quarta-feira, 19 de junho de 2013
Diretas Já, Fora Collor e as manifestações do Movimento Passe Livre
Mafalda - Quino
Estamos vivendo um momento bastante particular neste junho de 2013, porque uma questão que poderia ser isolada e acredito que foi tratada assim pelos nossos representantes do poder público (o aumento das tarifas do transporte coletivo em várias cidades do Brasil), gerou uma movimentação de tamanha magnitude que até o presente momento tem intrigado todas as esferas do poder, além da mídia e dos especialistas em "estudar a sociedade". Tudo, portanto, fica no campo das suposições.
Até mesmo aqueles que, cotidianamente em seus programas de TV, se colocam como "defensores do povo" e "sabem" o que o povo "quer" ficaram perdidos.
Veja este link: http://www.youtube.com/watch?v=7cxOK7SOI2k
Existem aqueles que parecem ser a eterna "voz da razão" e também se equivocam, veja o que disse Arnaldo Jabor: http://www.youtube.com/watch?v=afSkhqh9luU
Não existem lideranças estabelecidas, a movimentação não para de crescer e os atos de repressão pelas forças do Estado geraram mais adesão que dispersão e em diferentes partes do país e ainda, com ecos no exterior (Lisboa, Barcelona, Londres, Dublin e Berlin), manifestantes foram saindo às ruas com diferentes bandeiras, reivindicações. Nesta segunda (17/06) tivemos 250 mil brasileiros nas ruas, sendo 65 mil em São Paulo.
Casas do Parlamento - Londres (18/06) Portal UOL
Obviamente, num processo amorfo como este e aliás, bastante dinâmico, muitos "oportunistas" apareceram para realizar depredações e saques. Em São Paulo, uma vez que desde a segunda-feira, as forças de segurança tinham se comprometido a "acompanhar o movimento" e não reprimi-lo, tal postura fez que pessoas interessadas em "lucrar pessoalmente" com a agitação tivessem condições para atacar lojas, bancos e outros estabelecimentos comerciais, além de importantes patrimônios históricos, como o centenário Teatro Municipal de São Paulo, que foi restaurado em 2012 e teve sua fachada pichada. 56 pessoas foram detidas, além daqueles que estavam praticando danos a outros espaços e bem, como carros particulares, da imprensa (TV Record).
É legítimo que, numa sociedade democrática, o espaço público seja ocupado pelo mesmo e assim, as reivindicações sejam externadas, preferencialmente, sem danos ao bem e patrimônio deste mesmo público.
Por exemplo, a depredação do trem da CPTM ontem (18/06) da Linha Esmeralda foi totalmente prejudicial ao usuário, pois afetou as demais linhas e interrompeu o funcionamento 09 (Esmeralda): pessoas tiveram que sair dos vagões, andar até a estação pela via férrea, fora a lentidão, é um trem a menos para os 1,5 milhão de usuários usarem. Depredar um trem, um vagão do metrô ou um ônibus não é punição ao poder público e assim, ao próprio usuário que, aliás, constitui o dito "poder público".
No entanto, se hoje estamos assistindo este processo, temos que lembrar historicamente que nem sempre estas manifestações foram possíveis, especialmente nos períodos de autoritarismo que tivemos no Brasil, mas mesmo assim, a multidão sempre tentou se mover, apesar de castigada e combatida, com bombas, balas de verdade, cavalaria e muita violência.
Há 29 anos, o Brasil assistiu o clamor pela realização de eleições diretas para a presidência, fato que encerraria o Regime Militar implantado em 1964 por um golpe de Estado que contou com o apoio de uma parcela da sociedade civil, porém, em 1984, a presença imposta dos militares no poder já estava mais que inaceitável e a erupção de um clamor popular, reunindo milhares de pessoas em diferentes partes do Brasil, com a participação de todas as correntes da oposição, buscava um novo Brasil: livre e democrático.
Foi um movimento popular e pacífico, com a exaltação da democracia, liberdade e patriotismo, sempre concluído com o nosso Hino Nacional, cantado por centenas de milhares, num comovente e solene protesto de maior amor pela nossa Pátria. Naquela altura, o presidente João Baptista Figueiredo (1979-1985) rotulava os manifestantes como "subversivos" e as autoridades tentaram sufocar o movimento usando a polícia e suas armas.
