiente, poderiam comprara sua própria terra. Era com essa proposta que alguns homens, chamados arregimentadores, desembarcavam na Europa, alardeando o fácil enriquecimento aos desiludidos do Velho Mundo, fossem eles agricultores ou operários desempregados.
Chegando ao Brasil, esses homens e mulheres percebiam o quanto haviam sido enganados. O regime de trabalho nas fazendas era muito semelhante à servidão medieval. Os colonos, italianos, portugueses, espanhóis, suíços, alemães, entre outros, endividavam-se com os fazendeiros e não poderiam sair enquanto não saldassem as dívidas. Suas correspondências eram censuradas, caso relatassem a exploração e, não raro, eram castigados nos mesmos moldes dos escravos negros.

Em 1857, explodiu uma revolta de imigrantes contra o Senador Vergueiro: a revolta dos Parceiros. A situação tornou-se tão dramática que o governo imperial alemão chegou a proibir a emigração para o Brasil.
Tentando reverter a situação, o governo brasileiro suspendeu o sistema de parceria, que foi substituído pela imigração subvencionada, na qual se assinava um contrato com o imigrante - este receberia ajuda de custo do governo imperial para a sua viagem e assinaria um contrato de trabalho, que permitia a ele e seus familiares mudarem-se do trabalho ao final do prazo acordado. Mas isso não impediu que histórias de exploração dos trabalhadores continuassem a acontecer

O Brasil passou a receber novas levas de imigrantes. Desta vez, predominavam italianos, espanhóis e portugueses. Os primeiros eram majoritários, principalmente por causa das guerras pela unificação de seu país. Para cá, vieram desde fugitivos do conflito até aqueles que, por defenderem ideais políticos liberais ou anarquistas, eram perseguidos em seus países.
Com a chegada de mais europeus, cresceu a disputa pela terra. Isso precipitou a aprovação da Lei de Terras (1850), pela qual foi criada uma série de impedimentos para o acesso dos imigrantes à propriedade de uma fazenda. A nova lei extinguia definitivamente o antigo modelo colonial de sesmarias, isto é, doação de terras, estabelecendo que, a partir daquela data, a terra pública só poderia ser comprada.

Com essa lei, os grandes proprietários procuraram dificultar o acesso à terra por parte das pessoas de poucos recursos, pois, se a terra fosse facilmente adquirida por qualquer um, os fazendeiros ficariam sem mão-de-obra disponível.
Os imigrantes, geralmente pobres, chegavam ao Brasil na vigência dessa lei e iam trabalhar nos cafezais. Nascia um novo regime de trabalho, chamado colonato, segundo o qual cada família de imigrantes, agora colonos, recebia um pagamento proporcional aos pés de café entregues para serem cuidados por ela. Na época da colheita, os colonos eram remunerados com uma espécie de gratificação, de acordo com a quantidade de café colhido.

É importante ressaltar que, no colonato, havia a permissão para que os colonos cultivassem produtos para subsistência nos intervalos dos cafezais, dos quais tinham o direito de dispor livremente, inclusive vendendo o excedente. Mais ao Sul, imigrantes organizavam-se em pequenas propriedades, produzindo para o mercado interno. Também havia cidades que, fundadas por empresas estrangeiras, atraíam trabalhadores imigrantes e nacionais.
A formação da Associação Auxiliadora da Colonização sistematizou a vinda de imigrantes, providenciando alojamento, alimentação etc. A partir daí, a imigração cresceu rapidamente no Brasil e nova levas trouxeram outros tipos estrangeiros. Ainda chegavam italianos, mas, agora, acompanhados de povos eslavos e de mais alemães. No final do século XIX e início do XX, até japoneses passaram a tentar a sorte no Brasil.



Com o desenvolvimento da cafeicultura, um novo equilíbrio econômico foi estabelecido. Desde 1860, os superávits tornaram-se constantes nas relações comerciais com o exterior, ajustando novamente a economia brasileira ao mercado internacional. Assim, em contraste com o período anterior da Regência, bastante conturbado, teve início no Brasil uma nova era de relativa prosperidade. A reunião de fatores favoráveis, como as tarifas Alves Branco, a abolição do tráfico negreiro em 1850 e a ascensão do café, estimularam uma onda de novos empreendimentos.
Nesse surto de empreendimentos, destacou-se, quase como um símbolo desse tempo, Irineu Evangelista de Sousa (imagem ao lado), mais conhecido como Barão de Mauá, um ousado empresário que investiu nos mais variados setores da economia. Os sucesso inicial de suas empresas estimulou o surgimento de outras e atraiu o capital privado inglês.



