Hugo Chávez
Com certeza, entre o fim do século
XX e a primeira década do século XXI, a figura do presidente da Venezuela, Hugo
Chávez (1954-2013), ganhou um espaço de significativo destaque, tanto na
América Latina quanto em escala global, pois suas decisões e ações fizeram com
que ganhasse o ódio de seus inimigos políticos, bem como a idolatria de seus
partidários.
Chávez buscou, com sua devida
autenticidade, construir um discurso anti-EUA, reafirmando a defesa dos interesses
nacionais venezuelanos, mesmo que para isso, fosse obrigado a guerrear
internamente com os segmentos da direita que sempre o entenderam como um
golpista e governante ilegítimo, que se valia de uma postura neopopulista para
conseguir o apoio das massas.
Aliás, Chávez se envolvera numa
quartelada contra o presidente Carlos Andrés Pérez em fevereiro de 1992, sendo
apoiado por um pequeno grupo dos militares que estavam associados ao
tenente-coronel Chávez. Depois de anistiado pelo sucessor de Pérez, Rafael
Caldera Rodríguez, Hugo Chávez abandonou a carreira militar para se dedicar a
vida política, cercando-se de pessoas e partidários que defendessem o
patriotismo e as tendências de esquerda.
Simon Bolívar
Nesse processo, Chávez se valeu da
figura do “Pai fundador”, Simon Bolívar (1783-1830), um líder criollo (denominação dada aos espanhóis
nascidos na América), proprietário de terras, de ideologia liberal e maçom, que
se batera com a Espanha e obtivera a vitória, graças ao apoio dado pelos
Ingleses. Chávez, tentou na medida de seu carisma e oratória, se unir a figura
de Bolívar, pondo-se como um novo “libertador” e dessa vez, contra o
imperialismo dos EUA e para tanto, seria necessário se respaldar numa doutrina:
o socialismo bolivariano.
Bolívar sempre foi um liberal e em
nenhum momento de sua vida política, flertou ou se colocou ligado ao
socialismo, doutrina que naquele momento começava a despontar na Europa, tendo
como expoentes Saint-Simon, Charles Fourier e Robert Owen, sendo que a força
maior do socialismo só viria a partir do Manifesto Comunista de 1848, escrito
Karl Marx e Friedrich Engels.
A faceta mais “internacionalista” de
Bolívar foi a defesa do federalismo para fortalecer as recém-independentes
colônias contra um possível intervencionismo externo da Europa. Uma América
unida poderia ser forte o bastante para combater uma nova invasão
recolonizadora, uma intervenção ou ingerência externa e daí, a defesa da tese
federalista ou pan-americanista. Bolívar, porém, não conseguiu ver sua tese
aceita e o continente americano se fragmentou em dezenas de nações, mais ou
menos frágeis, que conseguiram a independência política, mas não se livraram da
dependência econômica, imposta pela Grã-Bretanha no século XIX e pelos EUA no
século XX.
Chávez, por seu turno, nunca fora um
intelectual, um teórico, mas entendia a importância da demarcação de uma
posição e assim foi pontuando, pouco a pouco, as referencias de uma nova era
para a Venezuela sob seu comando: o país mudou seu nome “República Bolivariana
de Venezuela”, a nacionalização de empresas estrangeiras, o controle da
extração e refino do petróleo pela companhia estatal PDVSA. Na política
interna, modificou a Constituição, garantindo ao Executivo maior autonomia, com
mandato presidencial de 6 anos, sendo possível a candidatura para consecutivas
reeleições. Esta postura centralista, poderia tender para o autoritarismo, mas
não foi o que aparentemente ocorreu.
Mesmo assim, em virtude de tais
medidas, a oposição a Chávez o rotulou de “ditador”, apesar do personalismo que
conduzia o governo e da confortável posição que tinha pelas vitórias eleitorais
e pela maioria no Congresso venezuelano, Chávez estava respeitando ainda as
instituições democráticas. Uma outra crítica estava sobre a redução da
liberdade de imprensa na Venezuela, especialmente no episódio que envolveu a
rede de televisão RCTV e outras emissoras e jornais anti-chavistas num golpe de
Estado em 2002, contra Hugo Chávez, encabeçado pelo presidente da Federação
Venezuelana de Câmaras de Comércio, Pedro Carmona, que contou com o apoio de
uma parte dos militares. O movimento golpista foi derrotado, depois de 47 horas
de manobras, sem grandes embates ou derramamento de sangue e assim, Chávez foi
restaurado na presidência da República.
Em 2007, Hugo Chávez não autorizou a
renovação da concessão dos direitos de transmissão da emissora, a qual foi
ocupada por militares e a partir de então, foi colocada junto às emissoras
estatais.
As polêmicas de Chávez ainda se
ampliaram no campo das relações internacionais, mantendo laços com o ditador
cubano Fidel Castro, com o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, além da
aproximação com a Rússia e outros países anti-EUA. No campo da América Latina
conseguiu a aprovação do ingresso da Venezuela no Mercosul, estreitou os laços
com as lideranças de Evo Morales (Bolívia), Rafael Correa (Equador), Nestor
(2003-2007) e Cristina Kirchner (Argentina) e no caso do Brasil, a relação
muito próxima com Lula(2003-2011) e com a atual presidente Dilma Roussef.
Vale lembrar o papel que Chávez
assumiu durante as negociações para a libertação de reféns aprisionados pelas
FARC na Colômbia, durante a chamada “Operação Emmanuel” em 2009, dando
continuidade ao processo que começara em 2008, com a libertação da senadora
colombiana Ingrid Betancourt, mas nesta caso a ação fora coordenada pelo
exército da Colômbia, sendo bem sucedida, ao libertar 11 pessoas, entre elas, a
senadora Betancourt.
Sobre o papel de Chávez para a
América Latina, talvez seja ainda muito cedo para consolidar uma posição, porém
é inquestionável a guinada dada “por nosotros”
em relação aos pontos e decisões ditados por Washington, especialmente no
governo de George W. Bush (2000-2008) com a neutralização da ALCA (Aliança de
Livre Comércio das Américas) e a construção, a partir de 2008, da UNASUL (União
de Nações Sul-Americanas) e dessa forma, houve uma colaboração significativa de
Chávez para esse processo, entre outras lideranças locais.
De fala solta, improvisada,
oscilando entre o sarcasmo e a irreverência, Hugo Chávez conseguiu se
estabelecer como um protagonista, mesmo que alguns ainda apenas o vejam como um
“falastrão”. Um exemplo disso foi o caso de Juan Carlos I, Rei de Espanha, que “perdera
as estribeiras” durante a 17a Conferência Ibero-Americana, sediada
na cidade de Santiago em 2007, deixando de lado o protocolo e a cordialidade,
Sua Majestade, disparou contra Chávez: Por que não te calas?
Agora, “El Comandante” estará calado
para sempre, mas com um lugar assegurado na história política da América Latina
e talvez, numa posição de maior sucesso que seu “mentor” Bolívar, pois este
morrera vendo a desunião triunfar no continente, enquanto Chávez sai de cena,
mas com um legado de diálogo e aproximação muito intensos.
Sugestões:
Ao sul da fronteira (2009)
Direção: Oliver Stone
Duração: 78min.
A Revolução não será televisionada
(2003)
Direção: Kim Bartleyl e Donnacha
O’Brian.
Duração: 74 min.
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