Veja link: http://www.youtube.com/watch?v=gL4mSe4Ll_I
A Emenda Dante de Oliveira foi derrotada em 25 de abril de 1984, pois não conseguiu 2/3 dos votos(precisava de 320 dos 479 votos, mas recebeu 298), sendo que os deputados governistas buscaram evitar ao máximo sua aprovação, tentando não só conseguir mais votos para o "não", bem como que ocorressem muitas abstenções. Ficou estabelecido que a eleição seria indireta pelo Colégio Eleitoral composto pelos parlamentares. Pelo regime militar saiu candidato o ex-governador (1979-82) e ex-prefeito indicado de São Paulo, Paulo Maluf e como candidato da oposição ao regime militar, Tancredo Neves.
Tancredo venceu, mas veio a falecer em virtude problemas de saúde que já o atingiam antes da campanha eleitoral e assim, José Sarney tomou posse como Presidente da República, o primeiro civil desde a deposição de Jango em 1964.
Foi durante o governo de Sarney que se convocou a Assembleia Constituinte em 1987 e finalmente em 1988 foi promulgada a nossa atual Constituição e dali, o próximo passo seria a 1ª eleição direta para todos os cargos da República, inclusive o de presidente.
As eleições presidenciais de 1989, que começaram com a apresentação de 22 candidatos, foram realizadas sob o signo da inflação galopante e de certa desesperança da população brasileira. Fernando Collor de Melo (PRN), um político não muito conhecido nos grandes centros, mas com amplo apoio de setores políticos conservadores, do empresariado e das potências midiáticas (grupo Abril, Rede Globo, grupo Estado, entre outros), venceu Luiz Inácio Lula da Silva, da Frente Brasil Popular (liderada pelo PT), num segundo turno disputadíssimo.Collor foi o primeiro presidente eleito por voto direto depois de 29 anos, completando,assim, a transição democrática.
Após três anos de governo, começaram a explodir os escândalos sobre corrupção, como a arrecadação irregular de contribuições para a campanha eleitoral montada pelo tesoureiro Paulo César Farias, o enriquecimento ilícito e a lavagem de dinheiro, entre outros, que culminaram na formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito(CPI). A CPI, após mais de 80 dias de investigações e depoimentos, recomendou ao Congresso o impeachment do presidente.
A tensão foi crescente, pois os antigos aliados da mídia e de outros segmentos começaram a pressionar o presidente que usava ações de impacto como discursos, aparições na TV e atos pessoais para mostrar a sua inocência.
Veja o link: http://www.youtube.com/watch?v=eKky7ZpXxU4
No entanto, o resultado foi o oposto, pois a população saiu às ruas de preto, simbolizando o luto por aquele triste momento e milhares de jovens, usando preto, mas com o rosto pintado de "verde-amarelo", gritando plenamente contra Collor e daí a denominação de "geração Cara Pintada". O que Collor pensava ser uma minoria, na verdade era uma imensa maioria.
Veja este link: http://www.youtube.com/watch?v=rRscFxw_D0U
Em 29 de setembro de 1992, após votação na Câmara dos Deputados, Fernando Collor foi afastado do governo sob acusação de corrupção, entregando a faixa presidencial a seu vice, Itamar Franco. Foi o 1º processo de impeachment em condições normais(outros já haviam ocorrido, mas em situações de golpe), respeitando todo o trâmite democrático que o Brasil estava passando e de certa forma, foi um teste para a recém instaurada democracia.
Desde 1992, portanto, há 21 anos, não se via nada parecido com o que estamos vendo agora e como iniciei o texto ainda é muito cedo para tirar qualquer conclusão. Os céticos dizem que isso "não dará em nada", os otimistas buscam vislumbrar a ação de um conjunto de movimentos para um Brasil melhor, mas como isso se concluirá?
Vai depender do que acreditamos e como podemos fazer para um bem maior. É legítimo que tomemos uma postura de cobrança das autoridades por nós constituídas e que daí possa ser construída uma agenda que se ocupe dos principais temas para a sociedade brasileira, mostrando que a democracia começa nas urnas e continua por todo o tempo de mandato dos nossos representantes e se alguém pretende punir a classe política, que puna com a nossa maior arma: o voto.
E, talvez, só assim, estaremos recuperando o verdadeiro sentido da palavra República: o bem coletivo, o bem de todos ou literalmente, a coisa pública.
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Professor, mas não adianta punir nas urnas. Não tem nada melhor, esse é o problema. A gente tira o sujo e põe o mal lavado. Acredito eu que a grande questão que deve ser levantada é uma reforma política. Como isso vai ser feito eu não sei, mas não dá mais pra aturar os políticos e continuar dizendo que nós podemos mudar na próxima eleição, porque nós não podemos.
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