Em 1845, Mauá adquiriu o Estaleiro Ponta de Areia, no Rio de Janeiro, produzindo vários barcos a vapor. Ali, também criou uma fundição e, posteriormente, passou a investir no setor de transportes, criando a Companhia de Rebocadores para o Rio Grande do Sul e incentivando a construção da primeira ferrovia do Brasil.
No campo das comunicações, empreendeu a montagem de um cabo telegráfico submarino, ligando o Brasil à Europa. Fundou também o Banco Mauá, que chegou a ter filiais na Inglaterra, nos Estados Unidos, na França, no Uruguai, na Argentina e nas principais cidades brasileiras. Também deu atenção ao setor público urbano, implantando iluminação a gás e abastecimento de água na capital do País.


Em 1860, devido às pressões do comércio importador, geralmente dominado por ingleses, a tarifa Alves Branco foi substituída pela tarifa Silva Ferraz. A partir de então, foram reduzidas as taxas de importação para máquinas, ferragens e armas, o que representou um dos primeiros golpes para Mauá, especialmente para a fundição. Outro fator que contribuiu para a derrocada do Barão foi o antagonismo entre seus interesses e os que envolviam o capital estrangeiro, principalmente o inglês. Irineu Evangelista não recebeu apoio das forças governamentais, que viam com antipatia suas ideias políticas liberais e abolicionistas, e foi definitivamente malvisto pelo governo assim que se manifestou contrário ao envolvimento do Brasil na Guerra do Paraguai. As tentativas empresariais de Mauá falharam e ele foi obrigado a sucumbir, vendendo suas empresas para os estrangeiros.

ALÉM DO CAFÉ



O café não foi o único produto agrícola importante no Império. O açúcar, o algodão, o cacau, o tabaco e a borracha representaram parte significativa de nossa produção agrícola. No período de 1861 a 1870, o algodão foi a segunda maior fonte de riqueza para o Brasil, pois a produção dos Estados Unidos, que era o grande produtor da época, estava seriamente comprometida devido aos desdobramentos da Guerra de Secessão.
A produção e exportação de açúcar foram diminuindo aos poucos, pois esse produto sofria a concorrência de outros no mercado internacional, como os similares produzidos na América Central e até mesmo o açúcar feito de beterraba.

O Brasil interessou-se pela exportação de borracha em meados do século XIX, quando se descobriu que, a partir do látex, era possível obter um produto mais resistente. Na década de 1860, o surto de borracha tomou conta do País, primeiro na região do Pará e, depois, no Amazonas. Com o desenvolvimento do automóvel em nível mundial, e sendo o Brasil detentor de 90% do comércio internacional da borracha, a economia da região transformou-se e Manaus viu como o dinheiro poderia fazer uma cidade no meio da floresta tropical se tornar uma das mais ricas e luxuosas do País. Houve até o interesse e a concretização da aquisição do Acre, região que pertencia à Bolívia e que atraiu a atenção dos brasileiros por ser rica em seringueiras.
A extração do látex era feita, geralmente, utilizando-se mão-de-obra de migrantes nordestinos que fugiam das secas. Na condição de seringueiro, os trabalhadores eram explorados duramente pelos donos dos seringais. Porém, os altos ganhos dos seringalistas e exportadores duraram pouco. Já no começo do século XX, os ingleses deram início ao cultivo da seringueira nas selvas da Malásia e do Ceilão (atual Sri-Lanka), ganhando o mercado internacional e levando a produção brasileira para níveis insignificantes.

O cacau teve uma trajetória semelhante. Cultivado no sul da Bahia, atendeu à demanda do mercado internacional, que cresceu no final do século XIX com a expansão das indústrias de chocolates. Também utilizava como trabalhadores os fugitivos da seca, com especial destaque para as mulheres.
O volume das exportações brasileiras era muito maior do que o das importações. Entretanto, aqui se produziam gêneros agrícolas muito baratos, ao passo que manufaturados e industrializados caros eram importados. Dessa forma, pouco se pôde aproveitar em relação aos lucros das exportações.