As Ricas Horas do Duque de Berry

As Ricas Horas do Duque de Berry
As Ricas Horas do Duque de Berry. Produção dos irmãos Limbourg - séc. XV. Mês de julho

sexta-feira, 1 de maio de 2015

1º de Maio: muita luta, suor e sangue pelo trabalhador

A posse de terras e de escravos, na Roma antiga, implicava na obtenção de renda oriunda do trabalho alheio e configurava um mecanismo para se ter tempo livre (ócio) para dedicar-se a outras atividades como a formação intelectual ou a carreira política. Dessa forma, ser ocioso na Roma antiga era bem diferente de sê-lo no contexto atual, da economia capitalista, de modo que o trabalho tinha dimensão negativa, imputando condição de inferioridade ao homem que exercia algum tipo de ofício para sobreviver.

A palavra trabalho tem sua origem em tripalium, que era um instrumento de tortura formado por traves de madeira, no qual se prendia a pessoa e a torturava. Portanto, trabalho significa dor, sofrimento, algo ruim.

Mas essa visão não surgiu em Roma, pois já se encontrava no Mundo grego. 

Nas palavras de Aristóteles(384-322 a.C.): “A perfeição do cidadão não qualifica o homem livre, mas só aquele que é isento das tarefas necessárias, das quais se incubem escravos, artesãos e outros não especializados; estes últimos não serão cidadãos, se a constituição conceder os cargos públicos à virtude e ao mérito, pois não se pode praticar a virtude levando-se uma vida de trabalhador braçal.”

A visão de Aristóteles mostra o peso negativo do trabalho e sua incompatibilidade com o exercício do poder, pois o trabalhador não seria dotado da virtude necessária à função pública, sendo incapaz de governar competentemente. 

Portanto, o ócio era uma condição superior de que apenas alguns podiam usufruir, resguardando sua honra e posição social; nesse contexto, o comércio não era visto de outro modo, sobretudo o pequeno comércio, em que o vendedor atrás do balcão comprava e revendia mercadorias, mas, por outro lado, a prosperidade no comércio possibilitava o acúmulo de riquezas e a consequente aquisição de terras e escravos, quando se alcançava uma posição honrosa.

Durante muitos séculos, a vida foi marcada por incertezas para o homem medieval, que, por sua visão de mundo, entendia a fome como um castigo: o fato de Adão e Eva terem cometido o Pecado Original condenara a humanidade a trabalhar para sobreviver, tirando seu sustento com trabalho duro e pesado, sinônimo de inferioridade e de uma infinita penitência, cumprida geração a geração, dentre aqueles que nasceram servos.

Tomando por base as ideias de Santo Agostinho, Calvino no século XVI, reafirmou a predestinação e dizia que esta se manifestava através de sinais. O trabalho árduo, a prosperidade e o enriquecimento seriam sinais da aprovação divina. A proposta calvinista teve um ajuste perfeito com o modo de vida burguês, pois o trabalho representava uma forma de ascese (elevação espiritual) e o consequente enriquecimento, uma bênção de Deus.

Max Weber, ao se debruçar sobre as relações entre a mentalidade religiosa e as práticas capitalistas, em seu A ética protestante e o espírito do capitalismo, escrito em 1904, nos diz:
"O crescente entrelaçamento nos negócios do mundo é acompanhado de perto pela crescente valorização do significado do trabalho profissional. Ao mesmo tempo, todavia, a profissão concreta do indivíduo vai sendo com isso, interpretada cada vez mais como um dom especial de Deus, e a posição que ele oferece na sociedade, como preenchimento da vontade divina."

A Revolução Industrial

As novas formas de produção introduzidas pelas novas tecnologias romperam com as formas mais tradicionais como o trabalho artesanal e a indústria doméstica – em se beneficiavam matérias-primas em casa, por empreitada e de acordo com a demanda –, e os indivíduos passaram a se deslocar para as fábricas.

O crescimento da atividade industrial induziu o deslocamento de grandes contingentes do campo para as cidades, implicando o inchaço das áreas urbanas e dificultando muito a vida nos bairros operários, com péssimas condições de saneamento e higiene. Ademais, a abundância de braços para o trabalho favorecia o achatamento dos salários e a exploração constante, com jornadas de 14 a 16 horas diárias, sem condições mínimas de segurança e com o uso de mão de obra infantil e feminina para barateamento do custo – crianças e mulheres recebiam menos que os homens, e não havia legislação que protegesse o trabalhador ou lhe garantisse os direitos mínimos.

Por outro lado, a industrialização passou também a ser vista por alguns como perigosa, e surgiram movimentos operários espontâneos em regiões da Inglaterra para destruição de máquinas – o conhecido luddismo, nome derivado do líder do movimento, Ned Ludd, a que os seguidores chamavam “General Ludd” ou “King Ludd”.

Mas os ataques às fábricas não ficaram impunes: foram intensamente reprimidos pelas autoridades, muitas vezes com a mesma violência da ação dos destruidores, que acabavam presos e, em alguns casos, mortos em conflito. Para evitar novas manifestações, a legislação foi alterada, e, a partir de 1812, o banimento dos “quebradores de máquinas” foi substituído por seu enforcamento.

Dentro do processo de resistência à industrialização, o luddismo foi uma reação a uma situação tida como “fora do natural e perigosa”, pois, substituindo o trabalho humano, as máquinas causavam desemprego, fome e miséria para muitos, em favor do enriquecimento de muitos poucos.
A lógica de articulação mudou de rumo entre 1837 e 1842, quando um movimento popular se organizou e William Lovett escreveu uma carta ao Parlamento reivindicando melhores condições de trabalho, a redução da exploração e o reconhecimento dos direitos dos trabalhadores, bem como a introdução do sufrágio universal masculino para os maiores de 21 anos. Em razão dessa carta, o movimento foi chamado cartista.

A organização dos trabalhadores se desdobrou e ramificou, sendo um exemplo disso as trade unions, que podem ser entendidas como o embrião dos sindicatos, que surgiriam mais tarde, em especial na década de 1840 na Inglaterra e depois em outros centros industriais.

No contexto da articulação do movimento operário, emerge o movimento socialista, destacando-se a publicação do Manifesto Comunista, em 1848, escrito pelos alemães Karl Marx e Friedrich Engels com o objetivo de semear entre os trabalhadores a consciência de classe, que tornaria o movimento muito mais sólido e eficiente. A frase final do Manifesto pode ser tomada como diretriz: “Proletários de todos os países, uni-vos!”

A expansão do capitalismo e as transformações que ele sofreu entre meados do século XVIII e o início do século XXI foram um processo muito claro de dominação de territórios, exploração incondicional e irresponsável de recursos naturais, além da exploração desmedida da mão de obra trabalhadora, cujo sangue derramado em manifestações, paralisações e greves é apenas um detalhe para aqueles que controlam a produção e pensam no lucro, assim como a dura realidade de cortiços, favelas e vilas operárias que, ao contrário da tecnologia, ao longo de todo esse tempo, nunca chegou a ser mais que precária.

No entanto, a luta dos trabalhadores teve que esperar muito mais tempo para que a organização sindical se consolidasse como um direito, e não como subversão ou crime, visão muito comum entre os capitalistas que esmagaram o operariado no passado e até hoje. Essa é a percepção de muitos, inclusive de trabalhadores que ainda não desenvolveram um espírito de luta por um mundo mais justo e menos explorador e por isso veem uma paralisação ou uma greve de modo superficial, como algo inconveniente, que causa transtorno e/ou prejuízo. Infelizmente, alguns se limitam a tentar a sobrevivência possível no interior da máquina do sistema capitalista e se preocupam apenas em receber sua cota de miséria sem questionar nada, sobretudo por medo da demissão, que se fará acompanhar de muitas necessidades e sofrimentos.

A Revolução Industrial ainda não se concluiu, mas hoje já se esboça uma terceira fase, em que a eletrônica é substituída pela Microeletrônica, ampliando a potência de ação dos meios de comunicação em massa, especialmente como desdobramento da tecnologia de exploração espacial – a comunicação via satélite e toda a nova concepção de relações que derivou daí. Com os chamados “super-cérebros” e o computador de grande capacidade de processamento de dados e sua adoção como padrão para vários tipos de máquina que poderiam desempenhar inúmeras funções, inclusive substituindo a mão de obra humana e assim, a robótica se colocou como a grande referência para o desenvolvimento industrial e tecnológico da segunda metade do século XX.

Entre a última década do século XX e a primeira do século XXI, vemos surgirem novos patamares de sociabilidade, por meio da rede internacional de computadores (a internet, que inicialmente interligava computadores de bases militares e depois laboratórios de universidades), que possibilita a interligação de milhões de computadores domésticos.

No final dos anos 1940, os computadores eram imensos e pesados; 40 anos mais tarde, no final dos anos 1980, passaram a serem menores, mais leves e já podiam ocupar uma pequena mesa de escritório. 

A partir do cabeamento e do desenvolvimento outros meios mais sofisticados, a ideia de mundo da informática se ressignificou: computadores pessoais(PC), portáteis (notebooks ou laptops) numa teia gigante de fios de fibra óptica, ou pela tecnologia da telefonia móvel (celular, wireless ou wi-fi), que deu mobilidade e agilidade nunca antes vista, se espalham por quase todo o planeta, criando uma dinâmica de circulação de informações, dados e imagens somente presente no mundo da ficção.
Não! Não se trata mais de ficção: como conceituou Marshall McLuhan (1911-1980), vivemos numa aldeia global, bombardeados incessantemente por milhares de informações e imagens “em tempo real”, para usar a linguagem midiática.

É tentador enaltecer os avanços tecnológicos, especialmente quando comparados com as gerações anteriores; sem ir muito longe, percebemos que nossa vida é bem diferente da de nossos pais e avós e percebemos também o quanto a inventividade humana pode resolver problemas e propor facilidades para o nosso cotidiano, dando-nos uma sensação de segurança e potência.

Mas cabe a pergunta: a que preço?

Infelizmente, o trabalho ainda continua sendo bastante difícil para milhões e nos poucos lugares que ainda há algum amparo, como por exemplo, o nosso Brasil, buscavam a revisão ou destruição de nossos direitos: falsas cooperativas, empresas terceirizadas e agora, nossos "nobilíssimos" deputados almejam a aprovação da "terceirização" sob a pretensão de alavancar o crescimento da nossa economia com mais suor e sangue do trabalhador, pagando menos e oprimindo mais.

Mesmo quando ainda buscamos defender melhores condições de trabalho, que com certeza trarão benefícios tanto para o trabalhador como para o empregador, vemos a violência e truculência patronal nos atacar, seja em 1886 em Chicago (dando à motivação para o feriado de hoje), seja nas ruas de Curitiba com sangue de professores escorrendo pelo chão depois da desmedida e brutal repressão do governador Beto Richa, para usar um exemplo recente.

A luta é grande e muito difícil, mas nem por isso, deve ser evitada !




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